O fim das livrarias físicas é um problema muito maior para editoras do que para os leitores
PublishNews, 30/08/2013
O fim das livrarias físicas é um problema muito maior para editoras do que para os leitores

Se você for um editor que acredita que a revolução digital desacelerou, que as livrarias independentes vão crescer no novo ambiente, que e-books – se não forem um modismo – chegaram a seu teto de crescimento e que o modelo de mercado de livros dos últimos 100 (ou 20, ou 10) anos vai sobreviver pelo próximo século, está enganado.

A obsessão com a falsa dicotomia entre livros impressos e digitais está começando a dar espaço a mudanças mais importantes na maneira como os livros são comprados: online ou em livrarias de tijolo. O espaço para livros nas estantes das livrarias vem diminuindo nos últimos 10 anos.

A motivação para discutir este assunto veio da convergência de alguns indícios recentes. Um foi a pesquisa da Bowker, noticiada pela DBW, sugerindo que cerca de metade das vendas de livros nos EUA agora são online. Isso confirmou que o mercado dos EUA está aproximadamente na mesma situação que a Hachette UK informou nas últimas semanas.

Logo depois, muitos começaram a pensar que os livros impressos estavam se recuperando e que bastava aos editores um pouco de determinação e imaginação para sobreviver, inclusive o The Times apresentou pontos perfeitamente válidos sobre como é muito mais fácil se lembrar o que você está lendo no livro impresso do que no e-book.

Minha hipótese, dividida em duas partes, é muito simples. A compra de livros online – sejam impressos ou digitais – tira negócios das livrarias. Assim as livrarias fecham ou reduzem espaço nas estantes. Isso diminui sua atração e sua conveniência, o que faz a compra online aumentar ainda mais. Assim, as livrarias fecham ou reduzem ainda mais espaço. (Isso é chamado “ciclo vicioso”.) Esta é a parte um.

A segunda parte tem a ver com editoras, especialmente as grandes editoras gerais (as Cinco Grandes e mais algumas) que dependem todas, realmente, das livrarias. As editoras realizam um serviço de colocar seus livros na frente dos leitores. Isso significou durante uns 100 anos, “nós colocamos livros nas estantes”. Minha preocupação era que, sem estantes, as editoras perderiam o valor para os autores.

O Times publicou uma matéria de capa sobre livrarias apelando para a caridade para sobreviver. Se alguém acredita que esta é uma estratégia sustentável, eu gostaria de ouvir a explicação. Esta é uma jogada desesperada e o fato de que algumas livrarias citadas na matéria terem conseguido marcar um gol não significa que o time das livrarias está ganhando este jogo.

Tenho que enfatizar aqui que o contínuo declínio das livrarias não é algo que me deixe feliz. Meu primeiro emprego no mercado editorial, há 51 anos, foi numa livraria. Mas, se metade das vendas de livros hoje acontece online (o que é provavelmente cinco vezes ou mais a porcentagem de uma década atrás), não tem muito como ver um futuro positivo para as livrarias.

Nunca acreditei que a tendência iria estacionar ou se reverter, porque não vejo nenhum final para o “ciclo vicioso” descrito acima. Mas meu amigo Joe Esposito foi ainda mais meticuloso e convincente na explicação de por que ela não vai parar. Como afirma Joe, pelo menos parte da escolha impresso versus digital para alguns consumidores baseia-se no preço e na conveniência. Enquanto as livrarias constituírem uma ferramenta importante para a “descoberta” – encontrar novas coisas para ler – será mais conveniente para a maioria das pessoas caminhar até a loja que possui o livro para comprá-lo do que qualquer outro jeito ou formato.

Com as livrarias se tornando mecanismos de descobertas cada vez mais fracos (há cada vez menos livrarias e com menos livros), as pessoas são forçadas a encontrar os livros de alguma outra forma. Muitas destas outras formas já estão online (sem contar as sugestões de livrarias online). Muito do “boca-a-boca” hoje em dia acontece via comunicação digital (e-mail, Facebook, Twitter ou até blogs).

Desde o começo do ano as vendas de e-books não estão crescendo muito rapidamente. Nicholas Carr escreveu sobre isso (se você tem interesse em saber mais como a Internet e os e-books poderiam afetar nosso cérebro e capacidade de pensar, leia o livro de Carr, The Shallows). Certamente, parte da desaceleração tem como base a mudança dos e-readers dedicados como Kindles e Nooks para computadores tablets. Livros não são mais a única diversão nos aparelhos; estão competindo com games, vídeos, música, e-mail e toda a Internet. E, ao mesmo tempo, os últimos compradores destes aparelhos também leem menos do que os early-adopters [que adotaram os aparelhos logo no lançamento]. Quem lia mais teve muito mais incentivo financeiro para fazer a mudança desde o começo.

Mas será que o crescimento das vendas está perdendo força? Talvez não. Depende de como você olhar. O autor Nathan Bransford, que provavelmente tem muito a contribuir com as editoras com ótimas análises como faz com conteúdo, escreveu um excelente post mostrando que os aumentos menores não indicam um declínio. Na verdade, Bransford faz as contas e mostra que as vendas de e-books continuam a crescer, mais ou menos ao mesmo ritmo de antes, em termos de unidades. E isto apesar do fato de que e-books autopublicados, que foram atribuídos a 12% do mercado há pouco tempo não foram contabilizados!

Então a afirmação de que há um declínio dos e-books na verdade é um mito baseado em uma incompreensão de como os aumentos percentuais são afetados por uma mudança na base sobre o qual são calculados.

O post de Esposito citado acima afirmou que são as editoras que devem temer o declínio das livrarias, porque isso ataca seu principal valor em relação aos autores. Esta é uma questão que levantamos com frequência neste espaço. Mas algumas pessoas que se opõem a este ponto de vista afirmam que muitos livros não podem ser “portados” muito bem para o formato digital. Certamente, vimos muito pouco sucesso com livros ilustrados digitais.

Na verdade, havia uma falsa esperança criada de que o mercado de livros infantis – que é bastante ilustrado – ia virar totalmente digital há uns 18 meses. Acontece que, na verdade, esta era uma incompreensão da realidade. O que levou a esta conclusão errada foram as vendas massivas de “Jogos Vorazes” que, apesar de categorizado como leitura para jovens (está marcado assim; obrigado, metadata) na verdade é uma leitura narrativa lida não só por crianças, mas por muitos adultos.

Sim, é absolutamente verdade que os e-books não “funcionaram” (comercialmente) com outro tipo livro que não seja texto narrativo. Estamos no mesmo ponto em que estávamos quando escrevi sobre isso em 2012 e repeti a preocupação de que este era um problema existencial para editoras de livros ilustrados. Mas as livrarias não podem continuar a existir porque há alguns livros publicados que não funcionam como e-books; está é uma proposta completamente insustentável.

Lógica e fatos nos dizem algumas coisas imutáveis:

1. Livros de narrativas são cada vez lidos em formato digital.

2. Por causa disso, e por vários outros motivos (número cada vez menor de livrarias e com menos livros e uma tendência geral para que todos os consumidores comprem mais online), a compra online de livros está ganhando cada vez mais espaço.

3. Livros que não são narrativas não têm a mesma oportunidade natural para que suas vendas migrem tanto para e-books (porque o formato não funciona tão bem para eles) ou online (porque eles frequentemente devem ser vistos e tocados antes da compra).

4. A maior razão (tirando um gordo adiantamento, que poucos ganham) para os autores trabalharem através de uma editora é conseguir a distribuição de cópias impressas em muitas lojas.

5. Como cresce o número de livros com apelo comercial, mas que são publicados tão fora do meio convencional que suas vendas não são nem capturadas nos dados da indústria, isso enfraquece muito o ecossistema de publicação legado e encoraja ainda mais os autores estabelecidos e os aspirantes para trabalharem com isso. Autores aspirantes veem, toda semana, livros na lista de Mais Vendidos do NY Times que são, ou autopublicados ou possuem editoras desconhecidas. Quando editoras convencionais exigem um agente para conseguir um acordo (algo que exige tempo), então você precisa esperar que as editoras tomem uma decisão de contratação (mais tempo) e depois colocam seu livro em um planejamento que normalmente tem o objetivo de dar à Barnes & Noble e outras livrarias um adiantamento de meses para divulgação (ainda mais tempo), pode parecer muito mais interessante eliminar toda a espera e ir direto para a autopublicação, que vai colocar os livros à venda agora (mais ou menos).

6. O que você vai precisar fazer como editora para sobreviver mais tempo neste ambiente cada vez mais hostil depende do que você publicar.

* Os livros de narrativa podem continuar a vender números equivalentes ou até melhores do que antes, mas tanto autores quanto clientes estarão olhando de perto o quanto a editora ganha com isso e analisando se vale a pena dispensar seus serviços. O desafio será continuar acrescentando valor suficiente para que valha a pena continuar com a empresa. Como? Marketing digital em escala é sua melhor aposta


* Se você publica livros infantis, tem uma plataforma de lançamento para chegar ao mundo dos produtos licenciados e ao vídeo (que alguns já estão fazendo), o que promete um futuro melhor, mas traz um monte de novos e poderosos concorrentes.

* E se você publica qualquer outra coisa (livros de arte, livros instrutivos de qualquer tipo, livros de viagem), deve estar procurando um novo modelo de negócios. Acreditamos que ser vertical faz muito sentido (não publique todos os tipos de livros; fique com as audiências que conhece e cresça com ela). Mas “ser vertical” não é em si mesmo uma estratégia adequada. Editores profissionais têm uma vantagem aqui; necessidades profissionais podem ser satisfeitas com conteúdo e serviços que não são entregues como livros e, em geral, editores relevantes têm respondido sensivelmente a isso.


Os desafios para editores nos EUA estão só começando a serem sentidos fora dos mercados de língua inglesa. Mas aos poucos começam a se espalhar. Isso aumenta a perspectiva da nossa Conferência Publishers Launch em Frankfurt, que acontecerá em 8 de outubro. Vamos olhar mercados em transição, com visões da Amazon e da Nielsen sobre quais mercados estão mostrando sinais de mudanças digitais, assim como uma visão geral do mundo em desenvolvimento por Octavio Kulesz. Teremos um ótimo painel dos líderes do mercado da Alemanha para discutir se o mercado ali vai se parecer ao de língua inglesa, com a diminuição das livrarias, problemas nas editoras e aumento de autores autopublicados. Vamos ouvir Goodreads, Wattpad e Scribd falando como são internacionais suas comunidades de pessoas que gostam de ler. Teremos apresentações da Big Data de Ken Brooks e DRM de Micah Bowers que prometo não repetirão nada que você já ouviu antes. E alguns excelentes CEOs – Charlie Redmayne da HarperCollins UK, Rebecca Smart da Osprey e Marcus Leaver da Quarto – estarão no programa também. Michael Cader e eu vamos tentar cobrir os assuntos que são mais complicados, incluindo o crescimento da Amazon e o poder da nova Penguin Random House. Se você estiver por ali perto em 8 de outubro, esta é uma conferência que você não pode perder.

[29/08/2013 21:00:00]