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Fortiter in re, suaviter in modo
PublishNews, 27/03/2013
Fortiter in re, suaviter in modo

Faça as coisas mais intensas, do modo mais suave; esse o significado do título do artigo, frase cunhada por Claudio Acquaviva (1543 –1615), padre Jesuíta que chegou ao cargo de Superior Geral da Companhia de Jesus, ordem católica fundada por Inácio de Loyola, depois canonizado.

Os estudos de Claudio Acquaviva sobre educação contribuíram para a sólida reputação de educadores dessa Companhia, que acaba de ter um de seus integrantes eleito Papa, o atual Papa Francisco.

A propósito, a lei de direito autoral brasileira (9.610/98) tem três disposições que podem parecer conflitantes, e convém, nesse momento histórico, analisar. O art. 7º, II diz que “são obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como.... II - as conferências, alocuções, SERMÕES e outras obras da mesma natureza;” (grifo meu).

Já o art. 46, I, b, da mesma lei, estipula que “não constitui ofensa aos direitos autorais, I - a reprodução, b) em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em reuniões públicas de qualquer natureza;”

E mais um item. O art. 7º, o que trata das obras protegidas, reproduzido acima, inclui nesse rol “XIII - as coletâneas ou compilações, antologias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras, que, por sua seleção, organização ou disposição de seu conteúdo, constituam uma criação intelectual.”

Temos, ainda, na mesma lei, o relevante conceito de “publicação”, que é “o oferecimento de obra literária, artística ou científica ao conhecimento do público, com o consentimento do autor, ou de qualquer outro titular de direito de autor, por qualquer forma ou processo”.

Por esses conceitos, um sermão publicado – e a fala de um sermão é um modo de publicar, isto é, de tornar pública uma informação, uma obra – numa Missa pode ser reproduzido livremente, em diários ou periódicos, com conteúdo informativo, próximo da data em que proferidos, sem que tal divulgação constitua ofensa aos direitos do seu autor.

Então uma compilação de sermões – do latim sermo, que significa conversa - do Papa Francisco poderia ser publicada livremente? Nesse caso, não, pois a compilação assume caráter de obra literária, e não a reprodução de caráter informativo referida no parágrafo anterior.

E a quem pertenceriam os direitos sobre essa obra?

Lembro aqui de outro jesuíta famoso, o Padre Antonio Vieira (1608 – 1697), cujos sermões, publicados em 12 volumes, representam ponto elevadíssimo da língua portuguesa. Disponíveis na internet pelo magistral trabalho da USP, preservando e tornando acessível a Biblioteca do humanista José Mindlin, os Sermões foram ordenados e impressos para combater a pirataria reinante na época. Não se sabe sobre direitos autorais sobre a obra, já que a primeira lei sobre essa matéria, que se tenha conhecimento, é o Estatuto da Rainha Anna, de 1710. Obviamente hoje eles estão em domínio público.

Mas e a questão dos sermões atuais? A Tipografia Vaticana começou a funcionar em 1587, sob o papado de Sisto V, em 1926 foi criada a Libreria Vaticana e em 1978 João Paulo II atribuiu a Libreria Editrice Vaticana, L.E.V., a função de publicar suas obras, então como cardeal Karol Wojtila, como o fez posteriormente Bento XVI em relação aos escritos da época em que era o Cardeal Joseph Ratzinger. Recentemente foi aberta uma loja da L.E.V. na Praça de São Pedro, a Livraria Internacional João Paulo II.

Os padres e bispos da Igreja Católica pode “publicar” suas obras – sejam textos, sermões, palestras registradas em forma audiovisual, ou outras – livremente, embora também possam ser geridos pela Santa Sé.

A partir de 2005 os direitos das obras dos Papas tiveram a titularidade transferida para a Santa Sé, valendo a leitura do texto em italiano: ”Sono affidati alla Libreria Editrice Vaticana, quale Istituzione collegata alla Santa Sede, l'esercizio e la tutela, in perpetuo e per tutto il mondo, di tutti i diritti morali d'autore e di tutti i diritti esclusivi di utilizzazione economica, nessuno escluso od eccettuato, sopra tutti gli atti e i documenti attraverso i quali il Sommo Pontefice esercita il proprio Magistero.”

O Vaticano dispõe, hoje, de um serviço de notícias abrangendo a Rádio e o Centro Televisivo Vaticano, que divulga as atividades da Santa Sé, também por meios audiovisuais, em tempo real, mostrando, por exemplo, a expectativa e aparição da fumaça branca ao vivo.

São tempos novos, que já justificaram uma Encíclica (carta do Papa aos Bispos e fiéis de todo o mundo) de Leão XIII, em maio de 1891, sobre as questões pós-revolução industrial, mais especificamente as alterações nas condições do exercício e contratação do trabalho humano, a Rerum Novarum, que vem sendo complementada, vide a Encíclica Centesimus Annum, de João Paulo II, e que no final contém o símbolo e a indicação © Copyright 1991 - Libreria Editrice Vaticana, certamente para evitar publicações infiéis ao texto original.

Mais de 120 anos depois, as inovações são muitas e a tecnologia facilita a difusão e discussão de idéias. Os sermões agora são veiculados por meios audiovisuais, on line, on time, e são amplamente divulgados, como todas as mensagens religiosas. Ventos novos!

Gustavo Martins de Almeida é carioca, advogado e professor. Tem mestrado em Direito pela UGF. Atua na área cível e de direito autoral. É também advogado do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL) e conselheiro do MAM-RIO. Em sua coluna, Gustavo Martins de Almeida aborda os reflexos jurídicos das novas formas e hábitos de transmissão de informações e de conhecimento. De forma coloquial, pretende esclarecer o mercado editorial acerca dos direitos que o afetam e expor a repercussão decorrente das sucessivas e relevantes inovações tecnológicas e de comportamento. Seu e-mail é gmapublish@gmail.com.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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