Ideias para editoras que ajudam livrarias - e outras sugestões que nos deixam céticos
PublishNews, 27/02/2013
Ideias para editoras que ajudam livrarias

Este é o quarto post de uma série sobre o futuro das livrarias. Os posts anteriores cobriram os desafios da compra, exploraram o que deveríamos esperar para o futuro da Barnes & Noble, e visualizaram como poderia ser o mundo das livrarias físicas no futuro. Prometi revisar a lista de sugestões para que as editoras ajudassem as livrarias, uma lista feita pelo editor da Bookseller, Philip Jones. Ele escreveu mais sobre isso desde então, mas a lista original de Philip incluía:

1. Editoras oferecem livros para livrarias em consignação. Isso significa que a loja paga quando o livro vende em vez de pagar quando o livro é enviado a elas.

2. Editoras podem oferecer livros com descontos maiores. Isso significa dar maior margem às livrarias entre o preço que pagam e o preço que a editora "sugere".

3. Livrarias podem aproveitar as "fraquezas" da Amazon como livraria online. Isso aparentemente tem a ver com uma "curadoria" localizada em vez de sugestões baseadas em algoritmos.

4. Livrarias se tornam algo mais (ou menos, mas diferente) do que meras livrarias. Esta sugestão pode ser inspirada pela afirmação da B&N de que estão criando novas lojas "protótipos".

5. Editoras criam edições impressas especiais para as lojas. Isso foi feito no Canadá quando a Random House criou edições específicas para a Indigo, a maior cadeia de livrarias do país.

Depois, em uma entrevista de rádio, a CEO da HarperCollins do Reino Unido acrescentou uma sexta sugestão:

6. Que as livrarias deveriam cobrar entrada, para permitir que os clientes olhassem (e talvez descontar isso em alguma compra).

Vamos rejeitar as sugestões 3 a 6 rapidamente. Elas não são escaláveis ou não ajudam.

A noção de que lojas independentes podem vencer a Amazon em vendas online é totalmente absurda. O que as lojas independentes podem, e deveriam fazer, é oferecer a capacidade de venda online para permitir que os clientes que elas já têm e que querem expressar sua lealdade possam fazer compras online com eles. E deveriam fazer isso da forma mais simples e fácil possível. Ao ponto de que a loja que faz um trabalho de curadoria (estocam listas de mais vendidos, recomendações dos funcionários ou de clientes), deveria refletir isso online. Mas a noção de que um único player pode vencer online o gigante no próprio jogo do gigante é uma ilusão e ninguém deveria perder tempo com isso.

A ideia de que as livrarias se tornem algo mais do livrarias, que é como eu interpretaria a sugestão número 4, também não ajuda muito. Se não é uma "livraria", o que é exatamente? E se você não consegue definir o que é exatamente, então como esse conselho pode ser algo mais do que ficar jogando coisas na parede até algo grudar? Isso é estratégia? Livrarias já são e sempre foram centros de unidade comunitária. Fazer isso nunca é uma má ideia, mas dificilmente podemos dizer que é algo original.

Da mesma forma, a ideia de que editoras podem salvar as lojas oferecendo produtos "únicos" não é realmente uma solução. Sim, a Random House (a maior editora) pode fazer isso com a Indigo (uma livraria que domina o mercado canadense). Mesmo se acrescentar valor para a Indigo, e realmente não sabemos se é verdade, há poucas situações no mundo em que isso pode ser realizado.

E a sugestão de que as lojas podem se salvar cobrando entrada pode ser refutada por qualquer loja que ousar tentar a jogada. Na verdade, acho que pode ser uma boa ideia para um programa de pegadinhas. Coloque um caixa na porta da frente de uma livraria (qualquer loja, mas fiquemos com uma livraria) e registre a reação dos clientes quando encontram algo que não faz nenhum sentido para eles. Suspeito que será raro algum apoio.

No entanto, as duas primeiras sugestões – fornecer inventário às lojas com mais tempo para pagar (consignação ou prazos maiores para pagar) ou uma margem maior para trabalhar – valem a pena mais análise e pensamento.

É uma ideia razoável pensar que as editoras possam facilitar o peso financeiro das livrarias, baseando-se na importância delas como um componente de marketing da cadeia de produção. Mas expandir os descontos ou aplicar a consignação são coisas que acrescentam complicações.

O aumento das margens precisa ser feito com cuidado, para que o objetivo que a editora busca seja alcançado: aumentar a exposição de livros nas livrarias. Aumentar o desconto apenas é complicado. Precisa-se da expansão de um princípio já existente.

As editoras chamam a compra de espaço para seus livros em localizações centrais de 'coop'. Coop foi originalmente usado por editoras para comprar espaço para seus títulos dentro dos anúncios de jornal de uma livraria local. (Às vezes, esta “livraria local” era uma sucursal ou grupo de uma cadeia maior.) Mas recentemente tem sido aplicado para conseguir localizações privilegiadas, geralmente perto do caixa, como parte de uma promoção. A convenção é que o pagamento pelo espaço seja calculado como uma porcentagem de uma "ordem de apoio". Esse processo imita o que acontece em outros setores de comércio e é chamado fora do mundo editorial como RDA (retail display allowance – compensação por exposição no comércio) ou MDF (marketing development funds – fundos para desenvolvimento de marketing). Outra aplicação da mesma ideia é que as editoras paguem por pockets (às vezes chamados de slotting fees - taxas para abertura de espaço). Com um acordo como este, um comércio que não seja livraria (como a Michael's, a cadeia de lojas de materiais de construção) pode conseguir um subsídio adicional acima do que a agenda de descontos requer por cada título que eles vendem.

Sabemos que todo livro em uma livraria, ou talvez em qualquer tipo de loja, melhora a chance de ser descoberto, não só os que estão em mesas promocionais. Então talvez uma editora (seguida por outras, com o tempo) poderia considerar aumentar a ideia de pagar uma “taxa de estante” para todo livro em uma livraria “qualificada”. Pensemos um pouco na matemática.

Vamos imaginar uma loja que ganhe $2 milhões em vendas anuais. Se o desconto médio é de 40% (que é um número razoável; os descontos podem ser maiores do que isso, mas são reduzidos pelos custos do frete, incluindo os retornos), o valor do inventário para fazer estas vendas é de 1,2 milhão. Se eles devolvem o estoque três vezes por ano, o custo médio do inventário na loja é 1/3 do total, ou $400.000.

Os dois milhões de vendas anuais equivale à venda de uns 133.000 livros (se o preço médio do livro é de $15), e o inventário médio é de uns 45.000 livros. Se as editoras pagam dez centavos por livro por mês para serem colocados na estante, isso resultaria em $4.500 a mais por mês - $54.000 por ano – para a loja. Se as editoras pagam 25 centavos por livro por mês para estarem nas estantes, a loja conseguiria mais $135.000. Não seria nada mal para uma livraria ganhar 10% a mais de suas vendas e nossa loja de $2 milhões de lucro ganharia mais $200.000. Assim, em todos os casos, a “taxa de estante” significaria um incremento importante. Certamente, para algumas lojas poderia ser a diferença entre continuar aberta ou fechar. Para outras, encorajaria ter um inventário maior. Nos dois casos, é o que as editoras querem também.

As editoras poderiam, se quisessem, fazer a “taxa de estante” aplicável se a loja comprasse os livros diretamente deles ou de um distribuidor. Na verdade, seria menos complicado de aplicar se os livros fornecidos pelo distribuidor fossem incluídos. O pagamento agora começa a contar quando as editoras enviam os livros, não quando eles chegam à loja, assim a diferença de tempo entre os dois trabalha a favor da editora. Com uma “taxa de estante”, as editoras não pagariam pelo tempo em que o livro não está na estante, ou seja, enquanto estiver em trânsito, numa caixa esperando para ser desempacotado ou no estoque indisponível para um cliente.

Para receber as “taxas de estante”, uma loja teria de divulgar dados muito mais robustos do que faz agora sobre seus estoques e vendas. Mas com a tecnologia moderna talvez isso não seja muito difícil (os sistemas não fazem isso agora, mas poderiam) e, na verdade, as lojas deveriam querer saber mais sobre a eficiência de suas práticas de organização de prateleiras mesmo sem a taxa. E fazer coisas desta forma colocaria editoras e lojas do mesmo lado sobre retornos, porque as duas teriam boas razões para tirar os livros que não vendem das prateleiras (e substituí-los pelos que têm melhores chances).

Aumentar as margens como uma recompensa para uma loja física é algo fácil de fazer e não corta as distribuidoras da situação. A consignação é definitivamente mais complicada. E talvez menos útil.

Às vezes, a convenção de venda e retorno que prevaleceu por quase um século no mercado editorial dos EUA é visto como o equivalente à consignação, mas não é. Apesar de as livrarias às vezes usarem retornos como uma ferramenta para diminuir os pagamentos que precisam fazer às editoras, elas também são donas (e em muitos casos, pagaram por eles) de muitos livros em suas prateleiras em certo momento. E um efeito colateral não-trivial da venda-e-retorno é o de "encolhimento", livros que não vendem, mas por qualquer outra razão podem desaparecer de uma loja, são muito mais problema da loja, não da editora.

Com a consignação, o pagamento das lojas para as editoras se basearia no que passou pela caixa registradora, não o que foi enviado do galpão da editora (ou do distribuidor). O "encolhimento" só seria detectado se uma editora pedisse o retorno de um livro que já tinha previamente enviado e a loja não conseguisse enviá-lo. Mesmo com a melhor das intenções, uma loja não necessariamente sabe que um livro está perdido e certamente não poderia devolver um livro perdido, os pagamentos para estes livros teriam, no mínimo, que esperar até alguma verificação de inventário ou protocolos de retorno fossem realizados e descobertos.

A grande questão na consignação é quando e com que frequência uma loja paga. Eu me lembro de ter uma discussão sobre consignação com uma grande livraria há dez anos. A pessoa top lá estava pensando em pagar as editoras a cada seis meses, mais ou menos. É seguro assumir que nenhuma editora ficaria muito animada com consignação nesses termos. Permitir que uma loja “pague na venda” é uma coisa; permitir que paguem seis meses depois da venda é muito custoso para a editora.

Para que a consignação funcionasse, os pagamentos deveriam ser mensais, e teriam que incluir as vendas até o momento do pagamento. O que poderia fazer sentido, por exemplo, seriam pagamentos no 5º dia do mês para vendas feitas até o final do mês anterior. Seriam 35 dias depois da venda para alguns livros, 5 dias depois para outros, e uma média de 15-20 dias depois da venda. Não seria absurdo para uma editora oferecendo consignação querer pagamentos mais frequentes do que isso, talvez mesmo semanais.

Os desafios de tonar a consignação uma prática comercial viável em nossa indústria inclui estabelecer uma frequência de pagamento que faça sentido e algum método para detectar o encolhimento.

Mas o problema então é que o processo de pedidos provavelmente teria de mudar. Às vezes é dito que as lojas agora estão muito facilmente tentadas a pedir demais porque, afinal, elas podem devolver o que não vendem. Imaginem quanto isso seria mais descontrolado se a loja pudesse manter os livros sem custo pelo tempo que demorasse para vender! (Poderia existir ainda um custo de frete para entrada e saída a fim de desencorajar pedidos exagerados, mas isso existe agora.) Ao contrário do conceito de "taxa de prateleira", a consignação coloca a editora e a loja em conflito sobre inventários de venda lenta.

Vamos notar também que consignação não tem a ver com pagar mais tarde; às vezes a consignação pode significar pagar antes. As lojas ganham quando um bestseller entra e voa das prateleiras nas primeiras semanas. A renda destes livros é mantida pela livraria por 45, 60, 75 ou 90 dias (dependendo de como as editoras reforçam suas coleções) antes de terem de pagar à editora. Sob um acordo de consignação, elas teriam de pagar a parte da editora muito mais rápido. (Claro, ao mesmo tempo, elas não teriam de pagar por livros de vendas mais lentas que podem ter vindo no mesmo envio, mas ainda não venderam.)

Há outras complicações para a consignação. Da forma como as coisas funcionam agora, as editoras marcam os livros em seus galpões como custos em sua contabilidade (tipo custos de fabricação). Quando elas vendem, marcam a quantidade que vendem às livrarias e mantêm alguma “reserva” para devoluções potenciais. Na contabilidade da loja, os livros são marcados pelo preço que a loja pagou ou vai pagar à editora.

Mas se os livros são enviados às lojas sob consignação, não houve venda. Então a editora teria de continuar a colocar estes livros consignados na contabilidade como custos de fabricação e não creditá-los como venda até a loja informar e pagar. Qual a influência disso nos informes públicos e nos contratos bancários é algo que cada empresa precisa resolver e que talvez seja um problema sério em alguns casos.

E às vezes, há impostos estaduais ou locais baseados em inventário. Não sou advogado, mas a autoridade impositiva provavelmente espera algum pagamento da entidade que é dona do inventário. Na prática de venda-e-retorno, as lojas são as donas (tenham ou não pago a conta). Sob a consignação, as editoras são as donas. Isso iria criar complicações, no mínimo. Complicações poderiam surgir também em relação ao seguro. (Se uma loja inundasse ou pegasse fogo, o inventário consignado estaria coberto pelo seguro de uma loja?)

O resumo é que as editoras podem ajudar bastante com a diminuição do custo de seus inventários, e há uma grande variedade de formas de fazer isso. A mais simples de todas, claro, é simplesmente aumentar o tempo de pagamento dos atuais 60 dias (como é geralmente). Há trinta e cinco anos, meu pai me fez administrar um programa chamado Crédito para Estoque, onde dávamos às lojas 180 dias para pagar os livros que não foram vendidos depois do Natal se elas não os devolvessem imediatamente. (Simples de fazer: envie um crédito para o que está datado de hoje e uma cobrança pelo mesmo estoque datado para seis meses no futuro).

Ouvimos por aí que pelo menos uma das Seis Grandes está experimentando com prazos de 180 dias e que outra poderia fazer isso em breve. Esta estratégia aparentemente oferece vantagens competitivas (lojas estocam mais livros da editora, assim elas vendem mais também). Esta é uma forma pela qual a editora dá benefícios que são como consignações sem as complicações. Da minha perspectiva, é uma espingarda calibre 12, não um rifle, porque aumenta os prazos para tudo igualmente. O crédito para estoque tinha como alvo livros que provavelmente seriam retornados. Os velhos planos de “atraso na cobrança” tinham como alvo títulos especiais em momentos especiais do ano. A consignação exige que livros que vendem rápido sejam pagos rapidamente. Um grande aumento geral no tempo para pagar não é uma ferramenta com alvos específicos, mas ainda constitui um grande passo na direção correta.

Isso porque os livros nas prateleiras estão mais disponíveis do que os livros nos galpões das editoras. Está ocorrendo um aumento no reconhecimento deste fato; mais ações certamente se seguirão.

Tradução: Marcelo Barbão

[26/02/2013 21:00:00]