Um mapa para o futuro
PublishNews, 23/06/2010
Na coluna desta semana, Mike Shatzkin dá seis sugestões para os editores

Outro dia tive a oportunidade de falar no Encontro sobre Estratégia Global da Harlequin. Quando sou convidado a falar, mesmo que somente para editores, frequentemente me pedem explicitamente para “assustá-los até a morte”. Como não me considero um cara muito ameaçador, me sinto sempre um pouco desconfortável com o fato de estar mesmo fazendo isso. Mas é claro que a minha mensagem principal não é muito confortável para a maioria das pessoas do mercado editorial (mas vamos deixar claro logo: a Harlequin nunca me sugeriu isso e nem isso é realmente relevante no caso deles, como esse texto deve deixar claro).

A mensagem é assustadora para a maioria porque a essência do que estou dizendo é que os editores deverão, nos próximos dez ou vinte anos, mudar a maneira de pensar sobre como transmitir valores. O core business dos editores mudará da propriedade intelectual que possuem ou desenvolvem para o público que eles dominam. Editores que oferecem conteúdo “vertical” têm uma grande vantagem inicial para se ajustarem; já os editores de livros mais gerais e comerciais mal sabem o que fazer com essa informação.

Eu acho que meu raciocínio é muito simples. E parte de dois princípios.

Acredito que o preço dos conteúdos deve cair por causa da lei da oferta e da procura. Mesmo que o mercado digital cresça em demanda (porque as pessoas podem consumir mais mídia se tiverem os meios sempre à mão), isso aumentará a oferta ainda mais. Você costumava precisar de um editor para investir algum dinheiro e colocar uma organização pra trabalhar para fazer o conteúdo chegar aos “pontos de venda”. Agora você só precisa ter acesso à internet. Então eu vejo um declínio nos preços de conteúdo no futuro. Isso não significa que tudo será gratuito, significa que as pessoas terão mais e mais acesso a conteúdo gratuito, ou seja, elas não terão muito boa vontade em pagar o que pode ser de graça.

O segundo princípio do meu raciocínio é que os consumidores aderem a conteúdos de interesse comum. Eu chamo isso de “vertical”. O legado mais bem sucedido em mídia de consumo, que inclui todas as grandes editoras, tenta cobrir interesses muito distintos, o que eu chamo de “horizontal”.

Eu coloco essas duas idéias juntas e digo que sair do hoje (quando vendo conteúdo) e chegar no amanhã (quando estarei vendendo público) depende de usar o ativo de hoje para construir o ativo de amanhã. Isso pode soar quase insano pro pessoal da Random House ou Simon & Schuster ou Penguin [entre as maiores editoras do mundo]. Pode fazer muito sentido pra quem trabalha na F+W Media ou Hay House ou Chelsea Green ou Cool Springs Press. Mas pareceu fazer todo sentido para o pessoal da Harlequin.

Para me preparar para a conversa com a Harlequin, fiz uma lista das “coisas mais importantes a se pensar a respeito” para que eles pudessem seguir. E aqui está. Se você for realmente de uma editora vertical esse será um mapa bastante útil. Para os outros que não vêem nenhum sentido, isso mostra que a sua companhia está presa em uma disputa por uma fatia dos lucros e oportunidades de vendas que vai encolher, bem devagar por um tempo, mas apenas por um tempo.

  1. Use conteúdo como isca. Quando você entender que os leitores que você tem são sua fonte de renda, e não seus direitos autorais, vai perceber de imediato o valor de explorar o conteúdo para atrair ainda mais leitores. Isso pode ter diferentes significados em diferentes contextos, mas está claro que o modelo de venda de conteúdo ainda dá muito dinheiro e vai continuar assim por um tempo, mas esse é um princípio-chave a se aplicar. As estratégias de brinde ou de amostra que você usa serão diferentes se o seu objetivo for o de formar consumidores leais ou se o objetivo for o de vender algo junto com o brinde.
  1. Esteja atento aos pequenos concorrentes e esteja preparado para imitar seus modelos. Está chegando o dia – para dizer a verdade, esse dia já chegou – quando não será necessário uma grande organização para vender a muitos leitores (nossas vendas online serão responsáveis por metade das nossas vendas em dois anos). Quando companhias menores que a sua oferecem produtos mais baratos e com modelos diferentes de entrega – assinatura, impressão conforme demanda, qualquer que seja – observe com atenção e tente fazer o mesmo para que você entenda como a coisa funciona (claro que a Harlequin já estava fazendo isso. Eles acabaram de lançar a editora de baixo custo, Carina Press).
  1. Cresça! Adquira empresas rivais ou associe-se a elas. Uma vez que você definiu o público que vai buscar, estará definida também a maneira pela qual você vai buscar “escala”. Se alguém mais está buscando o mesmo público que você, primeiro torça pra que eles não vejam isso como um jogo de conquista de público (e a maioria das editoras não vê assim ainda). Enquanto você tem sorte o bastante para ter competidores que ainda estão concentrados em transformar IP em dinheiro, eles vão querer trabalhar com você se você tiver um público que queira comprar o IP deles. Então você usa o conteúdo deles como isca para atrair olhares para o seu público.
  1. Descubra maneiras diversificadas de prender a atenção do seu público. Na construção de um público (fiel), entregar mercadorias vendidas online não é, nem de perto, suficiente. Você deve descobrir maneiras de trazer seu público para perto de si; você deve criar maneiras para que os membros da sua comunidade dêem importância uns aos outros. Uma maneira de medir isso é saber o quão freqüente você alcança seu público (ou, ainda melhor, quantas vezes ele vem até você). O número de pessoas que é absolutamente garantido abrir o email que você manda para eles pode ser uma importante medida da saúde da sua base de ativos.
  1. Venda os e-Books de todo mundo (como a recente proposta da F+W e Ingram). Quase ninguém do seu público se importa em saber quais livros são seus e quais são de outra editora. Eles querem entretenimento e informação, ou resolver um problema; se você os atende como um só grupo você não ganha nada em não dar acesso a um material porque outra editora publicou. Uma oferta completa (e precisa) de e-Books é o primeiro passo na direção certa. No fim das contas, é claro, você quer oferecer todos os livros impressos e todas as outras “coisas” relevantes para a sua audiência, tanto produtos simples ou baseados em informações. Isso é parte do seu potencial de fazer dinheiro.
  1. Construa múltiplas marcas que tenham um significado. Há muito poucas companhias cujos nomes tenham um significado real para os consumidores como marca (De fato, a Harlequin é a líder). Mas se você puder apelar a uma comunidade, você tem a oportunidade de construir uma marca. Marcas são como atalhos para consumidores; elas nos orientam sobre o que esperar de produtos e serviços, incluindo credibilidade social, qualidade e preço. Enquanto tivermos produção maciva de impressos (e eu acho que isso acontece por mais uns cinco anos), teremos a oportunidade de entregar URLs para pessoas offline. Não é tão eficiente quanto entregar online (quando o receptor pode clicar imediatamente), mas oferece a chance de alcançar muitas pessoas que podem não ser exploradoras online (não vou entregar os segredos da Harlequin, mas fui surpreendido ao ouvir quantos idosos fazem parte do público deles; pessoas que não são fáceis de chamar atenção na internet). Mas não use livros para empurrar pessoas a sites genéricos onde eles vão chegar e dizer “o que estou fazendo aqui?”. Dê a eles algo relevante, algo que os atraia a voltar; um site que você, de boa fé, estimule o leitor a visitar com a expectativa de que isso vai ampliar o compromisso entre você e o seu leitor, para benefício mútuo.

Quando passo essa mensagem para a comunidade em geral: editores, autores, agentes, vendedores, a reação é sempre de assombro. É compreensível. Deixar de ser uma editora comercial horizontal para tornar-se uma com “público próprio”, é um caminho longo e tortuoso a percorrer. É um pensamento totalmente racional dizer, “esse não é o negócio que eu faço; eu vou continuar a fazer o que faço até ser o último.” Mas não houve expressões de assombro com o pessoal da Harlequin. Eles sabem que têm um público grande e fiel que se importa com a marca deles. Mesmo que o jogo vire de IP para leitores eles podem mudar imediatamente e continuar jogando.

[22/06/2010 21:00:00]