Ria Livraria lança novo selo editorial para autores nacionais, o EditoRia
PublishNews, Redação, 25/04/2023
Primeiro livro será um volume de contos do escritor Jorge Ialanji Filho, 'Muqueta'; leia um trecho

A Ria Livraria (Rua Marinho Falcão, 58, Sumarezinho, São Paulo / SP) vai lançar um novo selo editorial independente para publicar obras de autores frequentadores do espaço e de jovens nomes da literatura nacional. A obra que inaugura o selo, chamado de EditoRia, será Muqueta, novo livro de contos do escritor e jornalista Jorge Ialanji Filholini (leia abaixo um trecho exclusivo de um dos contos).

Para Marcos Benuthe, fundador da Ria Livraria e idealizador do EditoRia, "a livraria chegou em um momento de realizar o sonho de muitos escritores que querem lançar o seu livro sem muita dificuldade". O selo vai praticar preços populares, abaixo de R$ 30. "Nosso empenho maior não é com vendas, mas disseminar a cultura", diz Benuthe, em nota.

O novo livro de contos de Jorge Ialanji Filholini foi escrito entre os anos de 2020 e 2022, no auge da pandemia de covid-19 e, diferentes dos seus livros anteriores Somos mais limpos pela manhã (2016), finalista do Prêmio Jabuti, e Somente nos cinemas (2019), Muqueta traz histórias de protagonistas que refletem, em primeira pessoa, sobre a solidão, o pessimismo em torno de um futuro, a perda fatal de pessoas próximas, o conflito de amizade, questões sociais, memórias perturbadoras e o perturbador panorama político dos anos anteriores.

Muqueta tem lançamento marcado para o dia 3 de junho de 2023, um sábado, a partir das 17h, na Ria Livraria, com sessão de autógrafos com o autor.

Trecho do livro Muqueta (EditoRia), de Jorge Ialanji Filho:

Capítulo 1

"Quero lançar o livro em um bar, a editora pediu para ser na livraria parceira localizada em uma rua nobre do centro da capital, vem gente de toda parte, vai doer a munheca de tanto assinar dedicatória, será? Sou brigado com todos, meu temperamento não ajuda na venda de exemplares. Quantos seguidores você tem nas redes sociais? A pré-venda será um termômetro. Haverá clientes? Quer dizer, leitores. Já fiz a lista de jornalistas para envio da obra. Vai pensando, empacote direitinho, consegue encontrar as caixas-postais dos booktubers? Contratou um assessor de imprensa? Cadê o release? Mande o PDF com marca d’água. Não saí da primeira frase? O prazo do adiantamento termina em duas semanas. Não sei. Já escolheu quem escreverá a orelha? E o prefácio, terá? Não vale usar o Chat GPT. O retrato na quarta capa será rindo ou sério? Mão no queixo ou braços cruzados? Fotografia preta e branca, colorida, sépia, filtro de Instagram? Como farei tudo isso? Não sei usar a vírgula. Erro de conjunção. Coloque o ponto final. Anote: nunca deixe de pagar em dia o revisor. Depositou para o diagramador? E a gráfica? Todo esse valor só de papel? O que acha de diminuir o número de páginas? Qual é o gênero? Como você escreve? Qual será o epitáfio em sua lápide? Fora da área de cobertura. Agendou a participação nos podcasts? Neste momento, o você de hoje falaria o que para o você do passado? Livro de contos? Ninguém lê contos. Pior que contos só poesia. E poetas. Um nível mais abaixo, os amantes de literatura grega. Na mesma categoria, os tradutores dos autores russos e os que celebram o Bloomsday no Brasil. Quem sentará a seu lado durante o lançamento? Um faraó com seus súditos. Ele escreve bem, mas precisa de prática. Tire esse final. Melhor inverter o começo. Antes do fim do sumário, seu livro será esquecido. Vamos pensar em prêmios. Pense na grana. Na grana.

Não me suporto. Sou desprezível e mau-caráter. Passo os dias me perguntando se tem alguém que goste de mim, nunca chego ao resultado. Não disfarço os sentimentos, bato de frente. Discuto, brigo, esfolo, saio da rinha com hematomas, mas deixo minhas marcas. Saboto meu otimismo. Tenho mania de perseguição, acredito em complôs contra mim, puxo para baixo as realizações, deixo o fracasso tomar conta, sou submisso aos diabinhos sentados em meus ombros. São dois, pois eles expulsaram o anjo inquilino do lado esquerdo. Balançam as perninhas, alisando seus rabos em meus lóbulos. Sou esquizofrênico, depressivo, me automutilo e convivo com a ansiedade, as pernas inquietas denunciam. Evito crises pela misericórdia da Fluoexetina, quatro cápsulas de cento e cinquenta miligramas, só consigo dormir tomando Zolpiden, minha bancada de devoção é mais cheia de remédios doque de santos. Acredito em milagre químico. Três psicólogos me abandonaram, no quarto não desisti. O nome dele é Paulo, não vou lembrar do sobrenome, até agora só conheço sua pessoa jurídica, apresentada nas notas fiscais das sessões. Ele me encara pela câmera de seu notebook, nunca demonstrou surpresa ou negatividade em torno de meus relatos semanais nem de minhas piadas, uma proteção para esconder a raiva, só me responde com perguntas e quando me calo questiona o motivo de meu silêncio".

[25/04/2023 10:10:00]