O homem mais pirateado (?) da Babilônia
PublishNews, Leonardo Neto, 03/02/2015
Ediouro acusa editora independente de comercializar obra pirata

O homem mais rico da Babilônia é um clássico dos livros de finanças pessoais. Mas seu autor, George Samuel Clason (1874-1957), nem poderia supor que seu nome estaria envolvido em uma pendenga entre duas editoras brasileiras, 57 anos depois de sua morte. É que, no afã de reeditar a obra, a Ediouro resolveu fazer uma busca simples nas varejistas para saber a quantas andavam as vendas do livro. Para a surpresa, encontrou outra edição do mesmo título, publicado pela Isis, uma editora cujo “compromisso é publicar alguns tesouros da sabedoria oriental e ocidental”, como se descreve em seu site. “Queremos relançar o título, mas o mercado está inundado dessa versão pirata”, reclamou Renata Sturm, editora da Nova Fronteira, selo da Ediouro que pretende relançar a obra. Na Saraiva, por exemplo, o título da Ediouro sai a 24,90 enquanto que o da Isis é vendido por R$ 26,90 (o preço de capa é de R$ 29,90).

De acordo com João Paulo Riff, da Agência Riff, que representa os direitos da obra no Brasil, a Penguin, detentora original dos direitos, não tem qualquer acordo com a Isis, que permita a publicação do livro por aqui. “A Nova Fronteira/Ediouro é a única detentora dos direitos de publicação e comercialização do livro em língua portuguesa no Brasil”, disse ao PublishNews. A Isis se defende, dizendo que a obra está em domínio público e que a sua tradução foi feita direto do original. “Antes da publicação, confirmamos que o autor havia falecido há mais de 60 anos e não deixou nenhum herdeiro, portanto, a obra entrou em domínio público”, argumentou Gustavo Caballero, representante da Isis. “Por algum motivo, editoras de todo o mundo acham que o livro está em domínio público, mas não está. E não há dúvidas em relação a isso”, declarou Riff ao PublishNews.

Consultores jurídicos ouvidos pelo PublishNews ressaltam que a questão é mesmo polêmica. Os EUA, onde o livro foi originalmente publicado, embora sejam signatários da Convenção de Berna, que regula as questões de direitos autorais, recorrem a artifícios para estender o prazo de vigência dos direitos autorais de obras. O homem mais rico da Babilônia foi publicado originalmente em 1926, nos EUA. Pela lei norte-americana, livros publicados entre 1923 e 1977 sem a notificação e a renovação dos direitos autorais estão automaticamente em domínio público. No entanto, se houve o cuidado de se notificar e renovar os direitos autorais na data da publicação, o livro segue protegido por 95 anos a contar da data da publicação. Assim, O homem mais rico da Babilônia estaria protegido até 2021. No entanto, um estudo realizado pelo Copyright Office em 1961, apenas 7% dos livros publicados nesse período estão nessas condições. As informações são da Universidade de Cornell. João Paulo Riff observa que todos os cuidados foram tomados pela Penguin para que houvesse a renovação dos direitos e reforçou que o livro não está em domínio público.

Caballero diz que, tão logo foi acionado pela Nova Fronteira, tratou de retirar o livro do catálogo virtual da editora na internet. “Para evitar contratempos e futuros problemas com aquela editora, retiramos imediatamente o livro do nosso site e cancelamos toda e qualquer comercialização. Naturalmente que até tomar esta media alguns distribuidores e livreiros já haviam efetuado compras”, contou ao PublishNews, explicando a presença do livro no e-commerce da Saraiva.

Déjà vu

Curioso é que não é a primeira vez que a Nova Fronteira enfrenta um problema semelhante a este. Em maio de 1987, a editora era detentora dos direitos de publicação do livro O livro do riso e do esquecimento, do autor tcheco Milan Kundera. E algumas livrarias brasileiras começaram a receber exemplares de uma edição publicada originalmente em Portugal. Uma matéria publicada no dia 5 de maio daquele ano no jornal O Globo conta que um oficial da 19ª Vara Cível esteve nas lojas da Editora Paisagem do Rio Ltda. com mandato de busca e apreensão para recolher exemplares do livro que estavam sendo vendidos ilegalmente. “O juiz acatou ação cautelar da Editora Nova Fronteira reconhecendo o direito de exclusividade de distribuição de toda obra do escritor no Brasil, conforme contrato com a editora francesa Gallimard, que tem contrato com o escritor de exclusividade na distribuição mundial de seus livros”, diz a matéria. Em defesa, as sócias da livraria – Ana Maria Correia Neves e Maria de Fátima Estrela Arrojado Carrera Pereira – alegaram que importaram alguns exemplares do livro e que restava apenas um exemplar em sua livraria. “Começamos a receber avisos de que o livro vinha sendo distribuído do Recife ao Rio Gande do Sul”, disse Carlos Augusto Lacerda, então editor da Nova Fronteira, ao jornal na época.

[03/02/2015 01:00:00]