Mesmo sofrendo erosões nos últimos anos, o mercado francês de livros é uma potência. O francês lê e isso basta para que a indústria seja forte no país. De olho nesses potenciais, cerca de trinta editores se reuniram na tarde da última segunda-feira (26), no SESC Consolação, em São Paulo para conhecerem um pouco mais sobre o mercado francês e se prepararem para o Salão do Livro de Paris, que vai homenagear o Brasil nesta edição marcada para acontecer entre os dias 20 e 23 de março. O encontro foi viabilizado pelo Brazilian Publishers, projeto setorial da Câmara Brasileira do Livro (CBL) em parceria com a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil). Para apresentar informações sobre o mercado francês, foi convidado Gilles Colleu, cofundador da Vent D´Ailleurs e diretor da Actes Sud, editora de pelo menos dois dos 48 brasileiros oficialmente convidados para o Salão de Paris.
Português é a 12ª língua mais traduzida para o francês, mas a participação de livros brasileiros, segundo Gilles, ainda é tímida. Gilles observou que, segundo dados do Syndicat National de L´Edition (SNE), apenas doze livros de escritores brasileiros foram editados em 2013 no país. “A grosso modo, estimo que esse número chegue a 40 considerando os livros que saíram por editoras independentes, não filiadas ao SNE”, observa Gilles. De acordo com dados do SNE, dos doze títulos brasileiros traduzidos para o francês, dois eram ensaios, sete títulos de literatura e três de literatura infantojuvenil.
Essa realidade se reflete na lista dos 48 escritores que compõem a comitiva oficial do Brasil no evento. Dos 48, 21 têm livros publicados pelas 100 maiores editoras francesas. São eles: Adauto Novaes (Métailié), Adriana Lisboa (Métailié), Adriana Lunardi (Joëlle Losfeld), Ana Miranda (Julliard Edition), Antônio Torres (Métailié, Gallimard), Bernardo Carvalho (Métailié), Betty Mindlin (Métailié), Carola Saavedra (Gallimard), Cristovão Tezza (Métailié), Daniel Galera (Gallimard), Davi Kopenawa (Editis), Fernanda Torres (Métailié), Luiz Ruffato (Métailié), Marina Colasanti (L´Harmattan), Milton Hatoum (Actes Sud), Paloma Vidal (Mercure de France), Patrícia Melo (Actes Sud), Paulo Coelho (Flammarion), Paulo Lins (Gallimard), Ronaldo Correia de Brito (Liana Levi) e Sérgio Rodrigues (Le Seuil). “São variados os interlocutores dos brasileiros na França”, observou o palestrante. Além da Métailié, que se firmou no mercado francês como sendo uma editora de títulos de países sul americanos, destaca-se a independente Anacaona, que, segundo Gilles, tem publicado exclusivamente autores brasileiros na França. “Pelo que pude pesquisar, 20 dos 20 títulos dessa casa são de autores brasileiros”, pontuou.
A tradução na França
Gilles explicou o sistema de traduções adotado pela França. “Embora os tradutores franceses estejam sempre descontentes com seus honorários, eles são relativamente bem pagos, quando se compara com práticas de outros países”, disse Gilles. Lá, o pagamento é feito por lauda. Do português para o francês, o preço cobrado varia de 20 a 45 euros e o tradutor tem ainda direito a 1 ou 2% dos direitos autorais. “Não é financeiramente interessante para o editor traduzir na França. Nesse cenário, é importante ter subvenções”, defendeu Gilles. Ele disse que o ponto de equilíbrio para livros traduzidos na França é de 14 mil exemplares vendidos. No entanto, a venda média na França de um romance, por exemplo, não ultrapassa a marca de seis mil exemplares.
Os gêneros
O gênero mais vendido na França hoje é o de Histórias em quadrinhos. Um livro de HQ lá vende, em média 6.774 exemplares. Seguido por livros de literatura infantojuvenil (6.647 exemplares vendidos, em média) e por livros de literatura geral (5.560). De olho no potencial das HQs, quem estava na plateia era Rodrigo de Medeiros Paiva, diretor de Licenciamentos da Mauricio de Sousa Produções, que deve afivelar as malas em março, rumo a Paris. “Estamos de olho no potencial desse mercado, claro. A Mauricio de Sousa já está presente na Europa, mas queremos apresentar outros títulos com potencial para o mercado europeu”, disse ao PublishNews ao fim do evento. Dados da GfK apresentados por Gilles mostra que o segmento de HQ foi o único que progrediu em vendas de 2012 para 2013 (os dados de 2014, ainda não foram fechados, de acordo com o palestrante). Houve uma progressão de 1,4% frente a queda em outros segmentos. Literatura, por exemplo, decaiu 0,7%; literatura infantojuvenil, -3,1% e livros de arte apresentou queda de 9,7%. “Prevemos para 2014 uma tendência de baixa. O mercado francês vive uma lenta erosão. Cadeias de distribuição, como a Virgin (fechada em 2013), estão desaparecendo, o que implica em baixa de 20 milhões de euros no faturamento dos editores”, comentou Gilles.
O preço e a distribuição
Na França, ao contrário do Brasil, o livro não tem isenção fiscal. Paga-se um imposto (o TVA) de 5,5%. O livreiro fica com algo que varia de 30 a 40% do valor do livro, enquanto que o difusor (figura que inexiste no mercado brasileiro) abocanha de 5 a 9%. De 6 a 12% ficam com os distribuidores. A fabricação é responsável por algo que gravita entre 9 e 20% do preço final do livro. Os direitos autorais variam de 6 a 12% e para o editor pode sobrar de 10 a 25% do valor final do livro.
O livro na França é, na sua maioria das vezes, comercializado pelos varejistas. Dados apresentados por Gilles apontam que 76% das vendas são realizadas por esses canais. Clube de leituras representam 7,9% das vendas. Vendas diretas on line (excluem-se aqui vendas feitas por varejistas on line, como Amazon, já que estas foram enquadradas nos 76% das vendas no varejo) representam 6,6%. O atacado representa 7,9% do mercado e o 1,6% restante é de canais diversos.
Efeito Amazon
Gilles estima que as vendas feitas pela Amazon representam, em média cerca de 10% do faturamento de grandes editoras, multiespecialistas. Mas para uma editora pequena, especializada, as vendas via Amazon podem representar até 50% do faturamento. “A Amazon pede descontos de 50% alegando que fazem o papel de distribuidor e de difusor. São práticas detestáveis, mas para muitos editores pequenos é o único caminho”, avaliou Gilles. Os dados especificamente da Amazon, alertou Gilles, são inacessíveis e não detectados por institutos de pesquisa, como o GfK que baseou a sua apresentação.