Eles amam a Suhrkamp
PublishNews, Roberta Campassi, 01/07/2013
Livrarias da Alemanha se unem para apoiar uma das principais editoras do país, que é alvo de disputa acionária

É com a sutileza de uma declaração de amor que cerca de 200 livrarias independentes da Alemanha se manifestam, hoje, pela preservação da Suhrkamp, uma das mais renomadas editoras independentes da Europa e objeto de uma grave disputa entre seus acionistas.

A campanha é tão simples quanto o mote escolhido: “Nós amamos a Suhrkamp” (“Wir lieben Suhrkamp”). Segundo David Mensche, sócio da livraria Buchbox em Berlim e idealizador da ação, boa parte das lojas participantes montou vitrines exclusivas para os livros da editora e criou algum material que explica aos seus clientes por que, afinal, a Suhrkamp é tão importante. Veja alguns exemplos no Facebook.

Criada em 1950, a Suhrkamp tem um catálogo de literatura e ciências humanas povoado de grandes nomes (entre eles Bertolt Brecht, Max Frisch e o filósofo Jürgen Habermas). Destaca-se também como a casa alemã de muitos autores latino-americanos, como Octavio Paz, Mario Vargas Llosa e os brasileiros Osman Lins, Clarice Lispector e João Ubaldo Ribeiro.

Mas a vitalidade da editora está ameaçada desde que, no ano passado, a disputa entre seus dois principais acionistas se agravou nos tribunais e passou a envolver grandes somas de dinheiro. Resumindo (e muito) o imbróglio, os sócios tentam excluir um ao outro da empresa. Ulla Unseld-Berkéwicz, a acionista majoritária apoiada por vários dos autores da casa, acusa Hans Barlach, o sócio minoritário, de estar apenas interessado em lucro rápido, enquanto Barlach acusa de má gestão Berkéwicz e a atual direção da editora. Segundo uma reportagem do jornal inglês The Guardian, Barlach espera que a editora dê uma margem de lucro entre 5% e 15%, enquanto a atual administração afirma que não é possível superar os 3%.

Na esteira de consequências da disputa, a Suhrkamp chegou ao ponto de iniciar no mês passado um processo de recuperação judicial, o que tem sido visto como uma tentativa por parte da atual gestão de proteger a editora dos efeitos das ações judiciais em curso e também de conter o endividamento.

“A Suhrkamp é um dos principais pilares da vida cultural alemã, mas está ameaçada por investidores preocupados com o aumento do seu lucro e não com literatura”, declara Mensche. Uma pesquisa feita pelo site Boersenblatt, especializado no mercado editorial alemão, mostrou que 576 leitores, entre 940 que responderam a enquete, apoiam a campanha a favor da editora.

Para as livrarias independentes, tão importante quanto o catálogo valioso da Suhrkamp parece ser o fato de ela também manter-se independente em um mercado cada vez mais concentrado nas mãos de grandes grupos, tanto do lado das editoras quanto do lado das livrarias.

“Quando você é um peixe pequeno como nós, que temos quatro lojas pequenas em Berlim, é muito mais fácil negociar com as editoras independentes do que com os grandes grupos”, diz Mensche. “E, para elas, somos importantes porque damos espaço aos livros que publicam.”

É verdade que uma campanha como a “Nós amamos a Suhrkamp” pode parecer um fait-divers sem qualquer efeito prático frente à gravidade da disputa pelo controle da casa. Para seu organizador, no entanto, o objetivo era justamente fazer algo simples, que enfatiza a solidariedade. “Às vezes são as ações simbólicas que ajudam”, diz. “Talvez devêssemos fazer coisas assim mais vezes.”

Roberta Campassi é jornalista e tem experiência no mercado editorial. Foi editora de aquisições da Ediouro, editora-chefe do PublishNews e gerente de negócios da Hondana. Atualmente mora na Alemanha, acompanha de perto o mercado editorial do país e colabora com editoras e veículos brasileiros. Seu e-mail é rocampassi@gmail.com

[01/07/2013 00:00:00]