Tahar Ben Jelloun abre Festival Literário de Berlim
PublishNews, Julie Krauniski, especial para o PublishNews, 08/09/2011
Em seu discurso, ele comentou que considera o escritor uma testemunha do seu tempo e que por isso “a literatura tem um grande papel em criar consciências”

Ontem, dia 7, o Festival Literário Internacional de Berlim (Internationales Literaturfestival Berlin) inaugurou sua 11ª edição com discurso do escritor marroquino francófono Tahar Ben Jelloun. O tema abordado foi “A situação no mundo árabe e a crise no Islamismo” – questão extremamente importante para os europeus, já que são 5 milhões de muçulmanos morando na França e 3,2 milhões na Alemanha, sendo 160 mil só em Berlim. Nos volumes L’etincelle e Par lê feu, publicados este ano na França, e na Alemanha com o título Arabischer Frühling, o escritor elogia a revolução árabe.

Tahar Ben Jelloun nasceu em Fez, Marrocos, em 1944. Em 1956, mudou com a família para Tânger e iniciou os estudos no liceu francês. Graduou-se em filosofia na Universidade de Rabat. Em 1966, foi preso por participar de uma passeata estudantil em Casablanca contra a repressão da polícia marroquina. O jovem filósofo foi punido com 18 meses de serviço militar. Neste período, escreveu seus primeiros poemas em francês. A experiência resultou na antologia Hommes sous linceul de silence, ganhadora do International IMPAC Dublin Literary Award 2004. Em 1971, o jornal literário Souffles, no qual colaborava, foi censurado. Logo em seguida, partiu para a França e fez doutorado em psiquiatria social em Paris. Hoje, é professor de filosofia, autor de diversas obras e ganhador do Prix Goncourt de 1987 pelo livro La Nuit Sacrée. No Brasil, foram publicados os títulos Le denier ami (O último amigo, Bertrand), Partir (mesmo título, Bertrand), Les raisins de la galere (Os frutos da dor, Record), Lê racisme expliqué à ma fille (O racismo explicado à minha filha, Via Lettera) e outros.

Tahar, conhecido por compor seus romances de forma meticulosa, desta vez escreveu um livro em tempo recorde e sobre um tema recentíssimo. "Não tive escolha. Não posso olhar para o lado e fingir que não estou interessado. Sou um autor de romances, mas um escritor para mim é, antes de qualquer coisa, uma testemunha de seu tempo. Acredito que a literatura tem um grande papel em criar consciências", disse Tahar no discurso de abertura da 11ª edição do ILB. Arabischer Frühling reúne ensaios pessoais e políticos, artigos de jornal e observações literárias.

O Festival Literário Internacional de Berlim considera Tahar Ben Jelloun um dos principais porta-vozes dos imigrantes árabes na Europa, mas “o próprio autor não gosta desta ideia”, afirma Mamede Mustafa Jarouche, tradutor e professor de língua árabe da USP, em entrevista. Em 2007, o Sesc São Paulo promoveu o encontro “As palavras viagem, os homens emigram”, com conferência de Tahar e mediação de Mamede. “No evento, ele se revoltou com essa classificação. Considera-se um escritor legitimamente francês”, conta o professor. De fato, publicou mais de 30 livros, todos em francês. “Devemos lembrar que há escritores árabes imigrantes na Europa que continuam escrevendo em árabe por lá. A opção dele pode ser encarada por dois vieses: ou ele supõe que possa ser lido no Marrocos e no Magrebe em geral em francês mesmo, ou então quer atingir um público mais amplo. Veja o caso do Brasil: se ele não escrevesse em francês, dificilmente teria sido traduzido por aqui", diz Mamede.

O último amigo, lançado no Brasil em 2006, é um retrato dos anos de repressão em Marrocos e das desilusões conseguintes. O livro denuncia uma sociedade complexa e contraditória, onde arcaico e moderno coexistem em guerra. “O último amigo faz a mediação das relações dos marroquinos com o seu país e a Europa”, pondera o professor. Em Partir, 2007, Tahar aborda um tema cada dia mais freqüente no mundo globalizado: a impossibilidade de ser. O conflito tratado é o conflito do silêncio, não necessariamente dos embates e catástrofes. No romance, um marroquino heterossexual se relaciona com um gay espanhol para conseguir o visto europeu, desrespeitando, assim, sua própria natureza para escapar do inferno onde vive.

A programação completa do festival pode ser conferida no site do Internationales Literaturfestival Berlin: http://www.literaturfestival.com/
[08/09/2011 00:00:00]