Sem compras governamentais, mercado argentino desaba em 2016
PublishNews, Leonardo Neto, 02/05/2017
E mais: como a abertura do país às importações impactou o mercado de livros na Argentina

No próximo dia 11, durante a Feira do Livro de Buenos Aires, Câmara Argentina de Publicações lança livro com os dados sobre o mercado de livros no país | © Leonardo Neto
No próximo dia 11, durante a Feira do Livro de Buenos Aires, Câmara Argentina de Publicações lança livro com os dados sobre o mercado de livros no país | © Leonardo Neto

Os mercados de livros dos países de língua espanhola têm uma peculiaridade que nós, aqui no Brasil, não levamos muito em conta: o compartilhamento da língua favorece a circulação de obras com muito mais facilidade do que por aqui. Um livro publicado originalmente na Espanha, por exemplo, pode ser facilmente consumido por um leitor do México. “Ser editor em castelhano é um projeto continental”, explicou Trini Vergara, diretora de relações internacionais da Câmara Argentina de Publicações (CAP) e fundadora da V&R, em encontro que teve com o PublishNews durante a Feira do Livro de Buenos Aires que segue até o próximo dia 15.

No entanto, na Argentina, até ano passado, havia um dificultador para essa circulação. De 2011 e até o início de 2016, para cada dólar importado, o importador era obrigado a exportar outro dólar. Diante dessa imposição, livreiros armaram verdadeiras gambiarras para importar livros. A Kel, uma das mais relevantes livrarias do país quando o assunto é livros importados, por exemplo, exportava grãos de soja para poder importar livros.

Fernando Zambra, da Promage,
Fernando Zambra, da Promage,
Uma das primeiras medidas de Mauricio Macri ao ser empossado como presidente, no início de 2016, foi justamente abrir o país para as importações e isso afetou em cheio o mercado editorial argentino no ano passado. “Foi como dar uma garrafa de Sprite gelada para um sedento”, definiu Fernando Zambra, consultor da Promage, empresa que monitora o mercado editorial argentino. Segundo apuração de Zambra, em 2015, a Argentina importou US$ 40 milhões em livros. Em 2016, esse valor saltou para US$ 70 milhões.

“A importação, ao contrário do que querem dizer alguns editores, não prejudica a indústria editorial argentina. Ao contrário. A importação favorece a bibliodiversidade no país. Só para comparar, em 2011, quando não havia restrições às importações, nós movimentamos 90 mil títulos diferentes. Em 2015, com as importações ainda restritas, movimentamos 63 mil”, aponta Antonio Dalto, gerente comercial do Grupo Ilhsa, maior varejista de livros do país e dono das marcas El Ateneo e Yenny, que são responsáveis por 25% do mercado varejista de livros no País.

Zambra, no entanto, observa que as importações de livros já apresentaram queda no primeiro trimestre de 2017 na comparação com o mesmo período do ano passado. Isso porque, segundo o consultor, livreiros colocaram o pé no freio depois da queda das vendas durante o ano passado.

E, sim, houve queda no consumo de livros em 2016. Javier López, CEO da Penguin Random House para América Latina e Argentina, já havia dito ao PublishNews que, na comparação com o ano anterior, 2016 foi bem ruim. Os números apurados por Zambra e que serão reunidos em um livro a ser lançado no próximo dia 11 pela CAP, comprovam isso. De acordo com os dados da Promage, a indústria editorial argentina faturou US$ 540 milhões no ano passado versus US$ 773,5 milhões no ano anterior.

Nessa conta não estão computadas as compras governamentais. Se considerá-las, o rombo é ainda maior. Em 2015, o governo tinha comprado US$ 132 milhões em livros. Em 2016, para não falar que não houve compras, o governo fez uma pequena compra em dezembro, mas as cifras só vão aparecer na contabilidade de 2017. Queda também no número de exemplares vendidos. Se em 2015, o mercado privado vendeu 44 milhões de exemplares, em 2016, foram vendidos 38,5 milhões, queda de 15%.

Exportações

É claro que há o interesse por parte dos editores em exportar conteúdos, aproveitando as possibilidades que o mercado "hispanoablante" permite. Segundo dados da Promage, as exportações de livros na Argentina se mantiveram estáveis entre 2015 e 2016, em US$ 20 milhões. Trini Vergara observa que é necessário que haja algumas mudanças para que o livro argentino seja competitivo mundo afora. Uma das demandas feitas pelos editores, segundo disse Trini, é para que haja a isenção de impostos sobre a produção. "Hoje temos isenção do IVA só no varejo. A produção não está isenta. Se conseguíssemos isentar também a produção, o livro argentino estaria em pé de igualdade com o mundo", comentou.

[02/05/2017 11:24:59]