No final de 2015, Marisa Moura começou uma nova série de colunas. Autores – estreantes ou já consagrados -- ligam para falar na agência literária, mas não é o agente quem atende. Em dezembro, na primeira “ligação”, um aspirante a autor recebe dicas de como cadenciar o seu romance de estreia. Agora, o mesmo autor liga de novo para ter mais dicas.
— Alô.
— Ai que bom que você atendeu de novo.
— É.
— Sim, percebi que você é uma pessoa muito sensível.
— Assim de ouvido?
— Claro. Afinal sou escritor. E escritor de verdade, percebe os outros no fundo da alma. Mas liguei, porque antes de falar com a agente, queria que você me ouvisse mais um pouco. Pode ser?
— Pode. Se você não se incomodar com o barulho do motor.
— Nem vou perceber. O que queria saber era algumas sugestões, pode ser?
— Vai em frente.
— Você acha que o herói tem de ser loiro de olhos azuis? A dúvida se deve porque quando virar filme, os olhos azuis permitem mais efeitos. Porém ele é filho de índios. O que você acha?
— Índio com olhos azuis e loiro? Repete que tem muito barulho aqui.
— Sim, você não acha que essa diferença vai marcar o livro todo?
— Marcar?
— Assim, justamente por ser filhos de índios de cabelos lisos e pretos, o protagonista aparece com o loiro de olhos azuis, pode sugerir outras questões, como é filho mesmo? Adotado? Um vampiro adotado quando criança?
— Ei está complicado para minha cabeça essa coisa que você falou...
— Não te convenceu essa ideia?
— Não! Isso não. Não entendi nada de nada.
— Puxa. Acho que preciso mudar então. Te ligo amanhã. Pode ser?
— Amanhã não estou aqui.
— Te acho. Pode deixar.