A existência de eventos como este permite um contato mais direto entre produtores e o público, e que "novas redes sejam tecidas e o conhecimento se torne colaborativo e horizontal", define Carlos Ríos, da Oficina Perambulante, editora argentina que participa pela primeira vez da Miolo(s). Para Fabricio Max, da livraria Nigra Kora Distro, o feedback em tempo real é bastante relevante dentro do espaço da feira. "Estabelecer relações sólidas com leitores entusiastas e expandir o alcance de obras que, de outra forma, poderiam permanecer na obscuridade", aponta como pontos positivos Fabricio, que terá seu trabalho exposto no hall do 1˚ andar.
A autora e ilustradora Lalo Sousa afirma que, em eventos especializados em produção independente, é possível haver uma troca de experiências especial também entre artistas. “Sempre saio com a cabeça fervendo de ideias e inspirada ao ver soluções e trabalhos dos meus colegas”, comenta. Ela também estará no hall do 1˚ andar.
Quem participa do evento?
A Miolo(s) reunirá neste fim de semana 230 editoras, artistas e coletivos independentes de diferentes lugares do Brasil e da América Latina na Biblioteca Mário de Andrade. Os publicadores apresentarão uma diversidade de produções gráficas, incluindo livros, revistas, quadrinhos, zines, gravuras, objetos de design e arte impressa. Ao todo, são 15 estados brasileiros representados e projetos editoriais da Argentina, Chile, Colômbia e Uruguai. Uma área da feira será destinada a projetos recentes, iniciados de 2020 pra cá. Trinta expositores estarão no sábado e outros 30 participarão no domingo.
Os entrevistados apontaram a existência de um movimento em prol do aumento da diversidade nos expositores de grandes eventos. Cecília Arbolave, sócia da editora Lote 42 e uma das idealizadoras da Feira, afirma que é possível observar um aumento na qualidade dos expositores e na democratização das ferramentas de produção gráfica. “O acesso a ateliês livres, aumento na formação com cursos e oficinas, além da maior visibilidade de artistas e editoras independentes. É um orgulho para nós podermos promover um espaço onde artistas e editoras de todo o país possam se encontrar e compartilhar seus trabalhos”, comenta.
Ainda que o atual contexto demonstre que diversidade e inclusão são uma preocupação por parte das organizações, artistas avaliam que ainda há bastante espaço para melhorias e "furar a bolha". “Exponho em feiras de quadrinhos desde 2017... Posso dizer que não vemos mais só homens cis brancos acompanhados por cinco mulheres brancas e duas ou três pessoas negras... Agora vemos um mar de pessoas brancas com 10 pessoas negras e não-brancas...”, afirma Lalo Sousa, uma das autoras por trás do quadrinho E a Boca do Luxo entra em campo. A obra é uma história de ficção baseada em pesquisa realizada e publicada em 2020 e apresentada na Jornada do Patrimônio do mesmo ano.
A Oficina Perambulante é um dos exemplos de projetos editoriais internacionais da feira, e terá seus trabalhos expostos no Hall Consolação, no térreo. Autodenominado como um projeto "selvagem", de La Plata e Mar del Plata na Argentina, a Oficina confecciona as capas de seus livros a partir de papelão recuperado extraído de espaços públicos de várias cidades da Argentina, por onde viaja. Carlos Ríos, responsável pelo projeto, afirma que essa decisão permite que a editora tenha custos de produção muito baixos, além de promover maior conscientização "acerca do colapso ambiental".
A edição de 2023 será a primeira participação de Ríos na Miolo(s). Ele explica que o idioma não é uma barreira para a participação da editora no evento: "Há muito interesse, especialmente nas expressões mais contemporâneas, da mesma forma que o público argentino sempre procura publicações do Brasil, ciente da qualidade e originalidade de sua arte e design".
O mercado editorial de quadrinhos
Na semana passada, o PublishNews publicou dados referentes ao Mercado Editorial Brasileiro de Quadrinhos. Os dados da pesquisa da Quadrinhopédia revelam um crescimento geral no consumo de quadrinhos em 2021 e 2022. Feiras como a Miolo(s) evidenciam um momento de ascensão dentro do mundo das publicações independentes. "As mídias sociais e a autopublicação desempenham um papel essencial na promoção dessas produções, atendendo à demanda crescente do público por histórias autênticas e inovadoras", afirma Fabricio Max, da Nigra Koro Distro.
A 10ª Miolo(s) será palco de 176 lançamentos de zines, gravuras, livros de artista, contos, biografias, narrativas visuais, lambes, quadrinhos, poesia e prosa. Alguns dos produtores já fizeram postagens com a hashtag #lançamentosmiolos2023 para que o público possa acompanhar as produções de destaque. Confira aqui o mapa dos expositores. Haverá no evento, pela primeira vez, o Cine Miolo(s): o auditório da BMA exibirá ao longo do evento de vídeos dos expositores. Trailers de publicações, depoimentos e bastidores de processos gráficos serão expostos em clipes de até cinco minutos. O público poderá entrar e sair livremente da sala de exibição.
A grande quantidade de expositores demonstra a complexidade de conciliar as diferentes demandas e expectativas dos participantes e dos visitantes. Cecília afirma que a Miolo(s) tem como objetivo promover a diversidade e a qualidade da produção de arte gráfica independente, valorizando os artistas, editoras, coletivos e, principalmente, os leitores. Ela afirma que há diversos desafios (logísticos, financeiros, entre outros) que envolvem a realização de um evento dessa natureza, além da preocupação de garantir a sustentabilidade da feira.
*Estagiária sob a supervisão de Guilherme Sobota