Três Perguntas do PN para Isabel Lopes Coelho, especialista em literatura infantojuvenil
PublishNews, Guilherme Sobota, 10/10/2023
Atualmente publisher na FTD para o segmento, editora completa 20 anos de carreira no mercado editorial em 2023

A editora e pesquisadora Isabel Lopes Coelho completa 20 anos de carreira no mercado editorial neste ano. Em 2003, ela entrou na Cosac Naify como assistente da assessoria de imprensa e saiu, 12 anos depois, como diretora da área de Literatura infantojuvenil. Há 8 anos na FTD, a editora coleciona prêmios, fellowships, um livro publicado fruto do doutorado – e vê o mercado de LIJ se reinventando e fortalecido ao ponto de ser, hoje, "uma das unidades de negócios mais rentáveis das editoras e livrarias". O caráter transversal do segmento – presente no mercado público e privado, trade e no escolar, chegando até a ser tema de cursos exclusivos de pós-graduação – também chama sua atenção. "A LIJ deixou de ser território apenas nas crianças e se tornou assunto de adulto", explica.

Isabel Lopes Coelho respondeu a três perguntas do PublishNews.

– Você tem comentado que a área de Literatura Infantojuvenil tem sido nos últimos tempos uma das mais rentáveis para editoras e livrarias. Que fatores você apontaria que levaram a essa percepção?

A literatura para as infâncias vive um momento muito estimulante com a abertura e fortalecimento de canais de vendas e de debate, como livrarias especializadas e cursos dedicados à formação continuada de profissionais e de pessoas com interesse geral. Essas e outras iniciativas, que são visíveis por todo o país, especialmente pela descentralização da informação que os canais digitais permitem, têm impulsionado o aumento do público consumidor da literatura infantil e juvenil, para além dos leitores "ideais", como crianças e adolescentes. É bastante notável ver como o tema tem sido explorado nos setores público e privado, e em diversas áreas, desde fundações que promovem a leitura e a capacitação de profissionais dedicados, até o consumidor que redescobriu o prazer da leitura compartilhada. Com toda essa movimentação, a literatura para as infâncias têm achado, cada vez mais, oportunidades de promoção, tornando-se atraente para que as editoras possam oferecer obras de qualidade e dentro do debate contemporâneo, com equipes enxutas e dedicadas. Não à toa, temos visto nos último anos uma proliferação de editoras independentes, confirmando o bom momento da área.

– Entre a concepção inicial de um livro e a sua entrega aos leitores, há sempre um caminho longo, inclusive na LIJ, que pode incluir por exemplo ilustrações e outras alterações no formato do livro. Essa diferença no tempo afeta a produção de literatura para jovens leitores (no sentido de tratar ou não certos temas urgentes da contemporaneidade)? É possível identificar tendências na publicação para jovens leitores no Brasil atualmente?

Olha, não vejo o livro para as infâncias como um processo mais demorado do que um livro sem ilustrações, por exemplo. Mesmo pela nossa experiência, o tempo de tradução de um romance juvenil e o consequente trabalho de edição, é bem maior do que a elaboração de um livro ilustrado. Nós começamos a trabalhar nas obras juvenis às vezes com seis meses de antecedência aos livros ilustrados, para que os dois saiam no mesmo momento.

Acredito que, pelo caráter de formação do cidadão leitor, a literatura infantil e juvenil hoje no Brasil tem sido pioneira nos debates das agendas contemporâneas. Há anos que as produções editoriais para as infâncias têm se dedicado às temáticas indígenas e afros, por exemplo. Podemos encontrar, inclusive, obras sobre afrofuturismo que ainda não são tão contempladas nos catálogos de literatura dita adultas. É também parte da discussão editorial a inclusão não apenas étnico-racial (como a representação de personagens de diversas culturas especialmente nas ilustrações dos livros ilustrados), como também de crianças PCDs, trazendo para os leitores e leitoras em formação uma visão de sociedade democrática e empática ainda a ser incorporada na literatura adulta. Também encontramos narrativas de famílias com configurações não-tradicionais, que refletem os modelos encontrados nas casas das crianças, sem problematizar valores, mas quebrando paradigmas. E, claro, os temas ambientais, que são também muito abordados na literatura para as infâncias. Assim, acredito que a literatura para as infâncias têm sido ponta de lança em vários debates.

– Como você avalia a participação da LIJ nos eventos literários brasileiros pós-pandemia? Há espaço suficiente? O mercado tem disponibilizado espaços para discussão, divulgação e reflexão sobre esse assunto?

Os eventos literários têm tido uma maior abertura para contemplar a literatura para as infâncias dentro do debate literário, saindo da estrita atuação de uma programação voltada para leitores crianças e adolescentes que, em geral, são propostas mais lúdicas. Nesse sentido, temos visto uma participação maior dos autores e autoras, ilustradores e ilustradoras, em oportunidades para falar do seu próprio trabalho. O próprio exemplo da Feirinha de Livros, promovida pela Revista 451, é um manifestação dessa percepção. Ainda assim, o espaço é sempre menor do que o da literatura dita adulta, em especial nos veículos de comunicação. Mas acredito que uma nova onda em prol da literatura para as infâncias têm se alastrado positivamente nos canais de comunicação e barreiras têm sido quebradas.

[10/10/2023 11:10:00]