"Muito rapidamente me pareceu evidente – a ponto de não imaginar outra forma de começar – ancorar a história da ruptura em meu ser social na situação que havia sido minha como estudante, uma situação revoltante na qual o Estado francês ainda condenava as mulheres, a necessidade de buscar interrupções clandestinas nas mãos de abortistas clandestinos. E eu queria descrever tudo o que havia acontecido com o meu corpo de menina; a descoberta do prazer, menstruações. E assim, sem que me desse conta na época, aquele primeiro livro, publicado em 1974, traçou a região em que eu iria situar a minha escrita, uma região simultaneamente social e feminista. Vingar meu povo e vingar meu sexo seria, a partir de então, a mesma coisa", disse.
Ernaux afirmou que desde que aprendeu a ler, os livros foram sua companhia, e que o hábito da leitura foi incentivado pela mãe, também leitora voraz. Os preços altos dos livros e o fato de eles serem vistos com desconfiança na sua escola religiosa faziam a autora querer ler ainda mais. Entre outros, ela cita como influências determinantes Dom Quixote, As viagens de Gulliver, Jane Eyre, os contos de Grimm e Andersen, David Copperfield, E o vento levou e mais tarde Os miseráveis, As vinhas da ira, A náusea e O estrangeiro.
Ela contou também que escolheu estudar literatura para permanecer próxima dos livros na vida profissional – e que concebia a literatura "como nada menos do que a possibilidade de transformar a realidade".
No discurso, a autora se perguntou qual o lugar que as mulheres ocupam no campo literário, mesmo em um país democrático como a França. "Elas ainda não ganharam legitimidade como produtoras de obras escritas. Existem homens no mundo, inclusive nas esferas intelectuais ocidentais, para quem simplesmente não existem livros escritos por mulheres; eles nunca os citam. O reconhecimento do meu trabalho pela Academia Sueca é um sinal de esperança para todas as escritoras", afirmou.
A escritora esteve no Brasil em novembro, participando da Festa Literária Internacional de Paraty, da qual foi a grande estrela.
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