Modelo de assinatura de ebooks: bom para nichos, não para o mercado em geral
PublishNews, 31/07/2012
Ceticismo em relação a modelo de assinatura

Outro novo negócio de venda de ebooks apareceu em nosso escritório este mês, divulgando uma proposta de assinatura. Falei ao empreendedor: “Sou cético sobre o modelo de assinatura para ebooks”, e ele respondeu, “Eu sei”.

Tivemos uma grande conversa, mas eu ainda estou cético. Quando falo isso, quero dizer que sou cético de que um modelo de assinatura oferecendo ebooks em geral possa funcionar.

Certamente, há uma lógica no modelo de assinaturas, especialmente para aqueles que pensam que o mercado editorial deveria aprender com outros mercados de conteúdo. A TV a cabo realmente começou com assinaturas e só mais tarde passou a pay-per-view, que é mais como o modelo de vendas de ebooks (mas não exatamente). Temos Netflix para filmes e programas de TV, Audible para audiobooks e uma série de serviços para música, sendo que o mais bem-sucedido parece ser o Spotify.

Tenho uma assinatura do Spotify, apesar de não usá-la muito. Talvez seja besteira, mas gosto de pagar $119,88 dólares ao ano (que significa $9,99 por mês) para ter acesso a simplesmente qualquer música que eu poderia querer ouvir instantaneamente quando surge a necessidade (ou sugestão) para ouvi-la. (Spotify raramente me desaponta por não ter a música.) E isso apesar de que a maioria das minhas necessidades é satisfeita com as mais de 6.000 músicas que tenho no meu repositório do iTunes, das quais as 1.000 melhores estão no meu celular.

Spotify foi citado pelo empreendedor que conheci como uma motivação para começar seu negócio de assinatura de ebooks. Como ele corretamente apontou, “compartilhar uma playlist” com um amigo assinante do Spotify permite que ele imediatamente - sem custos ou fricção adicional - “consuma” aquela música. Compartilhar uma playlist no iTunes com alguém o leva a ter de fazer as compras e, além do dinheiro, é preciso tempo e (um considerável) esforço entre receber a playlist desfrutá-la.

Então, foi colocado que esta lógica deveria se aplicar a livros. Com várias exceções compreensíveis, não tenho certeza se pode ser assim, pelo menos no futuro próximo.

Tenho bem fresco um discurso em Washington sobre o que o Departamento de Justiça entende sobre o mercado editorial. A resposta, se resumida a uma única palavra, seria “granularidade”.

De acordo com a associação de produtores, os lançamentos de filmes nos EUA em 2007, 2008 e 2009, foram 609, 633 e 558 respectivamente. Os filmes estrangeiros, e talvez alguns filmes independentes, não foram contabilizados e podem ser adicionados àqueles números para avaliar o que está disponível, mas a magnitude é essa.

As Seis Grandes Editoras lançam em média mais de 3.500 títulos por ano cada. E há muito mais produção de títulos, além das Grandes Seis, do que há produção de filmes fora dos estúdios de Hollywood. Seria muito conservador estimar que haja 100.000 novos títulos produzidos profissionalmente por ano, voltados para o consumo. (Muito mais é publicado para uso profissional ou como textos de escola ou faculdade, além dos e-books autopublicados, que às vezes atingem o grande público, o que multiplicaria várias vezes este número.)

Lançamentos comerciais de música ficariam entre filmes e livros em número, mas muito mais perto dos filmes.

Esta é a resposta curta a por que a maioria das pessoas compartilha música e experiências de filmes com muito mais amigos e conhecidos do que livros. Também é a resposta curta para o motivo pelo qual pessoas fora da indústria editorial simplesmente não entendem; cada um destes livros é um empreendimento criativo e comercial separado, cada um com seu próprio contrato, seu próprio caminho de desenvolvimento e sua própria exigência de marketing.

(Também ajuda explicar por que muitas pessoas que usam bibliotecas para algumas leituras não as usam para todos os tipos de livros. Nenhuma biblioteca terá todos os livros que um sócio voraz gostaria de ler.)

Nos dias anteriores à Amazon.com e aos livros digitais, havia dois tipos de serviços de assinatura que funcionavam para os livros comerciais.

Clubes de livros ofereciam acordos de preço e curadoria (ajuda com a seleção), mas era o acordo de preços que realmente atraía os membros. Antes das livrarias em todos os lugares (algo que chegou nos anos 80), Book-of-Month Club e The Literary Guild tinham os livros com melhor perfil distribuídos a consumidores que teriam dificuldades em consegui-los (assim como aqueles com livrarias próximas que só queriam a conveniência da entrega pelo correio.) Com o crescimento das livrarias, os Clubes descobriram que “clubes de nichos” (ao redor de mistério, ficção científica ou assuntos como jardinagem) aparentemente eram mais lucrativos do que os grandes clubes de interesse geral. (“Aparentemente” é uma palavra bastante operativa, mas a explicação dela vai ter de esperar outro post.)

O outro conceito de assinatura que funcionou foi o de “séries”. O líder de mercado foi a Time-Life Books. Estes livros tratavam de um assunto em especial (II Guerra Mundial, por exemplo) e eram “empacotados” especificamente para a série, não estando disponíveis em lojas. A continuidade se baseava no interesse intenso sobre o assunto e na mentalidade de “coleção”. Alguém que havia começado a colecionar a série não queria ter buracos em sua coleção.

Ambos os modelos foram derrotados pela compra de livros online que, de repente, fez com que todos os livros estivessem disponíveis para entrega em domicílio, para qualquer pessoa, em qualquer lugar.

Em nichos específicos, os modelos de assinatura podem funcionar muito bem. O avô deles no lado digital é Safari Books Online, originalmente concebido e construído pela O'Reilly em parceira com a Pearson. Safari serve uma comunidade de programadores e possui uma grande coleção de livros instrutivos e de referência voltados para uso profissional. A maioria dos usuários está sempre consultando os livros, e não lendo-os direto. E gostam da ideia de dar uma olhada em vários livros para tratar um problema que estão enfrentando.

Safari foi pioneiro no modelo de dividir a parte das editoras das taxas de assinatura através da métrica do uso. Quanto mais seu livro é visto, mas dinheiro você recebe do total. E como os usuários do Safari vão quase sempre encontrar as respostas que precisam dentro do serviço, deixar seus livros de fora significa que ele não será encontrado e usado. Como pelo menos uma parte do uso do Safari poderia levar à venda do livro em si (mesmo se isso não for muito frequente para a maioria dos livros), este elemento de descoberta é perdido junto com qualquer renda gerada se o livro não estiver incluído no banco de dados. Uma editora pode estar confiante de que não está perdendo muitas vendas se estiver dentro do Safari.

(O modelo que parece ser “tudo que você quiser por um preço único” para o comprador e do tipo “pague pelo uso” para o dono do conteúdo de uma forma ainda mais pura do que o Safari é o acordo oferecido pela Recorded Books e seu serviço de download digital para audiobooks para bibliotecas. Há outros modelos de assinatura no espaço da biblioteca; é uma distração tratá-los neste post, por isso não serão discutidos aqui.)

O’Reilly logo viu que seus livros, sozinhos, não seriam as melhores ofertas de assinatura, então abriram à participação de outros desde o início. Safari é excepcional em pelo menos três pontos: são maiores do que uma editora, são construídos sobre uma base de usuários profissionais, e geram valor principalmente através de trechos, não de leituras de cabo a rabo.

Mas se uma editora é forte num nicho, um serviço de assinatura pode funcionar para eles também: Baen Books (ficção científica) e Harlequin (romance) são duas editoras de nicho que venderam assinaturas com sucesso. (Na verdade, a Harlequin reconhece sub-nichos, segmentando ainda mais sua audiência para ter um alvo melhor.) A editora de ficção científica Angry Robot, da The Osprey, oferece assinaturas. eBooks por assinatura também são parte do modelo da Dzanc, que trabalha mais com livros literários (ficção e não-ficção; não são realmente de nichos, mais de “qualidade”) e será interessante se eles conseguirem fazer o paradigma de “qualidade” funcionar da mesma forma que “romance” e “ficção científica”.

Sourcebooks é uma editora geral, mas possui uma forte lista de romances. A editora está tentando estabelecer um clube e uma comunidade chamada “Discover a New Love” que opera de forma mais parecida com a velha BOMC: assinantes podem escolher um dos quatro títulos em promoção, além de conseguir outros benefícios de descontos em outros livros e a possibilidade de receber antes novos títulos.

Assinaturas são oferecidas na área de livros infantis também. A Disney Digital Books possui um sistema de assinatura mensal, assim como a Sesame Street eBooks. Nos dois casos, o modelo é de entrega baseada em browser em vez de downloads.

A F+W Media é uma editora que funciona em vários nichos verticais. Eles possuem duas grandes vantagens. Uma é simplesmente trabalharem de forma vertical. Possui público definido por seu interesse, o que é a chave para fazer uma oferta de assinatura funcionar no negócio de livros. A outra é que já foram editores de revistas e operadores de clubes de livros, então possuem experiência no contato direto com clientes e na administração destes relacionamentos. Também possuem vários nomes. E a F+W está administrando ofertas de assinaturas para muitas coisas além de ebooks.

A maioria das comunidades da F+W é de não-ficção (específica por assunto) e eles oferecem assinaturas para conteúdo em arte, redação, e design. Mas também estão se aventurando no mercado de romances agora e sua oferta Crimson Romance segue o modelo “tudo que você puder ler”. A Baen introduz o projeto de lançar uma novela em estágios para assinantes, como uma série.

E notamos recentemente que as conferências TED começaram a fazer ebooks (mais ou menos: só funciona em iOS) e um modelo de assinatura é parte do que pensam fazer também. Mais uma vez: num nicho. A app que permite ogerenciamento das assinaturas foi criada por The Atavist, que é outra tentativa de construir uma base para uma editora que se distingue por suas escolhas de conteúdo, como TED ou Dzanc, em vez de manter a divisão por consumidor já estabelecida (romance, ficção científica, ou um tópico como redação ou design.)

Vale a pena notar que há ofertas de assinaturas do tipo “buffet” e outras que são limitadas, mas que oferecem descontos quanto mais compras forem feitas. Essa variação existe em outras mídias também. Spotify é um preço único para tudo; Audible e Netflix medem seu uso e você pode pagar mais se consumir mais.

Há um forte padrão aqui para as ofertas de assinatura que estamos vendo.

Geralmente são feitas pelas editoras. (Safari não é uma editora, mas foi iniciada por editoras.) Isso significa que estão trabalhando com as margens das editoras (maiores do que as de um agregador). Controlar o fluxo do produto significa que podem fazer bom uso da interação com sua audiência, aprendendo através de dados e conversas quais os próximos passos que deveriam dar. E, mais importante de tudo: do ponto de vista da oferta de um produto, estão focados.

É precisamente o oposto de Spotify, Netflix ou Audible que querem todas as canções, filmes, programas de TV ou audiobooks que puderem.



Então, que tal um modelo de ebooks mais geral?





Ainda não existe e não acho que vai acontecer num futuro próximo, apesar das ambições do meu recente visitante. Os desafios de montar a base de títulos são desencorajadores e, como espero que este post deixe claro, também é fornecer e demonstrar valor persuasivo.





Só consigo ver um player que poderia ser capaz de criar uma oferta de assinaturas mais gerais no médio prazo. (Adivinhem quem é.) Os “por quês” disso serão o tópico de um post futuro.





Uma coisa que é bastante certa é que quando existem muitas editoras oferecendo assinaturas em seus nichos (e algum dia isso vai acontecer), elas usarão algum serviço com base na Nuvem de um tipo ou de outro. Ninguém vai pedir ao departamento de TI que crie o software para trabalhar com isso.





Vou admitir que não programei nada específico sobre “assinaturas” noprograma “Book Publishing in the Cloud” que estamos realizando no dia 26 de julho, mas se isso é o que algum participante quiser saber, terá uma grande oportunidade nas sessões de





“Conversas com Especialistas” para conseguir as respostas. Quase todos os palestrantes estarão disponíveis durante um tempo estruturado para conversas, assim como representantes das grandes empresas que estão patrocinando o evento.




Tradução: Marcelo Barbão

[30/07/2012 21:00:00]