Os livros favoritos de Conceição Evaristo
PublishNews, Talita Facchini, 24/11/2023
A pedido do PublishNews, Conceição – que estará na programação da Casa PN na Flip neste sábado (25) – compartilhou seus favoritos; são nomes como Carolina Maria de Jesus, Toni Morrison e Maya Angelou

Conceição Evaristo | @Juh Almeida
Conceição Evaristo | @Juh Almeida
Neste sábado, às 14h30, a Casa PublishNews na Flip terá a participação especial de Conceição Evaristo.

Uma das vozes mais expressivas da literatura afro-brasileira contemporânea, a autora de obras como Olhos d’água e Canção para ninar menino grande, terá o seu livro Ponciá Vicêncio, publicado pela Pallas, como foco central do bate-papo.

Na conversa, que será conduzida pela jornalista Luciana Barreto, da CNN Brasil, autora de Discursos de ódio contra negros nas redes sociais (Pallas), Conceição falará sobre os 20 anos da publicação da obra que abriu caminhos na literatura brasileira ao descrever os caminhos, as andanças, as marcas, os sonhos e os desencantos da protagonista e aborda temas como racismo e escravidão.

O PublishNews aproveitou a participação de Evaristo na programação e pediu para autora revisitar seu grande repertório literário e compartilhar uma lista com seus dez livros favoritos. Na seleção estão nomes como Anne Frank, Carolina Maria de Jesus, Toni Morrison, Maya Angelou, Jeferson Tenório e Itamar Vieira Junior com comentários da autora. Confira.

1 – O Diário de Anne Frank

"A leitura do Diário de Anne Frank, em 1959, desde a primeira página surge edificada a imagem de uma menina judia embaralhada à minha. Ela a menina escritora de 13 anos e eu a menina leitora, que vivia também um sistema opressivo, marcado pela pobreza."

Sinopse: O depoimento da pequena Anne, morta pelos nazistas após passar anos escondida no sótão de uma casa em Amsterdã, ainda hoje emociona leitores no mundo inteiro. Suas anotações narram os sentimentos, os medos e as pequenas alegrias de uma menina judia que, como sua família, lutou em vão para sobreviver ao Holocausto.

Uma poderosa lembrança dos horrores de uma guerra, um testemunho eloquente do espírito humano. Assim podemos descrever os relatos feitos por Anne em seu diário. Isolados do mundo exterior, os Frank enfrentaram a fome, o tédio e a terrível realidade do confinamento, além da ameaça constante de serem descobertos. Nas páginas de seu diário, Anne Frank registra as impressões sobre esse longo período no esconderijo. Alternando momentos de medo e alegria, as anotações se mostram um fascinante relato sobre a coragem e a fraqueza humanas e, sobretudo, um vigoroso autorretrato de uma menina sensível e determinada.

2- Quarto de despejo

"O livro da escritora Carolina Maria de Jesus trazia em suas páginas uma realidade semelhante a que a minha família e eu vivíamos nas ruas de Belo Horizonte. Ler Carolina era ler a nossa vida".

Sinopse: O diário da catadora de papel Carolina Maria de Jesus deu origem à este livro, que relata o cotidiano triste e cruel da vida na favela. A linguagem simples, mas contundente, comove o leitor pelo realismo e pelo olhar sensível na hora de contar o que viu, viveu e sentiu nos anos em que morou na comunidade do Canindé, em São Paulo, com três filhos.

3 – Confissões de frei Abóbora

"Dentre os livros de José Mauro de Vasconcelos, mais até do que o famoso, O meu pé de Laranja Lima, o livro Confissões de frei Abóbora me marcou pela afirmativa do personagem central da obra, que dizia que a morte tinha cheiro de goiaba".

Sinopse: Em As confissões de frei Abóbora, José Mauro de Vasconcelos resgata episódios de sua vida adulta. Ele recupera personagens e fatos referidos em Doidão, ao mesmo tempo que interpola reminiscências infantis e juvenis, posteriormente retomadas e desenvolvidas em O meu pé de laranja lima e Vamos aquecer o sol.

Numa narrativa não linear, o plano da ação e o da memória vão se superpondo, para compor o fio narrativo e a cronologia dos acontecimentos. Por meio de uma história dramática, o romance tem um discurso filosófico, religioso e político que transcende o mero factual. Frei Abóbora, homem despojado de ambições materiais que se devota à causa dos índios, passa a vida entre a cidade e o sertão.

Na visão de mundo do protagonista — um ser em permanente conflito existencial —, as criaturas ligadas à natureza, desprovidas de maldade e malícia, fazem retornar a inocência perdida à alma do homem, corrompida pelo caos de uma civilização eminentemente urbana.

4 – Uma vida em segredo

"Esta obra de Autran Dourado me emociona, me convoca, me faz desejar o encontro das personagens Biela e Ponciá Vicêncio para que as duas conversem sobre a solidão de suas vidas".

Sinopse: Uma geografia que combina a Minas Gerais profunda, onde o autor nasceu em 1926, e o universo tão imaterial e ao mesmo tempo palpável da linguagem, trabalhada das mais variadas formas, do romance ao conto, passando pelo ensaio e a novela. Publicada em 1964, Uma vida em segredo é uma das mais prestigiadas obras do autor. A novela conta a história de Biela, uma moça desajeitada, encolhida e feia, que nasceu e cresceu na roça. Um dia, após a morte do pai, ela chega à cidade, com um vestido antiquado, para viver com o primo Conrado, seu testamenteiro e tutor. Tímida, taciturna, Biela não é apenas uma personalidade discreta, mas alguém que quer preservar sua intimidade, seu mundo pequeno e sereno. Um mundo do qual captamos poucas revelaçőes. Sua vida pacata transcorre, assim, subterrânea, em sua vocaçăo de freira sem claustro, de renúncia às pompas e circunstâncias. Fora um noivado frustrado, muito pouco acontecerá na vida de Biela.

5 - Leite do Peito

"Esse livro de Geni Guimarães, que com algumas supressões de uma parte ou outra, é o mesmo que recebe o título de a Cor da Ternura, e me seduz pela linguagem poética da autora para narrar a história de uma menina preta, desde a infância até se tornar professora".

Sinopse: Livro de contos com referências autobiográficas que narra de forma tocante as lembranças de uma menina negra crescendo e se fazendo mulher. O sonho de ser professora e o amor da família são as forças que ela tem contra as dificuldades financeiras, os preconceitos e ainda ser amiga e defensora da irmã deficiente mental.

6 – Cartas para a minha mãe

"Esse livro de Teresa Cárdenas me convoca para o desamparo da personagem narradora que escreve cartas para sua mãe morta. E a cada evocação da mãe, uma linguagem carinhosa, atravessada de afetos, borda no texto o dia a dia da menina com o seu desamparo que é vencido depois".

Sinopse: Uma menina escreve cartas para sua mãe morta. Através delas ficamos sabendo que teve que ir morar com a tia e as primas, que não gostam dela. Não se cansam de lembrar que deveria fazer um esforço para disfarçar sua cor e ficar mais parecida com uma pessoa branca. Sua avó está sempre desgostosa, com ela e com a vida em geral. Mas a autora das cartas começa lentamente a descobrir um mundo além de seus problemas familiares. À medida que faz amigos ― entre outros, um jovem que também tem problemas com a família e uma velha que é ao mesmo tempo jardineira e bruxa ― suas feridas começam a cicatrizar. A menina fica cada vez mais forte, consegue ganhar o respeito dos outros e aprende a aceitar a si mesma a aos outros. Este é um romance emocionante sobre perdas irreparáveis e sobre o poder restaurador do amor e do autorespeito. Ambientada em Cuba, a narrativa desafia nossas crenças sobre essa ilha que, afinal, conhecemos tão pouco.

7 – Eu sei porque o pássaro canta na Gaiola

"Também um livro impactante, uma espécie de autobiografia da escritora Maya Angelou, que fazendo da escrita um modo de terapia, conta muito de sua vivência durante a infância e juventude também marcada pelo racismo e pela segregação da sociedade norte americana. Uma linguagem poética relata a saga das famílias e da coletividades negras para se afirmarem e sobreviverem nos Estados Unidos e a luta pelos Direitos Civis dos afro-americanos".

Sinopse: A vida de Marguerite Ann Johnson foi marcada por essas três palavras. A garota negra, criada no sul por sua avó paterna, carregou consigo um enorme fardo que foi aliviado apenas pela literatura e por tudo aquilo que ela pôde lhe trazer: conforto através das palavras. Dessa forma, Maya, como era carinhosamente chamada, escreve para exibir sua voz e libertar-se das grades que foram colocadas em sua vida. As lembranças dolorosas e as descobertas de Angelou estão contidas e eternizadas nas páginas desta obra densa e necessária, dando voz aos jovens que um dia foram, assim como ela, fadados a uma vida dura e cheia de preconceitos. Com uma escrita poética e poderosa, a obra toca, emociona e transforma profundamente o espírito e o pensamento de quem a lê.

8 – O olho mais azul

"Essa obra de Toni Morrison me deixou dias e dias com um nó na garganta, tal o sofrimento da personagem central Decola, uma menina negra, acredita que a vida lhe seria leve, boa, se ela se transformasse em uma pessoa branca de olhos azuis. É uma narrativa dolorosa, que só é possível lê-la pela maestria da escritora que é capaz de escrever a dor, a perversidade, o desespero, o abandono, em uma linguagem profundamente poética".

Sinopse: Considerado um dos livros mais impactantes de Toni Morrison, o primeiro romance da autora conta a história de Pecola Breedlove, uma menina negra que sonha com uma beleza diferente da sua. Negligenciada pelos adultos e maltratada por outras crianças por conta da pele muito escura e do cabelo muito crespo, ela deseja mais do que tudo ter olhos azuis como os das mulheres brancas ― e a paz que isso lhe traria. Mas, quando a vida de Pecola começa a desmoronar, ela precisa aprender a encarar seu corpo de outra forma. Poderosa reflexão sobre raça, classe social e gênero.

9- O avesso da Pele

"Essa obra de Jefferson Tenório, ao trazer o personagem Pedro, na busca dolorida pela história do pai, me seduz pelo desejo do personagem de entender o passado, de preencher um vazio que muitas vezes está na conformação das famílias e das coletividades negras exposta aos modos das relações raciais brasileiras".

Sinopse: O avesso da pele é a história de Pedro, que, após a morte do pai, assassinado numa desastrosa abordagem policial, sai em busca de resgatar o passado da família e refazer os caminhos paternos. Com uma narrativa sensível e por vezes brutal, Jeferson Tenório traz à superfície um país marcado pelo racismo e por um sistema educacional falido, e um denso relato sobre as relações entre pais e filhos.

O que está em jogo é a vida de um homem abalado pelas inevitáveis fraturas existenciais da sua condição de negro em um país racista, um processo de dor, de acerto de contas, mas também de redenção, superação e liberdade. Com habilidade incomum para conceber e estruturar personagens e de lidar com as complexidades e pequenas tragédias das relações familiares, Jeferson Tenório se consolida como uma das vozes mais potentes e estilisticamente corajosas da literatura brasileira contemporânea.

10- Torto Arado

"Essa obra de Itamar Vieira me impactou pela história em si, em que as duas personagens centrais, duas irmãs, unidas por uma tragédia, se fundem como se fossem uma voz única a relatar a luta, a condição de vida do sertão brasileiro. O escritor faz um relato de um Brasil profundo que muitas pessoas que querem esquecer, querem ignorar. Uma narrativa densa joga esse Brasil incomodo nos olhos de quem lê".

Sinopse: Nas profundezas do sertão baiano, as irmãs Bibiana e Belonísia encontram uma velha e misteriosa faca na mala guardada sob a cama da avó. Ocorre então um acidente. E para sempre suas vidas estarão ligadas ― a ponto de uma precisar ser a voz da outra. Numa trama conduzida com maestria e com uma prosa melodiosa, o romance conta uma história de vida e morte, de combate e redenção.

[24/11/2023 08:00:00]