Analisar os Audies é algo interessantíssimo não só pelo aspecto de deleite e apreciação artística de tantas produções diferentes, mas também pela quantidade de tendências e insights que podemos colher deles.
No caso do exemplo acima, é demonstrada claramente uma maior diversificação nas modalidades das produções, sinalizando uma busca por diferenciação e inovação.
Não que o formato tradicional (e mais popular) do narrador solo dando vida a uma obra esteja ameaçado, mas é possível que cada vez mais tenhamos experimentações diferentes nesta indústria que só cresce.
Outro dado interessante, é que 24% das obras premiadas foram narradas pelos próprios autores, sendo uma delas, na voz do ex-presidente dos EUA, Barack Obama, que venceu justamente na categoria “Narração Pelo Próprio Autor”. Será que esta tendência, crescente ao longo dos anos, principalmente em segmentos como autobiografia, desenvolvimento pessoal e humor, deve ganhar mais espaço também?
Vamos entender mais!
A cerimônia ocorrida no dia 04, e como sempre realizada pela influente Audio Publishers Association (APA), foi mais uma vez virtual (a exemplo da realizada em 2021), e desta vez foi conduzida pelo ator, produtor e narrador, Kal Penn. Em sua fala inicial, Kal, ao comentar que quando narrou seu audiolivro em um estúdio teve como companhia, além do técnico de áudio, um produtor remoto (que possivelmente, segundo Kal, estava de pijamas em casa) já clarifica outra tendência que foi estimulada pela pandemia, a utilização cada vez mais intensa das possibilidades de gravações remotas.
Os Audies Awards, é preciso destacar, tem como principais objetivos, divulgar e fortalecer a indústria de audiolivros, muitas vezes buscando uma posição evangelizadora. Podemos notar isso no curioso rap que deu início à premiação, que dentre outras coisas, sugere que as pessoas poupem os olhos para ouvir mais (audiolivros, claro), e fala de vendas crescentes das editoras. Uma das características dos Audies é justamente ser um evento leve e bem-humorado.
Mas, não se engane com o ar descompromissado. Falamos aqui de uma indústria verdadeiramente milionária e ainda dominada por grandes players. Nas 25 categorias, tivemos 16 empresas premiadas, sendo que cinco delas detiveram 60% dos Audies: Simon & Schuster Audio (a maior vencedora, com quatro prêmios), Penguin Random House, HarperAudio, Macmillan Audio, e Audible.
O chamado “audio-first”, a ênfase nas produções em áudio, seja com o lançamento concomitante do audiolivro junto com o livro impresso, ou mesmo com a criação de obras originais para o formato, vem se agigantando no mercado editorial, e empresas de nicho dentro do segmento de audiolivros começam a crescer ainda mais. Tomemos como exemplo a Podium, que teve uma obra indicada este ano, e que já foi vencedora de vários Audies em anos anteriores. É uma empresa de entretenimento em áudio focada nos gêneros fantasia, ficção científica e romance e conta com mais de três mil títulos em seu catálogo.
Agora, vamos aos premiados nas principais categorias!
Publicado por aqui pela Suma, Devoradores de estrelas (Project Hail Mary), escrito por Andy Weir (mesmo autor de Perdido em Marte) e com a soberba narração de Ray Porter, levou o prêmio mais cobiçado do ano, além de ter vencido também na categoria “Ficção Científica”. Porter é um ator e narrador experiente, com dezenas de audiolivros narrados, a maioria deles com temática de ação, aventura e ficção científica, algo que já esmiúça outra tendência, a especialização de alguns narradores em nichos temáticos. Uma produção exclusiva da Audible, Project Hail Mary, tem mais de 100 mil avaliações na plataforma, com ouvintes dedicando linhas e mais linhas elogiosas ao conteúdo, mas principalmente à narração de Ray Porter.
Deepti Gupta abocanhou este Audie por sua performance em The Parted Earth, de autoria de Anjali Enjeti e publicada pela Novel Audio (outra empresa focada em audiolivros). A narradora que assim como outros narradores premiados possui uma extensa carreira na televisão, cinema e teatro, deu vida de forma espetacular ao livro, lançando mão de vários sotaques e criação de atmosferas. Interessante saber que a gestação desta obra ocorreu na cabine de narração de Gupta, em sua casa, enquanto, segundo ela mesma, gritava para seu marido e filho fazerem silêncio, e adentrava no universo do livro.
Troféus e estatuetas não são exatamente novidades para Lin-Manuel Miranda, que já recebeu nada menos que premiações como Pulitzer, Grammy, Emmy, Tony e ainda concorrerá ao Oscar deste ano na categoria Melhor Canção Original. O ator, compositor, produtor e letrista, ao narrar Aristotle and Dante dive into the waters of the world (Aristóteles e Dante mergulham nas águas do mundo - Seguinte), de Benjamin Alire Sáenz e publicado pela Simon & Schuster Audio, sagrou-se agora como narrador reverenciado. Em seu discurso de agradecimento, Lin-Manuel Miranda, reforçou como o processo de narração foi extremamente emocional, o que talvez explique a razão de sua narração ter cativado tanto os jurados da APA.
A categoria que premiou a melhor obra em espanhol reforça o substancial crescimento do mercado de audiolivros neste idioma. Como se pode notar pela apresentação realizada pela própria presidente da APA, Ana Maria Allessi, que classificou como “espetacular” o desenvolvimento do mercado em espanhol. O que igualmente é observado ao considerarmos os movimentos levados a cabo por empresas como Audible (que tem feito muito barulho na Espanha, inclusive com parcerias com o Real Madrid e com a Rafa Nadal Academy), Saga Egmont (que vem reforçando sua já sólida atuação com o idioma, tal qual a associação feita com a Roca Editorial), dentre outras.
A vencedora La casa de Bernarda Alba, de Federico García Lorca, publicada pela Penguin Random House, foi uma produção ousada, contando com oito narradoras que gravaram ao vivo, e ainda tendo a dramatização acentuada por música e efeitos sonoros.
A cerimônia completa está disponível clicando aqui.
