Diário de Frankfurt. Dia 6: fim de feira
PublishNews, Marcela Prada Neublum, 24/10/2016
No seu último capítulo do seu Diário de Frankfurt, Marcela Neublum faz uma reflexão sobre os propósitos da feira e dá sugestões a editores

Eu acredito que um bom editor é aquele que já esteve em todas as áreas que envolvam a elaboração do livro, desde a prospecção, desenvolvimento, design, até o fechamento da obra. Apenas quando se conhece todas as etapas sob a perspectiva daquele que as realiza é que o processo deixa de ser fordista e passa a fazer sentido em sua totalidade. Não penso que a Feira de Frankfurt é elemento essencial nessa cadeia. No entanto, o editor que tem a oportunidade de ver de perto o que acontece ali, sem dúvida, passa a entender pontos importantes e, como consequência, tende a questioná-los.

A primeira impressão é surpresa. Nossa rotina dentro de uma editora, de uma área, de um livro, faz com que não tenhamos noção da dimensão do mercado livreiro. No máximo, expandimos um pouco o horizonte por meio das notícias – que, em geral, retratam apenas as grandes companhias dos países de sempre. Quando você chega na Feira e vê a quantidade de pessoas envolvidas e dedicadas a fazer esse objeto ganhar forma, dá orgulho. Mais do que isso: dá vontade de sentar em todos os estandes, de cada lugar do mundo, e conversar com cada um daqueles agentes ou editores para entender como é que eles fazem, para ver as semelhanças, mas principalmente as diferenças, e aprender com elas.

A segunda eu já não chamaria de impressão, mas talvez seja, de fato, uma constatação. É possível fazer uma analogia com a própria sociedade: as editoras com mais reconhecimento – e dinheiro – têm estandes maiores, não um pouco maiores, e sim verdadeiros quarteirões, e o fluxo naquelas pequenas cidades é intenso, em um vai e vem de outras grandes editoras em busca de fazer negócio. Enquanto isso, as pequenas editoras estão em suas quitinetes, geralmente apenas observando o movimento, cheias de conhecimentos maravilhosos para passar, mas sem ninguém para dividir.

Negócio: é triste que o livro tenha se perdido nas entranhas dessa palavra. O que, em geral, ouvimos é: “o que você tem de mais comercial?”, “qual é a média de vendas?”, “e o retorno, é bom?”. Raros são os que pensam no papel social desse que é um instrumento efetivo de geração de conhecimento, e, consequentemente, de possibilidade de mudança do status quo.

Penso também que a cada ano as empresas deveriam mandar novos editores para lá, porque muitos daqueles com quem sentei diziam ser aquela sua quinta Feira, pelo menos. O que isso gera é um movimento mecânico, automatizado, em que, muitas vezes, vemos em cima da mesa, como opção de compra, livros que nos foram mostrados anos atrás, e representantes que apenas mostram uma folha com os famosos highlights, sem muitas vezes saber falar sobre eles.

Passei a semana toda falando sobre as curiosidades e o lado bom da Feira, mas gostaria de terminar levantando alguns questionamentos:

E se, em 2017, você enviasse à Feira aquele seu editor que há anos faz os livros da sua editora acontecerem? E se, em 2017, você incluísse em sua agenda reuniões com editoras menores, não tão conhecidas pelo mercado? E se, em 2017, de cinco projetos com possibilidade de lucro, você aprovasse um pensando apenas em divulgar um ótimo novo escritor ou imaginando as consequências reais que aquele conteúdo poderá gerar no seu leitor?

Sem dúvida, essa foi uma experiência extremamente marcante em minha vida enquanto editora. Eu espero que ela possa ser compartilhada, empiricamente, por todos os editores que, diariamente, trabalham horas a fio para levar às pessoas o melhor livro possível, tanto em termos estéticos quanto em conteúdo.

Auf Wiedersehen, Frankfurt!

[Confira os últimos cliques de Marcela em Frankfurt]

[24/10/2016 08:44:56]