Os dois lados do ‘Efeito Ruffato’
PublishNews, Leonardo Neto, 1º/03/2016
Brasileiro vende sete mil exemplares na Alemanha, mas diz que ainda sente represália por parte do governo brasileiro e que se sente frustrado por vender pouco no Brasil

Ruffato discursando em Frankfurt | © Frankfurt Buchmesse
Ruffato discursando em Frankfurt | © Frankfurt Buchmesse
Em outubro de 2013, Luiz Ruffato subia ao palco da cerimônia de abertura da Feira do Livro de Frankfurt para fazer o seu discurso em que expôs ao mundo as mazelas brasileiras desde o descobrimento do Brasil até os dias de hoje. Ao final, o brasileiro foi aplaudido de pé pelos mais de dois mil convidados da cerimônia. Três anos se passaram desde então. Depois disso, o autor, que já tinha um título publicado na Alemanha, lançou outros três. Juntos, os quatro títulos venderam cerca de sete mil exemplares. Só em 2015, o autor viajou cinco vezes para a Europa e agora se prepara para ir à China e depois segue para França e Itália. Mas, apesar disso, Ruffato acredita que o seu discurso de 2013 mais atrapalhou do que ajudou. “Pelo contrário, eu só perdi. O governo brasileiro nunca mais colocou em uma lista oficial de eventos literários em que o Brasil é o país convidado ou homenageado. Eu sofri represália”, disse ao PublishNews em entrevista na tarde da última segunda-feira.

“Publico no exterior desde 2003 e dizer que meu trabalho repercute só a partir de 2013 é uma injustiça. É minimizar muito o trabalho que a gente vem fazendo há 13 anos. Tem um trabalho anterior que precisa ser considerado”, disse o autor. “Eu hoje trabalho muito mais no exterior do que aqui no Brasil. Tenho viajado muito pelo mundo e aqui, tudo anda meio parado. Se por um lado é bom, por outro é um pouco frustrante porque queria vender livros aqui também”, desabafou. Ruffato hoje contabiliza 26 edições de seus livros, em 11 territórios: Itália, França, Portugal, Argentina, Colômbia, México, Alemanha, Cuba, Finlândia, EUA e Macedônia. São nove edições de Eles eram muitos cavalos, cinco de Estive em Lisboa e lembrei de você, três de Mamma, son tanto felice, três de O mundo inimigo, uma de Vista parcial da noite, uma de Domingos sem Deus, duas de De mim já nem se lembra e duas de Flores artificiais. "A grande maioria, mais de 70% delas, saíram antes de 2013", disse ao PublishNews.

O primeiro título de Ruffato na Alemanha saiu em 2012. Eles eram muitos cavalos foi publicado pela Assoziation A, editora que tem forte engajamento às políticas de esquerda e capitaneada por Rainer Wendling e Theo Bruns.

Rainer Wendling, da Assoziation A, editora que publica Luiz Ruffato na Alemanha | © Bel Diegues
Rainer Wendling, da Assoziation A, editora que publica Luiz Ruffato na Alemanha | © Bel Diegues

Michael Kegler, tradutor de Ruffato na Alemanha, define Wendling: “ele é um maluco”. E a maluquice de Rainer começou ao acaso. Na semana passada, ele contou ao PublishNews que, em 2009, lançou o livro Banlieues, escrito coletivamente por autores que vivem nas periferias de Paris. “Um amigo de um amigo meu leu o livro. E depois de ler, me disse que tinha tomado a decisão de se mudar para uma favela no Brasil com o objetivo de fazer algo parecido”, contou Rainer. O amigo do amigo de fato se mudou para o Rio, mas o projeto não chegou a andar. “Já tinha passado um ano e nada. A homenagem ao Brasil [na Feira de Frankfurt] se aproximava, tinha Copa do Mundo e nós queríamos publicar algo sobre o Brasil”, disse. “Como não falamos português, pedimos a amigos que elaborassem uma lista de autores que poderiam estar no nosso programa”, relembra.

Foi então que Carlos Abbenseth, tradutor do alemão para o português, indicou Ruffato. “Carlos já conhecia o Michael [Kleger, o tradutor] e nos falou do Programa de Apoio à Tradução [da Fundação Biblioteca Nacional]. Michael gostou muito da ideia. Começamos o projeto”, lembra.

“A nossa sorte foi que Ruffato foi escolhido para o discurso de abertura da feira”, observou Rainer. Eles eram muitos cavalos teve sua primeira tiragem esgotada em poucos dias. Depois, o livro já foi reimpresso três vezes e agora a Assoziation A prepara uma versão de bolso do livro. O êxito do projeto permitiu que a editora publicasse outros três títulos do autor na Alemanha: Mama, son tanto felice (2013), O mundo inimigo (2014) e, mais recentemente, Eu estive em Lisboa e lembrei de você (2015). Além disso a Assoziation A publicou uma coletânea organizada por Ruffato em que reúne contos de novos autores brasileiros como Fernando Bonassi, Tércia Montenegro, Cristovão Tezza, André de Leones, entre outros. Para 2016, a Assoziation A prepara o lançamento de Vista parcial da noite.

As conversas com Michael Kegler e com Rainer Wendling aconteceram na última semana, quando o PublishNews acompanhou, a convite do ministério das Relações Exteriores da Alemanha, um grupo de sete editores brasileiros que esteve visitando editoras alemãs em Frankfurt e em Berlim. Para ler outras matérias sobre a viagem, clique aqui.

[01/03/2016 10:08:18]