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A contratação e o trabalho de um ghost writer
PublishNews, 10/06/2011
Escritores fantasmas

A atividade de um editor é bastante variada e até hoje imensa parte do que se realiza é aprendido na prática. Em minha experiência, muitas vezes tive de realizar tarefas sem mesmo saber como elas poderiam funcionar na prática e sei que há bastante curiosidade sobre o assunto. Para mostrar um pouco do que fazemos no dia a dia, tenho usado nesta coluna alguns exemplos tirados de filmes. O assunto de hoje é a figura do Ghost Writer, o escritor invisível. Como se contrata e como o trabalho deve ser realizado? O que funciona? É melhor partir de entrevistas com o autor? Iniciar o trabalho baseado num texto do autor e completar com entrevistas? O que se deve evitar? Como agir numa negociação de um contrato? Qual é a medida da participação do ghost e do autor? Como mediar essa relação para que se tenha o que se deseja e evitar conflitos? Enfim, são inúmeras questões, e por isso indico o recente filme do Polansky.

O ghost writer é uma figura pouco conhecida, porque é melhor que seja anônima, de modo a dar ao autor que assina o livro um talento extra, pois além de ser um profissional reconhecido em sua área (o que lhe favorece chegar aos leitores), nós esperamos que tenha um texto magnífico. No mundo real isso raramente acontece, e é aí que entra em campo esta entidade - um escritor profissional que põe em ordem as ideias do autor, extrai dele o texto que falta e completa de modo lógico as lacunas não resolvidas. Sim, escrever livros profissionalmente é um trabalho, e mais árduo ainda porque tem de parecer que foi mesmo escrito por quem irá assinar e defender o texto publicamente.

No filme de Polansky, o ghost é o personagem central e também é tratado com reconhecimento de seus pares. Nos EUA e Europa é normal encontrar livros em que eles aparecem na capa, em segundo plano ou sob o texto “com colaboração”, “em depoimento a”, e afins... Se passarem a observar mais agora, vocês poderão se lembrar de vários livros escritos por ghosts, inclusive nacionais.

O filme mostra detalhes da escolha e contratação de um ghost via agente literário e também como funciona o trabalho do ghost para um livro de memórias, no caso, do ex-primeiro ministro da Inglaterra (fictício), Adam Lang (Pierce Bronsnan), que está sendoa cusado de prender e torturar, até levar à morte suspeitos de terrorismo, e tem toda a imprensa e ex-aliados contra si. Esse é o cenário em que o novo ghost (Ewan Mcgregor) começa a trabalhar. Ele é chamado depois que seu antecessor, amigo de Lang, fora encontrado morto na praia, com suspeitas de suicídio. A editora que o contrata pertence ao grupo Random House. O escritor então é levado para um local reservado nos EUA, uma espécie de escritório da editora localizado numa ilha - um lugar retirado de modo a garantir a segurança do texto escrito por Lang.

Sobre este original escrito pelo autor é que nosso ghost terá de partir para escrever a história, mas o que ele encontra provoca sono e estupefação: texto piegas, chato, cabotino, recheado de egocentrismos e autoelogio sob um verniz de estadismo. Então ele sabe que o trabalho será duro, e tem apenas um mês para fazê-lo. Mas o problema são as lacunas, as informações que não batem, o desejo do autor de pintar o melhor quadro de si, algo que o ghost não poderia compactuar (pois, lembrem, ainda que os leitores possam não saber que foi ele quem escreveu, já que assinou um contrato de confidencialidade, as pessoas da área saberão). Então, de escritor fantasma ele acaba por se transformar numa espécie de investigador... E é onde tudo fica mais emocionante. Mas é um filme para ser visto, então trago aqui o momento da contratação: Veja o trecho do vídeo.

Alguns detalhes para observar no filme:

• A negociação entre ghost, agente e assessores do politico.

Reparem na reunião dentro da Random House, no momento em que o ghost é perguntado em que ele poderia contribuir com o livro e ele responde que “NADA!”...

• Percebam nos detalhes da conversa como ele cria a relação de confiança com os contratantes e o que o credencia para o trabalho. Marketing pessoal, confiança, disposição, conhecimento da matéria...

• Destaque ao cuidado com o qual o original é tratado na ilha.

• E o símbolo da frase: “Ghost writers não são convidados para festas de lançamento. Somos uma vergonha como uma amante num casamento”, do ghost writer, respondendo a uma conhecida na festa de lançamento do livro que escreveu, mas para a qual não foi convidado.

Este é um filme para ver e rever. Sempre que revejo percebo mais detalhes, ora sobre o roteiro, ora sobre o cuidado ao apresentar a atividade editorial ali.

Bom, espero que gostem, mandem notícias em meu blog. Indicações são bem-vindas. Tenho três filmes para comentar, mas prefiro fazer surpresa depois do feriado. Até a próxima edição!

Pedro Almeida é jornalista profissional e professor de literatura, com curso de extensão em Marketing pela Universidade de Berkeley. Autor de diversos livros, dentre eles alguns ligados aos animais, uma de suas paixões. Atua no mercado editorial há 26 anos. Foi publisher em editoras como Ediouro, Novo Conceito, LeYa e Saraiva. E como editor associado para Arx; Caramelo e Planeta. É professor de MBA Publishing desde 2014 e foi presidente do Conselho Curador do Prêmio Jabuti entre os anos 2019 e 2020. Em 2013 iniciou uma nova etapa de sua carreira, lançando a própria editora: Faro Editorial.

Sua coluna traz exemplos recolhidos do cinema, de séries de TV que ajudam a entender como funciona o mercado editorial na prática. Como é o trabalho de um ghost writer? O que está em jogo na hora de contratar um original? Como transformar um autor em um best-seller? Muitas dessas questões tão corriqueiras para um editor são o pano de fundo de alguns filmes que já passaram pelas nossas vidas. Quem quer trabalhar no mercado editorial encontrará nesses filmes algumas lições importantes. Quem já trabalha terá com quem “dividir o isolamento”, um dos estigmas dos editores de livros. Pedro Almeida coleciona alguns exemplos e vai comentá-los uma vez por mês.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews

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