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Ciclo de conferências 'Mutações' coloca a ideia de progresso em questão

Organizador Adauto Novaes conta que, pela primeira vez, projeto não foi aprovado na Lei Rouanet
Adauto Novaes, organizador do ciclo de conferências "Mutações", que acontece há 31 anos Foto: Hermes de Paula / Agência O Globo
Adauto Novaes, organizador do ciclo de conferências "Mutações", que acontece há 31 anos Foto: Hermes de Paula / Agência O Globo

RIO - Nascida no Iluminismo, a ideia de “progresso” foi um amálgama para uma sociedade que assistia à primeira revolução tecnológica, que colocava Deus em xeque e buscava as respostas para as questões mais fundamentais através da razão, e depois da ciência. A civilização caminhava para frente rumo à terra prometida do futuro. Passados mais de três séculos, a utopia do progresso está mais para a distopia ambiental e humanitária. Com o objetivo de refletir sobre o que aconteceu, o ciclo de conferências “Mutações”, capitaneado por Adauto Novaes, começa na próxima terça-feira com o tema “Dissonâncias do progresso”. A palestra inaugural será do filósofo e professor da USP Vladimir Safatle, cujo título é “Teoria da revolução, progresso e emergência”, às 19h, no Teatro Maison de France. Em diálogo com Marx, Safatle vai discutir como a produção do excesso no capitalismo engendra um sistema contínuo de contradições e, consequentemente, de crises. Na ocasião, será lançado o livro do último ciclo, “Entre dois mundos” (Edições Sesc).

Novaes destaca que “progresso” não chegar a ser um conceito.

— Progresso é uma forma, talvez menos do que isso, um clichê e um slogan. Sem conteúdo, mas com um enorme efeito sobre a Humanidade, posto que se tornou uma crença. Tanto a esquerda quanto a direita se encontram no elogio ao progresso. Se você for pensar bem, os partidos de esquerda e direita não questionam a ideia de progresso — afirma Novaes.

Ao longo das conferências do ciclo, que vão acontecer no Rio de Janeiro, em Belo Horizonte e em Brasília até o fim de outubro, os convidados vão abordar as origens da ideia de progresso no Iluminismo, a transformação por que ela passou e seus diversos desdobramentos. No dia 27, Marcelo Jasmin, professor do Departamento de História da PUC-Rio, vai apresentar a conferência “Civilização, des-civilização e violência” e, no dia 18 de outubro, a francesa Céline Spector vai tratar de “Civilização e desrazão — Ambivalências das Luzes”.

— Nietzsche diz que é preciso olhar como as coisas se constituíram na sua origem — diz Novaes. — O progresso virou quase uma religião. De repente, ele ganhou uma autonomia muito grande em relação à própria organização da sociedade. Virou um fim em si mesmo.

O organizador do ciclo há 31 anos conta que esta edição é também uma forma de resistência: pela primeira vez, o Ministério da Cultura não autorizou que o projeto captasse recursos através da Lei Rouanet, sob a justificativa que o “Mutações” não seria um projeto cultural. Assim, o dinheiro arrecadado com as inscrições — através do site www.mutacoes.com.br — será utilizado para arcar com os custos de passagem e hospedagem dos convidados.

— São 31 anos de ciclo, 37 livros publicados, três prêmios Jabuti. Nada disso serviu. Os conferencistas vêm generosamente. Eles (do Estado) têm medo do pensamento — critica Novaes, que contou com o apoio da Embaixada da França e do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais.