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Obra que reúne 1,5 mil frases no latim ganha nova edição e prova sua atualidade

‘Não perca o seu latim’ se tornou indispensável a quem queira se aventurar pela língua clássica

RIO — Na biblioteca do escritor Carlos Drummond de Andrade, o exemplar de “Não perca o seu latim”, do filólogo, ensaísta, crítico e tradutor Paulo Rónai está todo anotado e com frases destacadas. Drummond foi um dos leitores ilustres da obra que, desde a sua primeira edição, em 1980, se tornou indispensável a quem queira se aventurar pelo latim. O livro, em que Rónai reuniu 1,5 mil expressões, provérbios e sentenças latinas, volta às livrarias após anos fora de catálogo pela Bazar do Tempo (326 páginas, R$ 58), que vai reeditar as suas obras. Cada frase é acompanhada da sua tradução em português e um exemplo de sua utilização, quase sempre retirado de uma obra literária.

Por exemplo, a frase com que o presidente Michel Temer abriu sua famosa carta à ex-presidente Dilma Rousseff em dezembro de 2015 — verba volent, scripta manent — está traduzida por Rónai como “as palavras voam, a escrita fica”, junto com uma referência bem-humorada. Escreve Rónai: “Guilherme Figueiredo dividiu seu livro ‘A pluma e o vento’ em duas partes: VERBA VOLANT (Tomara que não) e... SCRIPTA MANENT ( Assim espero )”. Fábio Frohwein, professor de Latim da UFRJ que encontrou o exemplar anotado de Drummond, destaca que o tradutor quis mostrar a permanência do latim na atualidade.

— Ele tinha à disposição dez mil frases em latim para colocar no livro. Poderia ter feito um dicionário de frases superior aos existentes até então. Mas não era o seu objetivo. Por isso ele vai resgatar nas obras de autores brasileiros e estrangeiros a presença do latim. Na minha pesquisa, eu contei 83 autores de língua portuguesa citados por Rónai no livro — diz Frohwein.

O acadêmico Marco Lucchesi, que assina o prefácio da nova edição, conta que descobriu a obra de Rónai na adolescência. Na época, ele chegou a escrever uma carta para o tradutor, elogiando “Não perca o seu latim”, encontrada muitos anos depois pela editora Ana Cecília Impellizieri Martins, diretora da Bazar do Tempo e autora de uma tese de doutorado sobre a obra de Rónai. Lucchesi aponta para o desejo de comunicação que movia o tradutor.

— Seus livros são a marca de uma busca de diálogo além de toda e qualquer fronteira. Justamente o que não temos hoje no Brasil e no mundo. “Não perca o seu latim” é um livro científico, cuidadoso e sensível. Eu recomendaria a leitura no Supremo — afirma o acadêmico.

Tanto Lucchesi quanto Frohwein concordam que o latim é uma língua do presente e não do passado. O professor da UFRJ, inclusive, está preparando um curso de latim para bibliotecários, parte de um convênio da universidade com a Fundação Biblioteca Nacional.

— São mais de 400 instituições no país com acervo de obras raras. Mas os bibliotecários em geral não têm conhecimento de latim e de grego para fazer uma catalogação perfeita. A gente não só ajuda esses profissionais, mas eles também nos ajudam a mostrar como é fundamental a manutenção de pessoas qualificadas nessas áreas.