04/02/2016 05h50 - Atualizado em 04/02/2016 05h50

Homens posam nus para financiar biblioteca LGBT no DF

Calendário é vendido a R$ 50 e contou com voluntários de sete estados.
Ex-vendedor de cocadas teve ideia após ver intolerância sexual e religiosa.

Raquel MoraisDo G1 DF

Página de calendário feito para financiar Biblioteca da Diversidade em Brasília (Foto: Reprodução)Página de calendário feito para financiar Biblioteca da Diversidade em Brasília (Foto: Reprodução)

Incomodados com a violência contra homossexuais e a intolerância religiosa, 12 bibliotecários e estudantes da área posaram nus para um calendário que vai financiar um espaço voltado à diversidade em Brasília. Os modelos são de sete estados e são voluntários no projeto. Cada calendário custa R$ 50. Até agora já foram vendidos 350 exemplares – com compradores na França, Espanha, México e Itália.

A ideia foi do bibliotecário e servidor da Câmara dos Deputados Cristian Santos. O homem, que foi barrado na escola quando criança por ter uniformes velhos e posteriormente conseguiu fazer cinco cursos superiores, já mantém em casa um acervo voltado à temática LGBT. Entre os cerca de 600 itens da coleção estão a revista em quadrinhos "Satiricon", de Petrônio, e o filme brasileiro "Hoje eu quero voltar sozinho". Todos são fruto de doações.

"Como a biblioteca ainda não tem sede própria, ela está funcionando, provisoriamente, em minha casa. Qualquer pessoa pode visitá-la. Basta agendar um horário. Além de sugerir um bom livro de nosso acervo, ofereço uma xícara de café fresquinho e apresento o projeto. Aos poucos, a comunidade vai se sensibilizando a respeito da importância de se criar um centro de informação destinado a discutir a diversidade sexual", declarou.

Estou convencido que a ignorância produz ódio e seu oposto, o conhecimento, gera liberdade individual e coletiva. A biblioteca tem um papel importante de responder os sinais dos tempos. Afinal de contas, a tolerância não basta"
Cristian Santos,
idealizador do calendário

"Isso me parece muito importante no quadro atual. Afinal de contas, embora tenhamos a maior parada gay do mundo, o Brasil é campeão em assassinatos da população LGBT, segundo dados da International Lesbian and Gay Association. Estou convencido que a ignorância produz ódio e seu oposto, o conhecimento, gera liberdade individual e coletiva. A biblioteca tem um papel importante de responder os sinais dos tempos. Afinal de contas, a tolerância não basta", completou Santos.

O objetivo é instalá-la em uma loja na W3 ou no Conic. De acordo com o bibliotecário, os terrenos são avaliados em R$ 900 mil. O calendário surgiu como possibilidade de ajudar a levantar parte do dinheiro e divulgar o projeto. O homem convidou colegas por meio de redes sociais e diz que centenas se dispuseram a ajudar. Ele afirma que pessoas famosas também já manifestaram apoio ao espaço.

Página de calendário feito para financiar Biblioteca da Diversidade em Brasília (Foto: Reprodução)Página de calendário feito para financiar Biblioteca da Diversidade em Brasília (Foto: Reprodução)

"Sonho com um espaço efetivamente plural, frequentado por jovens e adultos, estudantes e trabalhadores, heterossexuais e homossexuais. Para isso, é fundamental que a Biblioteca da Diversidade esteja localizada no coração de Brasília, garantindo a todos acesso fácil aos livros, filmes, palestras e cursos", explica. "Só que não tenho, sequer, um centavo."

Os fotografados foram escolhidos por uma pequena comissão, que buscou também uma pluralidade entre os modelos. O calendário foi montado ao longo de 50 dias. Santos conta que algumas pessoas confidenciaram ter comprado o artigo esperando vê-lo em uma das páginas. "Não foi necessário tirar a roupa. Afinal de contas, recebi dezenas de fotos."

Para potencializar a arrecadação de dinheiro, o homem conta que em março também passará a vender canecas e camisetas no site da biblioteca. A data de inauguração já foi escolhida: 7 de outubro deste ano.

"Há uma razão especial para a data: nesse dia se celebra a festa de São Sérgio e São Baco, soldados cristãos do exército do imperador romano Maximiano. Segundo John Boswell, historiador da Universidade de Yale (EUA), eles formavam um casal, respeitado, inclusive, pela própria Igreja [Católica]", explica.

Página de calendário feito para financiar Biblioteca da Diversidade em Brasília (Foto: Reprodução)Página de calendário feito para financiar Biblioteca da Diversidade em Brasília (Foto: Reprodução)

Revolta pessoal
Santos conta que passou a considerar o projeto depois de ler em um jornal que um homossexual é morto no Brasil a cada 28 horas. A insatisfação ficou maior ao assistir, meses depois, a incêndios de terreiros de umbanda e candomblé em Brasília.

"E me perguntei: o que esses perseguidos têm em comum? O ódio coletivo. E pensei? Por que não há espaços culturais destinados a cultivar a diversidade como elemento configurador da natureza humana? Será a primeira biblioteca com esse objetivo no país", declara o homem.

A ideia é fornecer mais que um acervo que contemple minorias sexuais e religiosas: também estão previstos cursos, seminários e debates.

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