Rio

Com filmes, exposições e internet, Biblioteca Parque Estadual atrai mil pessoas por dia

Reaberto em março, espaço no Centro do Rio já recebeu 100 mil visitantes, atraídos por um novo conceito de biblioteca
Colorida. Num ambiente em que os livros e a tecnologia digital convivem lado a lado, a Biblioteca Parque Estadual recebe um público diversificado, de crianças a doutorandos Foto: Gustavo Stephan / Agência O Globo
Colorida. Num ambiente em que os livros e a tecnologia digital convivem lado a lado, a Biblioteca Parque Estadual recebe um público diversificado, de crianças a doutorandos Foto: Gustavo Stephan / Agência O Globo

RIO — Folheando páginas repletas de histórias, Nilza redescobre o prazer da leitura. Cleiton passa a tarde imerso em sua pesquisa de doutorado. O morador de rua Douglas se debruça em livros nos quais projeta a esperança de construir um futuro diferente. Todos num mesmo lugar: a Biblioteca Parque Estadual. O espaço reabriu completamente transformado, após uma reforma, em 29 de março. E desde então, no coração do Rio, perto da Central do Brasil, de portas abertas para a Avenida Presidente Vargas, a Saara e o Campo de Santana, já recebeu 100 mil visitantes, ou cerca de mil pessoas por dia.

É um público diversificado, que chega atraído por um novo conceito de biblioteca. Como o próprio slogan do lugar diz, ali tem de tudo, até livros. Atualmente, são cerca de 80 mil exemplares, com meta de chegar a 200 mil. Mas seus 15 mil metros quadrados abrigam também área para exposições, laboratórios, auditório, estúdio de som, café literário, 250 computadores com acesso gratuito à internet, espaço multimídia com cerca de 20 mil filmes e, a partir desta quinta-feira, um teatro.

SHOWS E INTERNET LEVAM AO LIVRO

Foi uma fila em frente à biblioteca que despertou a curiosidade de Nilza Maria de Carvalho, de 57 anos, moradora do Centro. As pessoas aguardavam para assistir a um dos shows da primeira exposição que o espaço recebeu, sobre o centenário de Vinicius de Moraes. No dia seguinte, lá estava ela. Entrou, assistiu à mostra sobre o poetinha e, desde então, virou frequentadora assídua.

— Fiquei deslumbrada. Vim, depois, para ver filmes e usar a internet, até que peguei na estante o primeiro livro, sobre o Teatro Municipal. Não parei mais — diz Nilza, que estudou até o 7º ano do Ensino Fundamental, mas que, agora, pretende voltar à escola. — Quero estudar para ler melhor — afirma ela.

Ao passo que Nilza alimenta a nova vontade, outra mudança já está em curso, influenciada pelo mergulho no universo da leitura. Há anos ela tinha perdido sua carteira de identidade e não dava importância à falta do documento. No entanto, Nilza descobriu que, para poder usufruir de todas as possibilidades da Biblioteca Parque — como pegar emprestado e levar para casa quase todo o acervo — é necessário fazer um cadastro. E são dois os documentos necessários: uma identificação com foto e um comprovante de residência. Incentivo forte o bastante para ela correr atrás de uma nova via da identidade.

Poder levar livros, a propósito, foi um dos fatores que moveram o doutorando em Ciências Sociais da Uerj, Cleiton Maia, de 27 anos, para a biblioteca. Faz um mês que ele também virou habitué do lugar, onde complementa sua pesquisa sobre o povo cigano no Brasil:

— O acervo daqui é interessante, com livros acadêmicos novos, recém-lançados. E o diferencial é poder pegá-los emprestados. Em muitas outras bibliotecas, não acontece assim.

Desde a reinauguração, já foram oito mil empréstimos realizados pela instituição, com cinco mil pessoas cadastradas, diz Vera Schroeder, superintendente da Leitura e do Conhecimento da Secretaria estadual de Cultura. Ela lembra que há espaços nos mesmos moldes em Manguinhos, na Rocinha e em Niterói. A ideia foi se aproximar de experiências bem-sucedidas no exterior, como na Colômbia e na Europa, com a criação de ambientes atraentes, despojados e coloridos, em que a leitura conversa com várias outras formas de expressão.

— As bibliotecas, assim como os museus, são os espaços que hoje mais se reinventam. São cada vez mais vivas e alegres, diferentes daquele modelo mais tradicional e sisudo de anos atrás — diz Vera.

Outra prerrogativa da Biblioteca Parque, afirma ela, é ser um lugar acessível a todos, como espaço público que é. Há um setor com equipamentos de última geração, para pessoas com dificuldades cognitivas ou motoras. E mediadores sociais entram em cena para acolher os moradores de rua que circulam na região e que encontram ali o início de novas perspectivas.

O jovem Douglas Marques da Silva, de 19 anos, por exemplo, mora na rua e viu na biblioteca a chance de manter contato, pelas redes sociais, com a família, de Seropédica. Lá, descobriu ainda que podia ocupar parte do tempo assistindo a filmes, nas cabines de vídeo. E, como já está se tornando comum acontecer entre frequentadores, suas atenções saltaram rapidamente do universo multimídia para os livros. Em especial, sobre o assunto que mais o interessa: desenho.

— Lendo, mantenho a cabeça ocupada. Sou desenhista — disse, revelando uma possível vocação.

Foram as linhas do prédio reformado e moderno, projeto dos anos 1980 do arquiteto Glauco Campelo, que chamaram a atenção de Douglas. Na revitalização, o lugar ganhou ainda janelas que reduzem o calor, mobiliário de Bel Lobo e paisagismo da Fundação Burle Marx. Um ambiente tão convidativo que, na semana passada, durante a Copa, virou ponto de encontro até de torcedores argentinos. E que, com uma área infantil e ambiente lúdico, estimula as crianças.

— Foi minha filha, Julia, que pediu para vir — contava Maria da Conceição de Jesus, de 30 anos, moradora de Macaé em férias no Rio e que, na última sexta-feira, foi conhecer com a família a novidade.

NOVO TEATRO SERÁ ABERTO NA QUINTA

Um teatro que dialoga com o acervo da Biblioteca Parque Estadual. Essa é a novidade que, a partir desta quinta-feira, se junta às atrações do espaço. Com capacidade para 310 espectadores e 250 metros quadrados, o lugar tem uma estrutura modular, que pode tomar diferentes formas, dependendo da montagem apresentada.

A proposta é que seja um teatro aberto à experimentação, com espetáculos inéditos, atividades vinculadas ao incentivo à leitura, laboratórios de dramaturgia, performances e shows musicais, entre outros usos. A abertura oficial será com o espetáculo “Nem mesmo todo o oceano”, baseado num romance do escritor que dá nome ao espaço, Alcione Araújo, com a Cia OmondÉ e direção e adaptação de Inez Viana. A peça ficará em cartaz nos dias 17, 18, 19, 22, 23 e 24 de julho, às 19h. E, antes das apresentações, nos dias 19, 22 e 23, às 17h, acontecerão leituras de obras de Alcione Araújo, sempre com entrada gratuita.

SERVIÇO

Horário de funcionamento: Terça a domingo, das 10h às 20h.

Para fazer carteirinha: É preciso apresentar um documento de identificação com foto (RG, carteira de motorista, carteira de trabalho ou passaporte) e um comprovante de residência com no máximo três meses (conta de luz, gás, telefone ou atestado de moradia).

Onde fica: Avenida Presidente Vargas 1.261, no Centro. Telefone para contato: 2332-8647.