Sobre o ato de não escrever
PublishNews, Redação, 12/04/2021
Publicado originalmente no ano 2000, ‘Bartleby e companhia’ marcou época ao colocar o fazer literário no espelho e mesclar diversos gêneros de maneira radical

Em Bartleby e companhia (Companhia das Letras, 184 pp, R$ 69,90 – Trad.: Josely Vianna Baptista e Maria Carolina de Araújo), o catalão Enrique Vila-Matas recupera a figura de Bartleby (personagem criado por Herman Melville), um jovem escrivão que se esquiva de obrigações e misteriosamente vai se ausentando de toda e qualquer atividade graças a uma resposta enigmática que dá a todos que pedem para que realize algo: “eu preferia não o fazer”. A frase deixa seus interlocutores perplexos, e pouco a pouco Bartleby se isola até quase sumir. Vila-Matas faz com que essa “pulsão negativa” escape do conto de Melville e, como um vírus, atinja diversos escritores por toda parte. O protagonista de Bartleby e companhia, então, se dedica a rastrear e catalogar autores, fictícios e reais, que escolheram o silêncio, como o americano J. D. Salinger, que, após se tornar uma celebridade com O apanhador no campo de centeio, afastou-se da sociedade e deixou de publicar, ou o suíço Robert Walser, cujo maior sonho era ser esquecido. Ao escrever sobre o ato de não escrever, Vila-Matas captou com perspicácia a crise do pós-modernismo, em que se supõe que todas as ideias já foram inventadas e não resta mais originalidade, para construir, a partir de detritos e restos, uma obra cômica e criativa que se tornou objeto de culto ao redor do mundo.

[12/04/2021 07:00:00]