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Como fazer o Português ter importância econômica?
PublishNews, Pedro Almeida, 26/05/2017
Ou, a quem cabe a internacionalização da nossa literatura? Pedro Almeida responde.

As políticas para o livro parecem ser criadas, em sua maioria, por quem não trabalha diretamente com os livros, nem entende dos aspectos práticos e da influência que a leitura tem sobre a macroeconomia. Basta passar os olhos sobre as propostas que circulam e você verá, quase sempre, que as políticas são focadas em interesses microeconômicos, políticos, ideológicos e até como campanhas de marketing de empresas. É raro vermos uma iniciativa de Estado no campo da língua e da leitura.

Penso que o Estado não deve interferir tanto nos princípios da economia, nem se meter em negócios privados, muito menos em empresas. Mas idioma, língua, cultura não pertencem a nenhum grupo de empresas. É a bandeira de um país e de onde tudo tem partida. Não se pode entregar apenas às empresas o dever de defender o idioma e a literatura de uma nação.

Sinto a necessidade de afirmar isso porque perdi as contas das vezes que ouvi que NÃO cabe ao Estado o papel de propulsor da internacionalização da literatura brasileira, que isso deveria ser capitaneado por empresas privadas, que ganham muito dinheiro com isso e etc. Lembro da fervorosa discussão sobre os custos da nossa participação na feira do Livro em Frankfurt em 2013, quando o Brasil foi o país homenageado, que recaía pesadamente sobre o Estado. E não vou entrar em mérito sobre como foi gasto. Mas aquela ideia não é um caso isolado. O Estado brasileiro não entendeu completamente que a força da comunicação, da língua, é o que traz dimensão econômica para um país.

Afinal, quem deveria atuar para aumentar a importância econômica do Português e da Literatura Brasileira?

Como o assunto é extenso, propus-me a falar sobre um grupo de temas por artigo. Mostrarei pelas iniciativas nesse campo do fomento da internacionalização do livro, que não apenas as políticas públicas são mais abstratas que efetivas, como estamos muito longe de tornar nossa literatura mais conhecida com os atuais paradigmas existentes sobre quem ganha mais com a sua difusão.

Vamos pelo começo: Qual a relevância de termos autores brasileiros publicados no exterior?

A mentalidade de que a internacionalização da literatura brasileira é um grande negócio para as editoras é um erro matemático, que não se sustenta sob qualquer ponto de vista. E parte de um senso comum de quem não entende do negócio do livro, que nunca criou nenhum bilionário no país e, arrisco dizer, no mundo.

Para colocar em números: uma editora que almeje receber, por ano, US$ 120 mil em royalties, sobre as vendas de TODOS os seus autores no mercado internacional, teria de alcançar uma venda total de cerca 750 mil exemplares de livros, a um preço médio de US$ 10. Quantas editoras conseguem vender 750 mil exemplares/ano no exterior? Eu desconheço. O que é possível pagar de despesas com pessoal e operação dos negócios internacionais dentro de uma editora com US$ 10 mil por mês? Resta evidente que o negócio que sustenta o livro brasileiro está no Brasil e que as vendas internacionais não são, ainda, um negócio por si só.

Então chegamos a uma questão dupla: porque as editoras insistem em vender direitos para o exterior? E, o que um livro nacional promove em termos de negócios para o país?

A tentativa de conseguir vender direitos e sua relação de lucro versus investimento tem retorno financeiro infinitamente menor e mais arriscado do que a simples publicação no próprio Brasil. Então não é um grande negócio. É um jogo! Um jogo de retorno financeiro duvidoso e que se mistura com investimentos de marketing e de relacionamento, diferenciação para a editora e, em outros casos, para dar uma segunda utilização ao livro já existente, tratando como "lucro" qualquer receita que dele vier.

Para muitas editoras, a tentativa de vender os direitos para o estrangeiro é também um fator positivo para manter seus autores felizes ou para atrair novos autores que almejam carreira internacional.

Mas aqui está a questão mais importante. À parte dos parcos recursos provenientes dos direitos autorais, um autor no exterior é como uma bandeira de seu país. Sua literatura fala sobre costumes, lugares, emoções, cidades, indústrias, estilos de vida, oportunidades, desafios. Sua exposição na TV e jornais é a melhor propaganda de uma nação pode ter. Melhor, mais eficiente e econômica que, por exemplo, comprar espaços publicitários em aeroportos, TVs e agências de viagens para mostrar o país. Um autor, com suas ideias, numa roda de debates ou em entrevistas para a TV, coloca nosso país-continente em cena.

"Quer saber de um setor que ganha muito mais com a indústria internacionalização da literatura? O turismo. Quantos não vieram ao Brasil para conhecer a Bahia de Jorge Amado ou de Pierre Verger?"
"Quer saber de um setor que ganha muito mais com a indústria internacionalização da literatura? O turismo. Quantos não vieram ao Brasil para conhecer a Bahia de Jorge Amado ou de Pierre Verger?"

Quer saber de um setor que ganha muito mais com a indústria internacionalização da literatura? O turismo. Quantos não vieram ao Brasil para conhecer a Bahia de Jorge Amado ou de Pierre Verger? Ou pela natureza exposta em livros do país que tem mais de 20% da biodiversidade do planeta? Quantos negócios se pode pensar a partir de apenas essas duas vertentes: Turismo e Biodiversidade que são divulgados a partir de livros? Que indústrias podem ter interesse nisso? Alimentação, vestuário, centros de pesquisas, farmacêuticas, comércio exterior, relações internacionais, cursos de idiomas, formação de tradutores; algo que pode tornar o país um polo de atração de profissionais gabaritados nas melhores universidades do mundo. Só até aqui já ficou impossível contabilizar a quantidade de divisas atraídas ou por vir. E basta lembrar que todos os hábitos de um país são retratados pelos personagens de um livro como fé, gastronomia, arte, bebidas, design, enfim.

Não à toa países que já possuem grande importância econômica e com um idioma mais popular aos estrangeiros como França, Alemanha e Austrália, financiam, anualmente, viagens de editores para conhecer as editoras de seu país e comprar direitos. Lá eles não pensam que estão ajudando a indústria do livro, mas divulgando a sua cultura em diversos países do mundo. Mas se você acha isso coisa de país rico, temos o exemplo da Turquia, mesmo com toda a instabilidade política, não interrompeu seu programa e levou, em 2016, mais de 20 editores de todo o mundo para conhecer as editoras turcas com os mesmos objetivos.

Qual a maior barreira para acessar a cultura do país senão o nosso idioma? Vencendo isso, todas as outras iniciativas ficam facilitadas e mais próximas do sucesso. De negócios e mercados a pesquisas e trabalhos científicos, seríamos vistos com mais frequência como uma boa oportunidade de investimento.

Mas não há uma iniciativa assim no Brasil. E é algo que faria muito bem ao Estado, às suas finanças, aos impostos que arrecadaria e aos brasileiros. Frente a isso, qualquer possível ganho que eventualmente as editoras tenham no processo, será proporcionalmente insignificante quanto ao que se pode ganhar todo o país, em setores que realmente movimentam a economia.

Divulgar o nosso idioma seria o princípio de qualquer plano que pretenda ver o Brasil forte perante o mundo.


O que falta entender é que não se faz isso sem a língua. E não existe língua forte sem Literatura. Defendamos nossa bandeira e todas as oportunidades alvissareiras nos serão apresentadas. Precisamos tornar o português uma língua com importância econômica. Sem medo de estrangeirismos, priorizando algo melhor para a língua brasileira.

Este artigo inicia uma série tratando sobre o tema: Como fazer o Português ter importância econômica? Falarei em breve sobre programas de tradução, intercâmbio, Prêmio Nobel, teoria das relações internacionais. Há muitas iniciativas em que podemos nos inspirar. Se você conhece bons exemplos internacionais ou nacionais nesse sentido, comente aqui ou mande para pedrozalmeida@uol.com.br.

Pedro Almeida é jornalista profissional e professor de literatura, com curso de extensão em Marketing pela Universidade de Berkeley. Autor de diversos livros, dentre eles alguns ligados aos animais, uma de suas paixões. Atua no mercado editorial há 26 anos. Foi publisher em editoras como Ediouro, Novo Conceito, LeYa e Saraiva. E como editor associado para Arx; Caramelo e Planeta. É professor de MBA Publishing desde 2014 e foi presidente do Conselho Curador do Prêmio Jabuti entre os anos 2019 e 2020. Em 2013 iniciou uma nova etapa de sua carreira, lançando a própria editora: Faro Editorial.

Sua coluna traz exemplos recolhidos do cinema, de séries de TV que ajudam a entender como funciona o mercado editorial na prática. Como é o trabalho de um ghost writer? O que está em jogo na hora de contratar um original? Como transformar um autor em um best-seller? Muitas dessas questões tão corriqueiras para um editor são o pano de fundo de alguns filmes que já passaram pelas nossas vidas. Quem quer trabalhar no mercado editorial encontrará nesses filmes algumas lições importantes. Quem já trabalha terá com quem “dividir o isolamento”, um dos estigmas dos editores de livros. Pedro Almeida coleciona alguns exemplos e vai comentá-los uma vez por mês.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews

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