Como escrever um livro de cozinha
PublishNews, 27/07/2012
Como escrever um livro de cozinha

Do clássico The elements of style (Longman, 105 pp., US$ 15,95), de William Strunk e E. B. White, ao surpreendente On writing (Scribner, 288 pp., US$ 16), de Stephen King, não é difícil encontrar, em inglês, títulos que pretendem ensinar a escrever – ou, pelo menos, que relacionem algumas regras básicas e dêem conselhos para cultivar e aprimorar o estilo. A lista segue com diversos volumes específicos: como criar obras de ficção, ficção científica, cenas eróticas, textos sobre saúde e sobre... comida. Um dos mais recentes é How to write about food (Amazon Digital Services, para o Kindle, US$ 9,95), publicado em março, em que a autora S. J. Sebellin-Ross fala do que é necessário para alguém se tornar um “crítico de restaurantes, jornalista de gastronomia, autor de livros de receitas e blogueiro”, e ainda ganhar dinheiro com isso (bem, é o que ela promete). Na mesma linha existe Will write for food: The complete guide to writing cookbooks, blogs, reviews, memoir and more (Da Capo Lifelong Books, 360 pp., US$ 15,95), de Dianne Jacob, reeditado em 2010 com um capítulo extra sobre a escrita pessoal na internet por causa do sucesso que a blogueira Julie Powell começou a fazer com seu Julie & Julia (Record, 352 pp., R$ 39,90), aquele que virou filme com Meryl Streep fazendo uma impagável Julia Child.

Mais antigo, The recipe writer’s handbook (Wiley, 336 pp., US$ 24,95), de Barbara Gibbs Ostmann e Jane Baker, vai direto ao ponto: trata da melhor maneira de elaborar receitas para que sejam claras e concisas em diversos veículos, como o rádio, a televisão e, claro, a internet. Outros meios de comunicação também têm mostrado interesse em ajudar seus leitores a elaborar melhor seus escritos culinários. No fim de junho, o site Food52 deu dicas para criar boas introduções, os headnotes, em livros de cozinha: conte uma historinha a respeito daquele prato, descreva uma situação engraçada, ofereça possibilidades para variar os ingredientes ou dê algum aviso pertinente a respeito dos temperos, do equipamento necessário ou do tempo despendido naquela preparação. E, na semana passada, o jornal britânico The Guardian publicou um artigo com os ensinamentos de Alice Hart, autora de três títulos editados desde 2010. Embora algumas de suas recomendações sejam universais – sim, para escrever bem é preciso, antes de mais nada, ler, ler, ler, e isso vale para qualquer gênero –, outras, mesmo que óbvias para a categoria “livros de cozinha”, ainda passam despercebidas em boa parte dos volumes à venda por aí. Testar as receitas, por exemplo, duas vezes no mínimo, se necessário uma terceira, para ter certeza de que as medidas, as indicações de temperatura, o modo de preparo, tudo esteja correto e possa ser reproduzido em casa pelo leitor. (Eu já contei, aqui, de como me senti enganada ao ver que o livro de uma chef badalada não só não abria o jogo para os leitores como parecia complicá-lo ainda mais). Pensar no leitor também é importante, e sem esnobismo, diz Alice Hart: ele terá acesso àquele forno turbinado que o autor usou para fazer seu assado especialíssimo? Mantém mandolines, mezzalunas e gadgets de uso mais limitado sempre à mão, na gaveta da cozinha? Tem todo o tempo do mundo para ficar virando a carne na panela a cada 30 minutos, durante 4 horas, até que ela se desmanche dos ossos? (Aqui vale outro parêntese para dizer que esse tipo de impossibilidade culinária caseira ainda está muito presente nos livros de chefs, de quem cozinha profissionalmente em restaurantes. Volto ao tema numa outra ocasião.)

Mas o ponto da escritora que me deu mais certeza de que ela estava sendo honesta em tudo o que escreveu foi o último: não espere ficar rico com isso. A não ser que você seja a Martha Stewart, a Nigella Lawson, o Jamie Oliver ou o Gordon Ramsey, pra ficar apenas em alguns, autores iniciantes de livros de cozinha são (mal) pagos da mesma maneira que outros autores iniciantes. “Você certamente precisará de outras fontes de dinheiro para pagar as contas”, escreve Alice. “Mas pelo menos terá comida boa na geladeira.” É isso aí.

[26/07/2012 21:00:00]