Não quero ter livro
PublishNews, 13/04/2011
As diversas etapas do texto que será um livro

Ouvindo, por acaso, a piada “O Italiano e o Macaco” de José Vasconcelos, ocorreu várias lembranças do mercado editorial. Sim, ela é antiga, mas permite vários paralelos. Por exemplo, o que se pressupõe em algumas etapas do texto que será um livro.

Na piada, o problema é a falta do macaco no carro Cadilac 1960 - Rabo de Peixe. Não vou contar nada do texto de José Vasconcelos, ouçam pelo link. Todavia, vamos levantar algumas semelhanças:


1. Alguém sugere uma ideia para o autor, algo simples, que deveria sair em três meses. No entanto, por razões que o ‘universo’ nunca explica, fica a sensação de que foi escrita uma palavra por dia. E o texto demora o tempo que não interessa nem ao autor, nem ao agente e nem a editora para ficar pronto. No fim, sem livro.



2. Um fato chama atenção de autor ou editor, mas alguém precisa realizar a ação e não se consegue compor o personagem para o caso. O personagem é figura essencial na maioria das narrativas. E não se tem um livro.



3. Da noite para o dia, decide-se escrever um livro, assim sem nenhuma experiência de fazer um texto, quando mais prepará-lo para ser livro. E com umas 300 páginas escritas, percebe-se: que adianta ter escrito se não é um livro. Não pode ser publicado.



4. Outra experiência muito comum: contrata-se alguém para escrever a biografia ou a história de algum empreendimento, normalmente, por um preço muito maior da ‘tabela do mercado’, e ainda assim o texto não pode ser livro. Não interessa nem à agente e nem à editora. E, muitas vezes, nem aos amigos.



5. Enfim, temos um texto que interessou ao agente e ao editor e já está na fase de preparação para seu formato final. Nesse momento, o profissional detecta a falta de algo muito importante. Comenta com editor, que também concorda. Mas do autor, a falha vai exigir uma grande mudança em muitas partes. Como o autor vai reagir? E o livro engasga.



6. Um texto para crianças, ou infantil como chamado no mercado, está pronto. Atende a todas as necessidades do mercado e do governo. Mas precisa de ilustrações. Ou o autor não aprova os ilustradores oferecidos pela editora ou a editora não consegue um resultado que ache interessante. E não se tem livro.



7. O autor que mais vende na editora aceita a encomenda de livro para fazer parte de uma coleção. O texto está pronto, sensacional. Mas não tem o perfil da coleção. Publica-se em que contexto? Explica-se como essa questão ao autor? Se tem livro e não se sabe como publicar.



8. Pronto, o texto passou por todas as etapas, o livro existe. Mas a divulgação não consegue imprensa para o livro, as escolas não o adotam, os livreiros não o querem na livraria. O livro é real para autor e editora. E assim feito.



9. O autor tem um excelente texto. Seus livros vendem muito, mas não tem um bom relacionamento com a imprensa nem consegue fazer palestras. O leitor fica magoado.



10. Pensa-se nos projeto de coleção, no momento do planejamento das obras, começam os pressupostos. Ah, mas isso fulano não faz. Aquilo, o agente dele não vai deixar. O editor chefe do maior jornal do país não gosta de ciclano. E por aí vai. O livro entala nos pressupostos.

Estamos esperando o dia em que vamos receber alguém, provavelmente, que saiba de algumas histórias tristes do mercado editorial e como fala José Vasconcelos: ‘olha aqui, não quero nem saber de autor, nem de agente e nem de editora. Aliás nem sei por que toquei a campainha.’.

[12/04/2011 21:00:00]