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Entidades do livro: é possível trabalharem juntas?
PublishNews, 15/04/2014
Entidades do livro: é possível trabalharem juntas?

O PublishNews publicou, faz alguns dias, matéria relatando que a ABDL – Associação Brasileira de Difusão do livro “sugeriu” à CBL, ANL e ABEU “promover encontros periódicos para discutirem juntas assuntos do setor”. E anunciou para esta terça-feira, 15 de abril, a primeira reunião do grupo.

Alvíssaras. Espero que a reunião aconteça e produza alguma coisa. Qualquer coisa. Pelo menos marque uma próxima reunião... Mas, a essas alturas, depois de quilômetros rodados na observação das questões de políticas do livro, permito-me tecer algumas observações.

A primeira, uma simples curiosidade: o SNEL não se qualifica? A ABRELIVROS tampouco? Talvez isso não haja sido noticiado e essas entidades tenham sido convidadas. Oxalá.

Já tratei anteriormente dessa multiplicidade de entidades ligados ao livro. Tantos dos editores quanto dos autores. As desses últimos, coitados, muito mais anêmicas. Dá pena qualquer comparação quando se vê a Author’s Guild dos EUA peitando o Google, parando Hollywood, etc. Mas, fiquemos nas entidades do livro.

A tentativa de reunir as entidades de editores e livreiros para discutir os problemas comuns não é nova. Aliás, o assunto esteve muito em pauta no final dos anos 1990 e começo do novo milênio, em particular nas administrações de Altair Brasil e Raul Wassermann na presidência da CBL.

Uma das maneiras de buscar o mínimo de articulação acontecia com a realização dos Encontros Nacionais de Editores e Livreiros, que já não são realizados há vários anos. A história desses encontros registra que sempre aconteciam em resorts, cidades turísticas. Tanto Altair Brasil quanto Raul Wassermann procuraram fazer que acontecessem em cidades que faziam feiras de livros, no período imediatamente anterior à sua abertura. Isso atendia a dois propósitos: prestigiar as feiras, e aumentar a participação dos editores e livreiros pelo menos nos seus primeiros dias; aproveitar o esforço dos organizadores, geralmente as câmaras regionais de livros, para a discussão dos problemas. Lembro de Encontros em Fortaleza, Curitiba e Porto Alegre.

Não era fácil organizar esses encontros. Apesar do apoio das entidades locais, as despesas com hotel e hospedagem, além da própria taxa de inscrição, inviabilizavam a presença de editoras e livrarias menores. Mas alguns deles foram produtivos, inclusive com convidados internacionais importantes. Francisco Weffort, quando ministro da Cultura, esteve no de Curitiba.

Raul Wassermann e sua diretoria tentaram dar um passo adiante nos mecanismos de governança da CBL, no sentido de incluir as entidades como sócias, em uma categoria chamada de “sócios institucionais”, que participariam em um Conselho Político com papel na definição de rumos e propostas da entidade. O projeto de novo estatuto foi amplamente discutido. Encontrou forte resistência por parte de membros do Conselho de Fundadores, pois este perderia, pelos novos estatutos, a atribuição de aprovar previamente o nome dos candidatos à presidência da entidade.

A definição dos sócios institucionais ficou assim: “Art. 10º - São Sócios Institucionais as organizações ou entidades assim aceitas pela Diretoria e que integrarão o Conselho de Políticas do Livro, onde terão direito a voz e voto”

A modificação mais importante, entretanto, era a constituição do Conselho de Políticas, que mereceu todo um capítulo naquele estatuto:

Art. 32º – O Conselho de Políticas é órgão assessor da Diretoria, cabendo-lhe:

a) discutir a política estratégica da entidade, em relação ao livro e sua difusão;

b) assegurar a unidade da classe, dirimindo dúvidas e controvérsias, constituindo-se como foro apropriado para os debates de todas as questões de interesse da categoria;

c) assegurar a representatividade nacional da classe, através da participação de diferentes Câmaras do Livro e outras entidades similares devidamente reconhecidas como tais;

d)apreciar e emitir julgamento sobre comportamentos, atitudes e atividades de membros da CBL, no que sempre procederá mediante denúncia que deverá ser formulada por escrito e da qual deverão constar, detalhadamente, os fatos a serem apreciados, aplicando as penas estabelecidas nestes Estatutos;

§ único – Das decisões do CP cabe recurso à Assembleia Geral, sem efeito suspensivo;

Art. 33º – O Conselho de Políticas será composto por:

I – membros da Diretoria Executiva;

II – um representante de cada entidade do livro afiliada à CBL ou que for expressamente convidada pela Diretoria da CBL;

III – ex-presidentes da CBL;

IV – membros do Conselho de Fundadores, como tais definidos no Art. 9º dos Estatutos anteriores, pessoas jurídicas, serão membros do CP, nos termos destes Estatutos;

§ 1º – Os membros do Conselho de Fundadores integrarão o CP, mas não serão substituídos no caso de desligamento da empresa do quadro associativo por qualquer razão;

§ 2º – O Presidente da CBL é o presidente do CP.

§ 3º – A Assembleia Geral aprovará as listas de entidades convidadas a participar do Conselho de Políticas;

Art. 34º - O CP organizará seu regimento interno que deverá ser aprovado pela Diretoria;

Art. 35º – Ao aceitar participar do CP, os representantes das entidades do livro comprometem-se a acatar suas recomendações e decisões e procurar implementá-las junto a suas entidades; (As citações foram retiradas dos meus arquivos. Eventualmente pode ter havido modificações no texto finalmente aprovado, mas não tenho tempo, paciência nem disposição, para gastar dinheiro indo ao cartório pedir cópia autenticada).

O novo estatuto foi aprovado. E revogado logo nos primeiros meses da administração Oswaldo Siciliano, encerrando essa tentativa de institucionalizar a cooperação ativa das várias entidades do livro na formulação de políticas.

A questão que sobra, para além dos aspectos formais, é a pergunta: Qual a razão dessa multiplicidade e das dificuldades de se fazer essa articulação? No post já mencionado, listei algumas dessas questões, que tento resumir em seguida.

Quando falamos da indústria editorial e livreira, estamos na verdade falando de segmentos industriais e comerciais com interesses diferenciados e muitas vezes conflitantes: basta citar as diferenças que acontecem entre livreiros e editores. Entre os primeiros, certamente existem grandes dificuldades entre as grandes cadeias e os livreiros independentes ou segmentados. Entre os editores, então, nem se fala. O segmento de obras gerais tem uma dinâmica e interesses que muitas vezes estão longe de coincidir com os dos livros técnico-científicos, com os didáticos e com os religiosos. As editoras universitárias também têm um desenho institucional distinto. As entidades regionais também têm outra dinâmica e interesses específicos, e por aí vai.

O que não quer dizer que não haja interesses comuns. Existem, e seria importante que se buscasse o consenso e uma atuação unificada. Na verdade, a única instituição que, em tese, deveria abrigar essas diferenças é a Câmara do Livro. Infelizmente, não consegue. Chegamos ao ponto do SNEL inventar uma nova entidade, com o fim exclusivo de entrar com a ADIN que hoje corre no STF sobre as biografias, por estar impedida de fazê-lo por ser entidade sindical oficial. Nada impediria que qualquer outra entidade assumisse a paternidade da ação, avalizada por todas as demais, pois esse é, sem dúvida, um assunto de interesse comum. Mas fez-se o que foi feito. Não existe acompanhamento sistemático das ações da administração e dos projetos de lei que tramitam no Congresso.

Somando-se a essas diferenças de objetivos e de representatividade, sem dúvida aparecem as disputas regionais, inclusive a caricata pinimba Rio-São Paulo. Além de vaidades e outras motivações menores, que podem ser passageiras e mutantes como as nuvens, mas que sempre existem.

Depois de acompanhar de perto, por mais de vinte anos, isso tudo, só desejo realmente boa sorte para essa nova tentativa. Com muito ceticismo, mas com muita sinceridade.

Felipe Lindoso é jornalista, tradutor, editor e consultor de políticas públicas para o livro e leitura. Foi sócio da Editora Marco Zero, diretor da Câmara Brasileira do Livro e consultor do CERLALC – Centro Regional para o Livro na América Latina e Caribe, órgão da UNESCO. Publicou, em 2004, O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a cultura, política para o livro, pela Summus Editorial. Mantêm o blog www.oxisdoproblema.com.br. Em sua coluna, Lindoso traz reflexões sobre as peculiaridades e dificuldades da vida editorial nesse nosso país de dimensões continentais, sem bibliotecas e com uma rede de livrarias muito precária. Sob uma visão sociológica, ele analisa, entre outras coisas, as razões que impedem belos e substanciosos livros de chegarem às mãos dos leitores brasileiros na quantidade e preço que merecem.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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