Não, Mike Shatzkin NÃO falou que o mercado editorial está em uma espiral de crise
PublishNews, 11/12/2013
Não, Mike Shatzkin NÃO falou que o mercado editorial está em uma espiral de crise

Como parte da promoção da conferência Digital Book World, dei algumas entrevistas para o muito talentoso Jeremy Greenfield, o editor do blog oficial do evento. E Jeremy pegou nossas conversas e as dividiu em pequenos pedaços tratando dos temas de nossa apresentação. Como o foco da Digital Book World é “como o digital está mudando o mercado editorial”, a Amazon é um tópico de grande interesse e tentamos abordá-lo de uma forma original e esclarecedora.

Na minha entrevista a Jeremy, que ele publicou excertos breves, mas precisamente editados, falei que as editoras iriam enfrentar dificuldades para manter seus autores quando a participação da Amazon crescer uns 25% mais que sua base atual ou se a Barnes & Noble fechasse. Nenhuma dessas coisas tem grande probabilidade de acontecer nos próximos anos. Se e quando chegar o dia em que uma dessas coisas acontecer, nem todas as editoras estarão totalmente indefesas mesmo com o arsenal de recursos de hoje. E a matéria de Jeremy fecha com minha sugestão de que as editoras podem se ajudar fazendo “marketing digital em escala, que é centrada na audiência em sua base.”

Independente de como isso possa ser interpretado em alguns círculos, não quer dizer que o mercado editorial está “em uma espiral descendente”.



A Amazon já é um complicador forte no mercado e não está claro para ninguém - a não ser para quem está dentro da Amazon - até onde eles pretendem ir. Eu já tinha escrito antes que não sabemos nada sobre o mercado de livros usados que eles alimentam, mas que podemos assumir que diminuem as vendas, especialmente de best-sellers que possuem muitas cópias em circulação. Houve uma discussão recente em uma mailing list da qual participo sobre como não sabemos quantos ebooks estão sendo publicados. Por quê? Porque Bowker, que distribui números de ISBN e portanto nos ajuda a contar os títulos que chegam ao mercado, não necessariamente trata (e conta) com os títulos que ficam exclusivamente dentro da Amazon e portanto só usam o “ASIN” da Amazon como substituto do ISBN. Outras livrarias de ebooks trabalham com títulos sem números de ISBN, mas só a Amazon tem um mercado grande o suficiente sozinha para fazer um número substancial de autopublicações.

E agora temos a anomalia dos relatórios de venda da AAP, mais uma vez trabalhando totalmente sem o IP da Amazon, o que sugere que as vendas dos ebooks estão caindo. Estão mesmo? Ou os títulos autopublicados exclusivamente dentro da Amazon estão diminuindo a parte do mercado que conseguimos ver e contar, mascarando assim o crescimento das vendas de ebooks que está acontecendo atualmente? Não tenho nenhuma prova, mas isso me parece mais real do que a ideia de que as vendas de ebooks estão caindo nos últimos anos.

O que isso quer dizer é que estamos desenvolvendo dois negócios editoriais. Um deles inclui todos nós: todas as editoras, todas as livrarias, toda a indústria que conta livros e vendas. O outro, feito pela Amazon, é “privado” ou “proprietário”. Estão publicando um número desconhecido de títulos vendendo um número desconhecido de cópias gerando um número desconhecido de dólares debaixo de um sistema de numeração que mais ninguém pode acompanhar.

Na verdade, a Amazon não está inteiramente sozinha na busca de títulos proprietários. Talvez haja alguns dentro da Nook ou Kobo, mas hospedar títulos proprietários para se estabelecer no mercado é a declarada estratégia da livraria iniciante Zola Books. Na semana passada eles anunciaram títulos exclusivos de Joan Didion e seu marido falecido, John Gregory Dunne. Eles pensam que com títulos deste tipo conseguirão tomar de assalto os rankings de livrarias de ebooks estabelecidas. Acho que seria necessário muito mais para conseguir algum progresso, mas o tempo é que vai dizer. E se não venderem muito do que possuem, será impossível persuadir outros autores a dar um livro com exclusividade nesta base.

Mas a Amazon, sendo mais da metade do mercado em gênero de ficção, pode usar incentivos financeiros indolores (para eles) para induzir os autores a publicar ebooks com exclusividade através do programa KDP Select. Desta forma, conseguem números que mais ninguém consegue contar, mas que poderiam ser grandes o suficiente para na verdade distorcer os números da indústria.

Minha hipótese é que a Amazon pode fazer mais por um livro dentro da Amazon do que uma editora ou um autor conseguem trabalhar com a Amazon de fora, com todas as outras variantes iguais (apesar de que a reviravolta no ambicioso programa de publicação de Larry Kirshbaum poderia criar dúvidas sobre isso). E a editora leva uma boa parte da renda gerada pela Amazon. Isso significa que as editoras precisam construir a diferença na renda para o autor de uma ou duas formas:

Elas precisam fazer um trabalho superior na publicação do livro – edição, posicionamento no mercado, venda de direitos e sustentação de um esforço de marketing que será largamente digital – assim ele vende mais ainda dentro da Amazon do que faria sem estes esforços. Em outras palavras, elas precisam garantir que “todas as outras coisas” não permaneçam iguais.

Eles precisam vender muitos livros fora da Amazon para que a renda do ecossistema das maiores editoras compense a renda gerada pela Amazon que o autor divide com a editora.

Aparentemente, a mudança em curso não está indo mal para as editoras. Não há cálculos claros sobre isso, mas parece que há mais autores passando da autopublicação às editoras (para pegar emprestado um termo que normalmente tem um sentido diferente em nosso negócios: “descoberto” por editoras por causa de seu sucesso na autopublicação) do que o contrário. Então ou eles são capazes de ganhar mais dinheiro ou realmente apreciam todo o pacote de serviços de edição e marketing que uma editora fornece, ou valorizam a exposição mais ampla através da rede de distribuição de uma editora, mais do que talvez a renda maior que poderiam ganhar de menos vendas só com a Amazon ou alguma combinação das três coisas.

Meu ponto é, e o que deveria ser uma preocupação para a indústria, que o desafio da editora continua sendo íngreme. A parte da Amazon está crescendo em relação ao resto do mercado e mais e mais serviços sendo oferecidos para edição e marketing estão facilitando a vida do autores que preferem a opção de publicar sem editora. Há uma pequena, mas crescente população de autores com catálogos longos que recuperam seus direitos, ou asseguraram só os direitos dos ebooks e são capazes de considerar caminhos alternativos ao mercado.

Apesar de não ser a primeira, Jane Friedman viu isso muito cedo – e foi a oportunidade que fez com que as coisas começassem para ela na Open Road Integrated Media, provavelmente a maior editora nova construída durante nossa atual mudança de paradigma. Richard Curtis da E-Reads e Arthur Klebanoff da Rosetta estavam perseguindo uma estratégia similar antes de Friedman começar, mas ela encontrou os fundos e acrescentou a promoção para construir uma empresa maior e de forma mais rápida. (Ainda é uma questão aberta se as empresas que estão se construindo ao oferecerem royalties mais generosos divididos para catálogos já estabelecidos têm um modelo de negócios sustentável.)

Já falamos muitas vezes que a proposição central de sempre das editoras tem disso “colocamos livros nas prateleiras”. Isto está mudando e a nova proposta deve ser “vamos ajudar autores a chegar a toda sua audiência”. Um executivo muito esperto de uma grande editora sugeriu outra formulação que faz sentido: “editoras são as especialistas em construir marcas de autores”.

Qualquer uma delas, como declaração competitiva contra a Amazon, certamente vai refletir uma vantagem potencial para os autores. Mas como a diferença entre a audiência da Amazon e a audiência total vai diminuindo, o desafio das editoras vai ficando mais difícil. E só fazendo um trabalho incrível tanto na publicação de uma forma que venda mais na Amazon e maximizando o mercado fora da Amazon, é que as editoras reterão seu poder para atrair autores nos próximos anos.

A resposta para as editoras, na nossa opinião, é “verticalidade” ou “centrar na audiência”, combinado com habilidades (e ferramentas) escaladas para trabalhar o marketing digital de uma forma que autores sozinhos não conseguiriam e que a Amazon provavelmente não irá desenvolver. Os dois andam juntos: focar em uma audiência permite que uma editora construa capacidades de escala para chegar àquela audiência que outros sem este foco não terão.

Sempre haverá editoras que “entram pelo cano” ou, mais provavelmente, acabam se tornando parte de alguma outra editora em vez de uma entidade separada. Certamente veremos consolidação em vários segmentos da indústria ao mesmo tempo em que veremos muitas novatas atraídas pela diminuição dos custos de publicação de um livro. (Chamamos isso de atomização.) Mas ver que as coisas vão ficar mais complicadas não é o mesmo que achar que o apocalipse está chegando, e reconhecer que há referências que marcariam um aumento real do desafio não é o mesmo que dizer que estamos perto do desastre.

Os tópicos cobertos neste post serão tratados na conferência Digital Book World em 14-15 de janeiro de 2014. (Aqui está o programa completo.) Nossa cobertura sobre a Amazon vai incluir apresentações de Brad Stone, Benedict Evans e Joe Esposito, seguidas por um painel de discussões entre eles. A professora Dana Beth Weinberg combina sua capacidade de análises de dados como socióloga com seus interesse no mercado editorial e conhecimento como escritora de romances para apresentar uma perspectiva única sobre as mudanças na dinâmica entre editoras e autores. E Phil Sexton, o editor da Writer’s Digest, vai apresentar os resultados da pesquisa que sua organização fez com mais de 5.000 escritores freelances, capturando um retrato atual de como os escritores veem a escolha entre trabalhar com uma editora e autopublicar.

Tradução: Marcelo Barbão

[10/12/2013 22:00:00]