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Sem limites
PublishNews, 10/10/2012
Sem limites

Como ficarão os limites de território para edição de livros, com o advento dos e-books, que não têm fronteiras? Esse é o tema de hoje, que segue raciocínio lógico-legal.

As transmissões de direitos autorais, feitas através de licenças ou permissões (temporárias), ou cessões (geralmente definitivas) costumam ter limitação geográfica, por força de lei.

Assim, os contratos de edição geralmente mencionam que determinado livro estrangeiro poderá ser traduzido e publicado em língua portuguesa, no Brasil, pelo tempo estipulado pelas partes: a editora estrangeira titular dos direitos e a editora brasileira que for publicá-lo aqui. Da mesma forma, a tradução e publicação de livro brasileiro no exterior obedecerão ao limite geográfico determinado no contrato.

Esses limites se originam de duas estipulações da lei brasileira de direito autoral (lei 9.610). A primeira, do art. 4º, que diz: “Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre os direitos autorais.”. Ou seja, só vale o que for expressamente acordado, não se interpretando o negócio de forma ampliativa, mas sim limitada ao que se estipulou. A segunda, dos arts. 49 e 50, cujos pontos de destaque são transcritos a seguir:

“Art. 49. Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em Direito, obedecidas as seguintes limitações:


................................................................................................................


IV - a cessão será válida unicamente para o país em que se firmou o contrato, salvo estipulação em contrário;


Art. 50. A cessão total ou parcial dos direitos de autor, que se fará sempre por escrito, presume-se onerosa.


................................................................................................................


§ 2º Constarão do instrumento de cessão como elementos essenciais seu objeto e as condições de exercício do direito quanto a tempo, LUGAR e preço.”


No que diz respeito ao lugar, temos claramente definido que, se não houver expressa estipulação em contrário, a cessão será válida unicamente para o país em que se firmou o contrato. O que se quis dizer, na verdade, é que a cessão será válida unicamente para o país da editora que vai publicar fisicamente o livro traduzido.


Sem querer entrar em polêmica sobre imperfeições legais, lida a lei como está, se um contrato entre uma editora brasileira e uma inglesa, assinado em Londres, prevendo a tradução e publicação de livro inglês para o português, nada falar sobre o local da edição, entende-se que o livro traduzido para o português será publicado... na Inglaterra?!

Pois bem, valerá então a publicação do livro físico, impresso, no lugar que vier a ser definido no contrato, e, se este não for explicitado, sempre haverá uma limitação geográfica, o país. Da mesma forma, a cessão de direitos, regida no art. 50, § 2º, impõe mencionar o lugar onde serão exercitados esses direitos.

Mas, e com os livros digitais, que não se corporificam em papel, que na verdade são licenças de uso, e que ignoram limites geográficos, o que fazer? O livro físico, base da legislação autoral do mundo vai sofrendo a concorrência do livro digital, e os sistemas legislativos ainda não se adaptaram aos novos fatos.

No Brasil esse fenômeno ainda não causa incômodo, pois geralmente a licença para publicação de livros digitais vem embutida ou agregada ao contrato de edição do mesmo livro em suporte físico.

Por ora, então, o fator que queria submeter ao aguçado raciocínio do leitor é a iminente alteração na base do contrato de edição. Ao invés de a editora de livros digitais ficar circunscrita a um território de publicação (“país”, “lugar”, como disseram os arts 49 e 50 da LDA, transcritos acima), o conceito será outro. Com a tecnologia do e-book, certamente surgirá o conceito de pólo irradiador. As editoras poderão publicar o livro digital a partir de certa “base”, que difundirá a obra em língua portuguesa para o Brasil, por exemplo. O limite será o público alvo, e não mais o geográfico. Importar livros digitais? Se o mundo virtual não tem fronteiras, não haverá importação, somente licenças.

Esses fatos são desafios para editoras, autores, legisladores e os advogados, que têm que redigir contratos de imediato (muitos fechamentos essa semana em Frankfurt!), e que certamente se acomodarão em novo perfil de negócio. No entanto, a rapidez imposta pelo mercado faz acelerar os passos de um trajeto que, normalmente, necessita de maturação e tempo. Arrisco dizer que sem fronteiras geográficas, os limites serão ditados pelo consumidor e pela língua em que for traduzido o e-book. Vamos ver!

Gustavo Martins de Almeida é carioca, advogado e professor. Tem mestrado em Direito pela UGF. Atua na área cível e de direito autoral. É também advogado do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL) e conselheiro do MAM-RIO. Em sua coluna, Gustavo Martins de Almeida aborda os reflexos jurídicos das novas formas e hábitos de transmissão de informações e de conhecimento. De forma coloquial, pretende esclarecer o mercado editorial acerca dos direitos que o afetam e expor a repercussão decorrente das sucessivas e relevantes inovações tecnológicas e de comportamento. Seu e-mail é gmapublish@gmail.com.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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