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Para que serve a Bienal?
PublishNews, Pedro Almeida, 13/09/2016
Pedro Almeida: 'a Bienal desse ano se tornou o evento de Literatura mais importante que as festas literárias, pois aproximou de vez leitores e autores como nenhum outro'

Há duas décadas que eu participo – a trabalho, por diversas casas editoriais – de bienais. E, nesse período, ouvi toda sorte de críticas ao formato do evento. Lembro das primeiras que minha memória permite, no final dos anos 1990, em que se dizia que o modelo estava gasto, alguns decretando o fim do evento, etc.

Críticas são excelentes e ajudam o mercado, organizadores e participantes a repensarem o evento. Eu sempre faço as minhas, em aspectos diversos.

Sempre pude observar, por exemplo, como a Bienal do Rio tinha o apoio direto de mídia televisiva e a cidade do Rio de Janeiro adotava o evento como seu, e quem visitava a cidade encontrava nas principais vias algo indicando a realização do evento. Em São Paulo, apenas neste ano houve um acordo com a prefeitura para que a Bienal seja tratada de forma mais amistosa [assunto que o PublishNews noticiou em primeiríssima mão], o que deve ocorrer a partir de 2018. Isso deve torná-la não apenas como um evento comercial da cidade, mas algo de interesse público. Para se equiparar à Bienal carioca falta agora um apoio da mídia.

Esses acordos permitem uma divulgação melhor, trazem mais público e, com uma participação promotora da cidade, um trânsito mais favorável, enfim, facilidades que podem não ser percebidas num primeiro momento, mas oferecem uma ótima experiência geral para os leitores.

Neste ano, não houve a distribuição do vale-livro aos estudantes e a prefeitura reduziu o número de estudantes de escolas públicas no evento. Somente isso já seria suficiente para termos um público menor e menos vendas. Ainda assim, o resultado de público teve queda de apenas 5% em relação ao ano anterior. E parte dessa queda pode ser atribuída à maior crise econômica e de desemprego de que temos notícia.

Vale ressaltar um outro tema. O evento Bienal precisa se sustentar e isso se faz vendendo espaços para quem pode pagar. Sou do tempo em que uma editora nunca conseguia pagar os custos de investimento com o que era vendido na Bienal e ainda assim participava. Essa realidade mudou para muitas editoras, que conseguem até mesmo lucrar com o evento. Também é interessante observar que empresas de saldo surgem como boas pagadoras de espaços. Se não houvessem essas grandes empresas, que compram saldos para revender, milhões de livros iriam para maquinas de aparas e o prejuízo de quem os edita seria maior. Nota-se também que algumas editoras esperadas não estiveram presentes: por estratégia, por decidir investir em outros caminhos e muitos não estiveram pela situação econômica, que afetou estas empresas.

Ah, então está tudo bem? Não, claro que não está. A economia está muito ruim e livro não é artigo de primeira necessidade. Então, não acho realista apontar apenas os problemas, ou mesmo a queda, como se a Bienal pudesse ficar incólume à todas as condições que a cerca. Creio que devem ser muito raros os tipos de negócios que aumentaram ganhos nesse período. Então, com a queda de apenas 5% no público da Bienal, enquanto se poderia esperar uma queda maior, penso que há muito mais gente interessada no evento, e "esse aumento ficaria bem visível num" momento econômico mais favorável. Um exemplo: no segundo sábado houve um registro de recorde de público dentre todos os eventos do Anhembi: mais de 70 mil pessoas num único dia. O que me leva a citar outra melhora na edição deste ano: os corredores ficaram mais largos e a mobilidade acontecia sem grandes problemas.

O preço dos livros também foi um destaque. Houve anos em que a reclamação do público era justamente a falta de descontos. Neste ano, nenhum estande próprio vendeu livros sem descontos. Eu vi gente comparando os preços de livros na Bienal com o de sites e, por estratégia, muitas vezes os sites tinham preço inferior. Mas isso é algo de mercado. Numa mesma loja há preço de internet e o preço de loja de shopping, e as vantagens de cada modalidade.

Mas o que atrai as pessoas ao evento? Mais do que possibilidade de encontrar bons descontos, é servir do palco para encontros entre pessoas que gostam de literatura. E a Câmara Brasileira do Livro (CBL), o Itaú Cultural e o Sesc promoveram inúmeros eventos de literatura literária e comercial. Os que trouxeram mais pessoas foram os eventos com youtubers. Mas, houve sim, inúmeros eventos literários. Uns, muito lotados, outros nem tanto. Os eventos voltados aos jovens e leitores de literatura mais comercial estavam sempre lotados.

E ainda havia outros movimentos muito interessantes acontecendo e que ainda não se deu a devida atenção. Eram os autores que autografavam sem grande divulgação nas mesas de suas próprias casas editoriais. E foram centenas deles. Se tivesse de destacar o que achei mais importante nessa bienal eu diria que foi isso. Esses encontros particulares entre autores, blogueiros e leitores são uma coisa sensacional. São neles que se criam laços entre leitores e as obras, onde os autores bebem de uma fonte ótima, conhecendo para quem escreve e o que seus textos provocam nas pessoas, algo que nenhuma outra feira literária consegue fazer com tanta expressão em quantidade de dias, espaço e autores. Muitas editoras fizeram eventos neste ano para reunir pessoas do mercado, mais do que para fazer negócios. Eu estive em três deles e não me lembro de uma bienal tão amistosa e simpática entre os concorrentes. Um dos destaques foi a Arena criada pela Alto Astral, o espaço privado mais democrático da feira.

E merece destaque o que ocorreu na sexta-feira à noite, no primeiro dia: um evento novo no Brasil, onde os editores e livreiros, como eu, pudemos ter um encontro informal com as pessoas do mercado, tal como ocorre em Frankfurt após as reuniões no horário comercial. Isso também foi um marco desta Bienal, algo que foi promovido pelo PublishNews em comemoração aos seus 15 anos e que obteve o apoio da HarperCollins Brasil. Era algo que faltava por aqui e espero nunca mais deixe de acontecer.

Sei que há muita coisa que pode ser melhorada, mas sempre penso no que eu mesmo reclamo nas críticas literárias que se fazem dos livros, seja continuamente por cadernos literários ou até por alguns blogs, que herdaram o mesmo vício. Muitas vezes, as pessoas criticam uma coisa com um caráter opinativo como se ela quisesse que sua vontade prevalecesse. Nestes casos me parece que é o crítico que gostaria de ser autor ou alguém com caráter decisório. Um autor escreve 100 mil palavras de uma história forte, boa, comovente, bem estruturada e o crítico a destrói com base num aspecto muito pessoal sobre como pensa que deveria ser ou terminar e, muitas vezes, nem se dá ao trabalho de perguntar o porquê daquela escolha.

Muitas vezes, criticamos apenas porque discordamos de algo da história, ou da forma como o evento foi feito desprezando que um livro não é apenas aquele 5% de crítica ou um evento como uma Bienal havia milhares de aspectos a considerar e uma decisão as vezes resolve um lado e traz problemas para outro. Lembram da crítica que se fazia à falta de descontos ou ao tamanho dos corredores? Nesta edição ela foi resolvida.

Pensando nisso tudo, vi vantagens. A Bienal desse ano se tornou o evento de literatura mais importante que as festas literárias, pois aproximou de vez leitores e autores como nenhum outro.

E você, o que achou? Comente.

Pedro Almeida é jornalista profissional e professor de literatura, com curso de extensão em Marketing pela Universidade de Berkeley. Autor de diversos livros, dentre eles alguns ligados aos animais, uma de suas paixões. Atua no mercado editorial há 26 anos. Foi publisher em editoras como Ediouro, Novo Conceito, LeYa e Saraiva. E como editor associado para Arx; Caramelo e Planeta. É professor de MBA Publishing desde 2014 e foi presidente do Conselho Curador do Prêmio Jabuti entre os anos 2019 e 2020. Em 2013 iniciou uma nova etapa de sua carreira, lançando a própria editora: Faro Editorial.

Sua coluna traz exemplos recolhidos do cinema, de séries de TV que ajudam a entender como funciona o mercado editorial na prática. Como é o trabalho de um ghost writer? O que está em jogo na hora de contratar um original? Como transformar um autor em um best-seller? Muitas dessas questões tão corriqueiras para um editor são o pano de fundo de alguns filmes que já passaram pelas nossas vidas. Quem quer trabalhar no mercado editorial encontrará nesses filmes algumas lições importantes. Quem já trabalha terá com quem “dividir o isolamento”, um dos estigmas dos editores de livros. Pedro Almeida coleciona alguns exemplos e vai comentá-los uma vez por mês.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews

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