Missão: fortalecer a cooperação latino-americana-árabe na indústria editorial
PublishNews, Bodour Al Qasimi*, 16/08/2016
Em artigo, Bodour Al Qasimi, chefe da delegação de editores dos emirados árabes na Bienal de SP, fala sobre as oportunidades de negócios entre o Mundo Árabe e a América Latina

Na última década, a América Latina experimentou significantes transformações econômicas e sociais. Analfabetismo e pobreza – que antes negavam a muitos na região o prazer da leitura e fizeram com que os livros fossem considerados produtos de luxo – diminuíram drasticamente. Da mesma forma, muitos dos países no Mundo Árabe experimentaram um aumento nos padrões de vida na última década que tirou milhões da pobreza, aumentaram as fileiras da classe média, e produziram uma nova geração de futuros leitores.

Nestas economias em rápido desenvolvimento e modernização, o aumento do alfabetismo e o investimento do governo em educação, saúde e infraestrutura premiam o capital humano de alto nível. As editoras, que são intermediárias vitais do conhecimento na América Latina e o mundo árabe, têm um papel central a jogar nessas transformações socioeconômicas. Nas duas regiões, as estatísticas da ONU mostram que a juventude entre 15 e 24 anos representa cerca de 20% da população. Esse segmento da população está em crescimento e digitalmente conectado, com alto nivel de alfabetização e quer acesso a conteúdo mais diversificado. Embora alguns dos países nas regiões árabe e latino-americana passaram recentemente por uma desaceleração, as tendências de crescimento demográfico e a longo prazo ainda apresentam impressionantes oportunidades de mercado para editoras internacionais.

À luz dessas tendências, não é surpresa que países da América Latina e do Mundo Árabe sejam os mercados destacados na Global Publishing Summit que acontece em paralelo à Feira do Livro de Frankfurt em outubro. Tanto o Brasil quanto os Emirados Árabes Unidos continuam sendo mercados editoriais dinâmicos e crescentes que apresentam oportunidades de crescimento significativos para editoras internacionais assim como para o aumento do mercado inter-regional com mercados editoriais emergentes.

Comércio editorial emergente entre América Latina e mundo Árabe

Baseando-se nas estatísticas comerciais mais recentes das Nações Unidas, o relacionamento editorial entre países latino-americanos e o Mundo Árabe vale aproximadamente US$ 1 milhão anuais, com 94% do relacionamento comercial representando exportações de livros do Mundo Árabe para a América Latina. Dos US$ 861.650 de exportações de livros anuais para a América Latina do Mundo Árabe, os Emirados Árabes Unidos representam 83%. Os países latino-americanos exportam meros US$ 59.314 aos países árabes, com 80% das exportações totais entrando nos Emirados Árabes Unidos, Kuwait, Argélia, Líbano e Jordânia.

Apesar do aumento da demanda global para ficção traduzida e a grande diáspora árabe na América Latina, o comércio de livros traduzidos entre as regiões continua pequena. De acordo com o Index Translationum da Unesco, 97 livros árabes foram traduzidos para o português, enquanto mais de mil livros árabes foram traduzidos ao espanhol. Este idioma está entre as cinco línguas com mais livros árabes traduzidos. No entanto, só 373 livros espanhóis e 36 livros portugueses foram traduzidos para o árabe. Estas estatísticas revelam uma oportunidade perdida para aumentar o comércio em títulos traduzidos entre as regiões árabes e latino-americana.

Oportunidades para editoras árabes na América Latina

A América Latina tem a maior população de árabes e descendentes fora do Mundo Árabe. Apesar de não existirem estatísticas precisas, estima-se o tamanho da diáspora árabe na América Latina entre 17 e 30 milhões de pessoas. Estimativas mostram que, só no Brasil, há mais pessoas descendentes de libaneses do que no próprio Líbano.

Quando comparada a outras regiões, a diáspora árabe na América do Sul é mais integrada social e politicamente. No entanto, apesar da forma como as sociedades latino-americanas integraram a diáspora árabe, ainda há uma afinidade cultural com suas terras natais. Por exemplo, livros de receitas publicados no Mundo Árabe são muito populares na América Latina. Por causa do grande interesse na literatura traduzida que está sendo observado em muitos países globalmente, é provável que haja uma oportunidade significativa para que as editoras árabes aumentem o volume de títulos traduzidos que atualmente chegam aos mercados latino-americanos. Esse potencial para aumento é refletido no crescimento das exportações dos Emirados Árabes Unidos para a América Latina que teve um aumento de 186% de 2009 até o último ano, que são as estatísticas que existem.

Oportunidades para editoras latino-americanas no Mundo Árabe

Um artigo da Publishing Perspectives de 2013 descreve o sucesso que as editoras latino-americanas tiveram ao entrar no mercado do Reino Unido com títulos traduzidos ao inglês. Infelizmente, as editoras latino-americanas não tiveram tanto sucesso no acesso às oportunidades de mercado no Mundo Árabe. Uma política similar (a de utilizar traduções para chegar a leitores de língua inglesa nos países do Conselho de Cooperação do Golfo) poderia já ser eficiente, mas uma entrada potencialmente mais bem-sucedida poderia colocar o foco em títulos traduzidos para o idioma árabe. Isso serviria para satisfazer a demanda por maior diversidade de gênero que não existe nas editoras árabes.

Vários estudos no Mundo Árabe mostraram que o foco tradicional das editoras árabes em gêneros como religião, cultura e história não consegue satisfazer os gostos dos consumidores, que estão mudando, e a preferência por uma cobertura mais diversificada. Como uma das regiões mais digitalmente conectadas do mundo, a população jovem, fã de tecnologia e com acesso digital da região árabe também apresenta uma oportunidade significativa para editoras latino-americanas investirem na demanda de conteúdo digital como e-books, apps, vídeos, áudios, infotainment, jogos e e-learning.

Mais participação pode alinhar interesses e fortalecer a cooperação

A Associação de Editoras dos Emirados vai trazer uma delegação de editores para a Bienal Internacional do Livro em São Paulo (26/08 a 04/09) a fim de fortalecer o relacionamento comercial entre a América Latina e o Mundo Árabe em agosto. A delegação, que vai incluir várias das maiores editoras dos Emirados Árabes Unidos e do Mundo Árabe, vai explorar oportunidades para aumentar a venda de direitos e trabalhar para desenvolver conjuntamente programas potenciais para expandir o comércio inter-regional com editoras latino-americanas, associações editoriais nacionais e outros investidores.

A viagem da delegação comercial da Associação de Editoras dos Emirados a São Paulo é parte de uma estratégia de desenvolvimento comercial maior para fornecer às editoras latino-americanas o apoio que facilite a entrada do mercado no Mundo Árabe e aumente a venda de direitos e as exportações das editoras da região na América Latina. A estratégia também envolve mais participação significativa das editoras dos Emirados e do Mundo Árabe em importantes feiras de livros latino-americanas, como as Feiras do Livro de Buenos Aires e Guadalajara. Para medir o sucesso de seus esforços de desenvolvimento comercial, a Associação de Editoras dos Emirados vai utilizar a avaliação como uma ferramenta de aprendizado colaborativo assim poderá melhorar, ajustar e aumentar o impacto de seus esforços de desenvolvimento comercial. O objetivo é compartilhar informações de seus sucessos, assim como fracassos, com publicações como PublishNews em futuros artigos assim a indústria pode aprender de forma coletiva e colaborativa a resolver questões do mercado e da indústria que impedem o aumento da cooperação comercial inter-regional.


* Bodour Al Qasimi é fundadora e CEO da editora Kalimat, nos Emirados Árabes Unidos. Ela também é fundadora e patrocinadora da Associação de Editores dos Emirados, e é ela quem chefia a delegação desta entidade na Bienal Internacional do Livro de São Paulo neste mês de agosto.

[16/08/2016 10:28:55]