O telefone volta a tocar na agência literária fictícia criada por Marisa Moura. Dessa vez, quem liga é um autor que anda se escondendo da agente literária porque já está há três anos atrasado com o livro que já deveria ter entregue, mas está pronto só na cabeça dele. Mesmo fugindo da agente, ele liga na agência porque quer falar com a misteriosa funcionária que dá dicas e conselhos. Ele tem as desculpas para o atraso na ponta da língua.
— Agência Literária.
— Que saudades de você, quanto tempo não falo com você.
— É mesmo, você sumiu. Como está? Escrevendo muito?
— Nem me fale. Acredita que já liguei 10 vezes ai, só para encontrar você. Quando a agente atende, desligo. Fingindo que caiu a linha. Tem detector de chamadas no telefone da agência?
— Que saiba, não. Mas por que tudo isso?
— Nem te conto. Prometi um livro para a agente. Já se passaram três anos e o livro continua pronto só na minha cabeça.
— Que vergonha!
— Nem te conto.
— Duvido que não vai contar. Pode começar.
— O primeiro ano, me separei, foi um drama mexicano. Um horror. Fui morar em pensão porque minha mulher juntou minhas coisas em sacos de lixos e trocou as fechaduras da casa. Só sobrou o carro para mim.
— Que confusão. Mas tem mais dois anos...
— Então, o segundo ano, joguei a toalha e me mudei para a casa da minha mãe. Foi só uma semana de sossego. Logo, em seguida, ela começou com dores aqui, ali, na coluna, cabeça, rins e foi indo. Acabei tendo de internar e dormir no hospital com ela. Durante o dia ficava exausto de tanto que ela roncava a noite. Decidi passar a noite acordado lendo e dormir o dia inteiro. Estou mais branco que sulfite. Nem me reconhece como brasileiro.
— Sei e agora o terceiro ano.
— O terceiro ano, é esse. Explicando, o final do terceiro ano é esse. Passei esse ano todo com problemas no meu notebook. E conserta daqui e vai naquele cara que recupera todos os arquivos do hard disk. Conclusão perdi as 10 páginas do que tinha escrito.
— Sei. A agente está abrindo a porta, passo o telefone para ela?
— Tun-tun-tun.