Em evento sobre a experiência de livrarias francesas, o mercado brasileiro expõe sua guerra pelo preço e propõe um pacto
PublishNews, Leonardo Neto, 04/05/2016
Seminário 'A experiência francesa sobre a gestão de livrarias' aconteceu na última terça-feira, em SP

Aconteceu na última terça-feira (03), em São Paulo, o seminário A experiência francesa sobre a gestão de livrarias, realizado pelo Institut Fançais no Brasil e pelo Bureau International de l´Edition Française (Bief), com apoio da Livraria Martins Fontes, Liga Brasileira de Editores (Libre), Associação Nacional de Livrarias (ANL), Livraria da Travessa, Brazilian Publishers, Câmara Brasileira do Livro (CBL) e Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL).

O evento, como o próprio nome propunha, era para que editores e livreiros brasileiros pudessem conhecer um pouco melhor da realidade francesa, que vive desde 1981 sob o regime da Lei Lang, que regulamenta o varejo do livro no país e serviu de inspiração para a Lei do Preço Fixo brasileira que tramita no Senado Federal. No entanto, mais do que discutir sobre a realidade francesa, o evento serviu para que se debatesse a atual guerra de preços acirrada (ou tornada pública) desde o fim do mês passado, quando a Saraiva, a maior varejista de livros no Brasil, anunciou informalmente a sua nova estratégia comercial, considerada por muitos editores agressiva.

Não foi por falta de aviso. No fim do ano passado, em um evento com acionistas e investidores, a Saraiva anunciou que apertaria o cerco com os seus fornecedores. “Temos que ser parceiros, mas temos que ser mais duros”, disse na ocasião Jorge Saraiva Neto, diretor-presidente da casa. Para justificar o aperto, Jorge evocou dados da GfK que davam conta de marketshare de 25%, o que, na sua avaliação, permitiria a “agressividade”.

Philippe Touron, Jean-Guy Boin, Bernardo Gurbanov e Mariana Zahar participaram do seminário 'A experiência francesa sobre a gestão de livrarias' | © Luiz Alvaro Salles Aguiar Menezes
Philippe Touron, Jean-Guy Boin, Bernardo Gurbanov e Mariana Zahar participaram do seminário 'A experiência francesa sobre a gestão de livrarias' | © Luiz Alvaro Salles Aguiar Menezes

“Vivemos uma situação dramática e a aprovação da lei é algo remoto. Temos que tomar consciência da urgência desse problema”, disse Marcos Pereira, presidente do SNEL em sua breve intervenção. “Temos um problema no varejo e precisamos mudar o pacto entre os players para alcançar a saúde na cadeia. É importante termos uma cadeia de livreiros saudável para ter uma cadeia de editores saudável”, completou.

“Estamos vivendo uma guerra de preço, uma competição selvagem que muito se distancia de uma livre concorrência. O que temos é uma concorrência predatória”, argumentou Bernardo Gurbanov, presidente da ANL. “Na França, a Lei Lang é como acupuntura. Quando toca um ponto, reflete em todo o corpo”, definiu Rui Campos, da Livraria da Travessa e colunista do PublishNews.

No Brasil, o Projeto de Lei (PL) 49/2015, de autoria da senadora Fátima Bezerra (PT/RN) está estacionado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) desde fevereiro do ano passado. “Essas últimas semanas foram muito intensas em Brasília. Passada a turbulência, é urgente que a gente recomece a luta”, observou Marcos Pereira.

Se fatores alheios ao PL 49/2015 tem impedido o seu encaminhamento dentro do Parlamento brasileiro, novas turbulências são esperadas caso ele ande. “As pessoas que são contrárias a esse tipo de lei são muito sonoras”, observou Marcos Pereira. “A tese de que a lei inflaciona o preço do livro provou ser apenas uma ideologia na França”, argumentou Jean-Guy Boin, presidente do Bief. Por meio de dados, Boin demonstrou que o preço médio do livro não aumentou desde a implantação da Lei Lang. “O que vimos foi uma estabilização da concorrência pelo preço e o incentivo à concorrência por serviços. Uma vez que o preço está estabelecido de forma única, o público prefere ir a uma livraria que ofereça maior gama de produtos”, completou o presidente do Bief.

Boin lembrou ainda que, na França, foram realizadas campanhas para conscientização da importância da lei. A campanha foi encabeçada pelo Ministério da Cultura, com inserções na TV inclusive, e depois carreada por editores, autores e personalidades culturais do país. Philippe Touron, diretor da Livraria Gallimard, presente no evento, lembrou que o público foi conquistado com campanhas bem-humoradas e com o engajamento de pessoas que nem eram do mundo do livro. “Até hoje é possível encontrar cartazes muito divertidos que foram feitos em defesa da lei”, relembra. “Acho importante que haja militantes que não são necessariamente do mundo do livro nesse momento”, completou. “Se vocês quiserem que o mundo seja perene e próspero, tomem as rédeas dessa discussão”, aconselhou Touron.

[04/05/2016 11:31:39]