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Qual é a rua com mais livrarias em São Paulo?
PublishNews, Roney Cytrynowicz, 13/04/2016
Em sua coluna dessa semana, Roney faz um passeio pela rua Conde de Sarzedas, na região central de SP e revela que ela é muito mais do que a ‘rua da fé’

Qual é a rua que tem mais livrarias na cidade de São Paulo? Aliás, a cidade tem alguma “rua das livrarias”? A resposta passaria, certamente, por menções à Avenida Paulista e seria razoável lembrar ruas e avenidas comerciais importantes, tais como Avenida Angélica, Avenida São João, Avenida Ipiranga, Rua 15 de Novembro, Avenida Faria Lima, Avenida Ibirapuera, Rua Teodoro Sampaio, Rua Augusta, Rua Oscar Freire, Avenida Berrini, Rua da Mooca... Quantas livrarias têm estas ruas?

A rua que, de longe, tem mais livrarias em São Paulo é a Rua Conde de Sarzedas! No bairro da Liberdade, bem próxima à Praça da Sé, é conhecida como “rua da fé” ou “rua da Bíblia”, especializada em livrarias, lojas de música, de ternos, de objetos e utensílios para a casa e para equipar um templo. No início do trecho mais comercial da rua, duas lojas de música apresentam cantores ao vivo na calçada (ao menos aos sábados), criando um clima emocional de fé algo impactante.

Tive dificuldade em estabelecer o número exato de livrarias. Contei pelo menos 16, concentradas em cerca de 200 metros em uma rua que tem 500 metros de extensão. Nestas livrarias os clientes são gentilmente chamados de “irmão” ou “irmã”. As que contei, uma quase ao lado da outra, são: Genebra, Abba, Alfa Ômega, Letra do Céu, Crescendo na Fé, Bvbooks, Outlet dos Livros, Reitor, Maná, O Rei das Pastas, Lírio dos Vales, Central Gospel, Vida, El Shadai, Shekiná de Deus e Evangélica.

Algumas não são exclusivamente livrarias, mas só inclui as que claramente têm uma vitrine de livros bem na entrada e estantes e pilhas de livros que caracterizem uma livraria. Além destas, há muitos boxes só de livros em galerias e pequenos shoppings e muitas lojas que vendem também livros. Uma das livrarias tem o slogan: “Para cada peixe / a isca certa!”.

Assim, não é apenas a rua com mais livrarias em São Paulo, mas a única que se pode definir como uma “rua de livrarias”. Os nomes estritos revelam que se trata de livrarias que vendem bíblias, livros religiosos, livros de oração e um vasto mercado de autoajuda que impressiona pela diversidade e qualidade gráfica, sempre sob um prisma evangélico. São centenas de diferentes edições da Bíblia com capas e estojos os mais variados.

A Conde de Sarzedas é destas ruas paulistanas que testemunham capítulos importantes e remotos da história de São Paulo, além de exibir de forma aguda os contrastes atuais da cidade. Ela tem início na Rua Conselheiro Furtado, o limite da parte turística da Liberdade, e termina pouco antes na Rua do Glicério, onde fica a Igreja Nossa Senhora da Paz, que acolhe imigrantes, e a Missão Paz, que está abrigando imigrantes haitianos, obra dos Missionários de São Carlos - Scalabrinianos.

Entre o final da Conde de Sarzedas e a Rua do Glicério situam-se uma pequena vila de nome Vila Suíça, no final da Rua dos Estudantes, e a EMEF Duque de Caxias. São sempre reveladores os nomes dos lugares da cidade, especialmente onde eles permanecem, como esta escola Duque de Caxias, lembrando os compromissos da República com a educação, já que alfabetizar era considerado condição para que as pessoas pudessem se tornar cidadãs. A escola pública é um pilar da República, como lembraram e ensinaram recentemente os estudantes secundaristas que ocuparam as escolas em defesa da educação pública.

A rua está também associada a uma memória dramática da imigração japonesa. Em 1942 e 1943, os moradores das ruas Conde de Sarzedas, Estudantes e arredores tiveram que deixar à força o local durante a Segunda Guerra Mundial, após o rompimento de relações diplomáticas do Brasil com Japão, Alemanha e Itália, após o ataque do Japão à base naval norte-americana de Pearl Harbor e o alinhamento do Brasil aos Aliados. Em 23 de maio de 1943, a polícia confiscou livros e revistas na livraria japonesa Endo, depois também nas livrarias Oriente, Toyoyoshi e Nambei. Os imigrantes e seus descendentes foram vítimas de uma política que os tratou como inimigos e reprimiu qualquer manifestação cultural nipo-brasileira.

Se alguém for conhecer a rua, recomendo vivamente visitar as vitrines da Alfaiaria Magnata, no número 403. A rua sedia ainda a Escola de Samba Batuq do Glicério, o Palacete de Conde de Sarzedas, atual museu do Tribunal de Justiça, e o edifício Nove de Julho (estilo Avenida Berrini), contrastando com os sobradinhos do final da rua, que lembram a São Paulo anterior aos vários processos e períodos de “modernização”.

As livrarias da Rua Conde de Sarzedas têm um foco de interesse e de mercado preciso e específico, como poderia ser uma rua de livrarias especializadas em medicina ou em direito. Mas não deixa de ser impressionante o poder, no caso da Bíblia, da palavra impressa, quando a palavra parece ganhar de fato sentido pessoal e permanência coletiva.

Roney Cytrynowicz é historiador e escritor, autor de A duna do tesouro (Companhia das Letrinhas), Quando vovó perdeu a memória (Edições SM) e Guerra sem guerra: a mobilização e o cotidiano em São Paulo durante a Segunda Guerra Mundial (Edusp). É diretor da Editora Narrativa Um - Projetos e Pesquisas de História e editor de uma coleção de guias de passeios a pé pela cidade de São Paulo, entre eles Dez roteiros históricos a pé em São Paulo e Dez roteiros a pé com crianças pela história de São Paulo.

Sua coluna conta histórias em torno de livros, leituras, bibliotecas, editoras, gráficas e livrarias e narra episódios sobre como autores e leitores se relacionam com o mundo dos livros.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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