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Se os preços das Amazon de e-books é o problema, o modelo de agência é realmente a solução certa?
PublishNews, Mike Shatzkin, 15/03/2016

Recentemente, conversei com os principais executivos de dois dos concorrentes da Amazon no mercado de e-books. Eles tinham posições muito diferentes sobre se o modelo de agência de preços, que agora é usado pelas cinco maiores editoras comerciais, ajuda a manter o equilíbrio competitivo no mercado de e-book ou o impede.

O modelo de agência de preços foi promulgado pela Apple para a abertura da iBookstore em 2010. O que significa é que as editoras iriam definir um preço que era “forçado” em toda a rede de varejo. A Apple gostou disso porque significava tanto que eles não tinham de competir no preço com a Amazon e também que não tinham que pensar em preços de centenas de milhares de itens diariamente. (E se ajustava ao modelo que a Apple usava para vender outras mídias.) As editoras gostaram porque temiam a erosão das vendas dos impressos que os e-books baratos poderiam causar e porque parecia que os preços nivelados poderiam reduzir o que era então o estrangulamento da Amazon no mercado de e-book.

Como sabemos, o Departamento de Justiça (DoJ) intercedeu porque via os acordos da Apple com as editoras como conspirativos. O DoJ se preocupa mais com o preço. Na visão deles, desconto é uma boa coisa a não ser que seja “predatório”. Se as empresas se reúnem para evitar preços baixos, isso é claramente ruim. Portanto, a curto prazo, o remédio era permitir que os varejistas dessem descontos sobre os preços de “agência”. Isso imediatamente impediu o declínio da participação no mercado de e-books da Amazon, que voltou a crescer depois da volta dos descontos.

Agora, as grandes editoras substituíram os contratos de agência originais por novos, que parecem satisfatórios ao tribunal. Isso porque ficou claro que foram negociados separadamente. E os novos parecem permitir, pelo menos alguns deles, mais flexibilidade para definir e impor preços mais elevados do que os números nos acordos originais da Apple. E tudo isto levou a um mercado reconfigurado.

A boa notícia para as editoras é que a erosão das vendas dos impressos – pelo menos por enquanto – parece ter sido interrompida. (As vendas dos impressos começaram a crescer, mesmo antes do contrato tipo “nova agência”. Quando os preços mais elevados chegarem ao mercado de e-books, os impressos serão imediatamente ajudados). Várias estatísticas da indústria e das vendas parecem convincentes sobre esse ponto. O percentual da receita proveniente de e-books nas grandes editoras diminuiu e as vendas de impressos subiu. E há ainda algumas evidências sugerindo que o espaço de prateleira nas livrarias está aumentando novamente. Mesmo se isso for verdade, é uma questão em aberto saber se é sustentável, ou se é uma resposta temporária e atrasada do mercado para o fechamento de 400 lojas da Borders, que ocorreu em 2011. As livrarias também podem ser ajudadas pela diminuição do espaço para livros em grandes estabelecimentos comerciais, um local onde os impressos continuam a perder terreno.

Mas há também uma boa notícia para a Amazon em como tudo isso terminou. Sua participação de mercado de e-books está aumentando. Suas margens do lado do e-book devem ter subido ainda mais, já que eles estão sendo “forçados” a manter a margem que ganham sobre as vendas dos e-books das “Big Five”. (Não seria irônico se os cálculos internos da Amazon terminem mostrando que eles podem aguentar mais perdas em seu programa de assinatura Kindle Unlimited por causa da margem que estão ganhando sobre as vendas título únicos das Cinco Grandes? Só podemos imaginar...) E, certamente, a Amazon se beneficia do aumento das vendas dos impressos.

Na verdade, eles poderiam ser parcialmente responsáveis por isso. Todas as pesquisas na Amazon por livros das “Big Five” mostram e-books com preços de agência e livros impressos com fortes descontos, muitas vezes mais barato do que o e-book. Quanto do aumento das vendas de livros impressos é a reação dos consumidores a serem apresentados a essa escolha?

(Vamos lembrar quanto é um “melhor negócio” para o consumidor comprar impressos, se os preços forem os mesmos ou próximos. O livro impresso pode decorar uma estante. Pode ser revendido, algo que o e-book não pode, ou pelo menos ainda não pode).

Só a Barnes & Noble pode tentar competir significativamente com a Amazon neste ambiente. O consumidor de livros sensível ao preço precisa ver o e-book e o livro impresso para fazer uma sábia decisão de compra. Eles não vão ver isso na Kobo, Google ou iBookstore da Apple.

Então, competir com a Amazon em preço se limita à B&N em impressos e se limita a títulos não-agência – o que significa apenas uma pequena parte da lista dos mais vendidos – para todo o resto. Então, está todo mundo feliz? As editoras estão vendendo mais impressos, o que elas queriam. Há crescimento na base de livrarias independentes, algo que as editoras também queriam. Mas a Amazon continua a aumentar sua participação de mercado em relação à Barnes & Noble e agora ameaça abrir livrarias para competir com a B&N e as independentes. E isso definitivamente não é o que as editoras queriam.

Existe alguma maneira de alcançar uma concorrência robusta contra a Amazon e também proteger os livros impressos para que não sejam canibalizados por e-books muito mais barato?

As conversas que tive com dois dos concorrentes da Amazon mostraram opiniões diametralmente opostas sobre se agência era útil ou não a esse respeito.

Um executivo de e-book sugeriu que as “Big Five” devem manter a margem de preços de agência, mas nos termos dos preços de distribuidora. Essa pessoa me incentivou a pensar nessa proposta: o que aconteceria se os e-books fossem vendidos para os canais a 70% do preço da editora (ou até um pouco mais), mas sem quaisquer restrições sobre o desconto?

A outra pessoa acredita que competir no preço com a Amazon é um jogo impossível de vencer e que há provas claras a partir da experiência no mercado do Reino Unido, onde vários atores do e-book tentaram minar a Amazon no preço, que não é uma estratégia eficaz.

O defensor do modelo de distribuidora, que permitiria o desconto por varejistas até onde as autoridades decidirem que é “predatória” (e essa definição não é nada clara), acredita que a Amazon está com o caminho livre. Dos seus concorrentes, parece que só a Google e a Apple teriam fundos suficientes para combater a Amazon, sacrificando a margem, mas qualquer uma delas certamente poderia e seria, no mínimo, um grande incômodo para a Amazon se fizessem isso.

Isso levanta novamente a questão de que desconto seria permitido antes de ser rotulado como “predatório”. Não há uma resposta definitiva. Alguns acreditam que as livrarias não estão autorizadas a dar descontos abaixo de seu próprio custo (embora, mesmo assim, não está claro se isso significa que em uma base por título ou em todas as suas compras de e-books e vendas ou alguma outra base). Por essa interpretação, se um e-book fosse listado a $ 15,99 e vendido a um preço de distribuidora de $ 11,19 (70%), pode haver um risco legal de que o preço abaixo desse ponto poderia ser considerado “predatório”. Na verdade, a flexibilidade nos preços dos e-books é tal que as editoras poderiam vender esse mesmo e-book a $ 18,99 no primeiro mês ($ 13,29 no modo distribuidora), quando o impresso estiver lutando pelo status de best-seller.

(Deve-se notar aqui que a Amazon vendeu e-books Kindle bem abaixo do custo nos dias antes de terem concorrência, como uma cenoura para atrair clientes para comprar o e-readers Kindle, que custava originalmente US$ 400. Com isso, eles fizeram a equação de reader-conteúdo atraente para as pessoas que compraram a maioria dos livros. O DoJ e o juiz Cote disseram que os preços da Amazon naquele momento não eram predatórios, mas a Suprema Corte poderia, pelo menos teoricamente, alterar esse entendimento. E, na verdade, a Amazon continua a se comportar como se o preço de $ 9,99 fosse o teto “correto” para e-books, mesmo que a equação conteúdo-aparelho tenha mudado com os preços de dispositivos Kindle consideravelmente mais baixos e uma infinidade de dispositivos multifuncionais tendo mudado o mercado.)

Se as “Big Five” decidirem pelo modelo de distribuidora, poderiam mudar o mercado de e-book de duas maneiras. Uma delas é que permitiria que Google e Apple – sendo que as duas têm muito dinheiro – para dar descontos de forma agressiva para competir com a Amazon. No mínimo, isso diminuiria a margem da Amazon enquanto competem em preços e também poderia reduzir suas vendas unitárias. Poderia ainda fazer com que as editoras menores, agora vendendo por distribuidora, tentassem reduzir seus descontos. E isso poderia levar a Amazon a usar seu poder de mercado para resistir a uma redução da margem, o que poderia ser interpretado como um abuso de poder de mercado, que é outro teste para a luta antimonopólio.

Um defensor antimonopólio me explicou desta maneira. A análise é mais sutil do que apenas olhar se os preços são reduzidos. Em geral, a aplicação da lei de defesa da concorrência não olha favoravelmente para práticas que resultam em preços mais baixos.

Dito isto, o objetivo do antimonopólio é mais amplo: é proteger o processo competitivo. Pode ser complicado nos mercados de dois lados ou de vários lados nos quais os preços podem ser baixos de um lado do mercado, mas a plataforma usa seu poder do outro lado do mercado para prejudicar a concorrência. No caso de Amazon, um lado do mercado está virado para o consumidor e o outro, virado para o editor.

É particularmente problemático se a conduta impede participantes, levanta barreiras à entrada ou faz com que a plataforma consiga ganhar mais do que sua parte justa do outro lado do mercado.

Por essa medida, talvez o aspecto mais problemático dos termos comerciais da Amazon poderia ser a exigência de exclusividade para fazer parte do programa de assinatura Kindle Unlimited. Isso mantém títulos longe dos concorrentes.

Mas passar ao modelo distribuidora não é visto como uma solução por todos os concorrentes da Amazon. Um deles acha que ter o modelo de agência no mercado é um grande benefício para a concorrência. Esse executivo viu o mercado do Reino Unido como um “ensaio”, porque ao longo dos últimos três anos, uma série de empresas tentaram desconto profundos para ganhar participação no mercado. Isso foi tentado antes do modelo de agência e durante o período “agência light” pós-DoJ. Do ponto de vista deste executivo, os resultados desses esforços fazem o desconto parecer uma estratégia competitiva bastante inútil.

Ao contrário do defensor do modelo de distribuidora que acha que as editoras usando o modelo de agência estavam ajudando a Amazon, impedindo a concorrência de preços dos outros atores endinheirados, este executivo apresentou uma análise completamente diferente. Para ele, a participação de mercado vem de duas fontes.

Acesso a fontes de aquisição de clientes com bom custo. A Amazon e a B&N têm suas próprias bases de clientes existentes. A Kobo possui parceiros comerciais. Apple e Google têm aplicativos pré-carregados e clientes registados no iTunes e Android. Então todo mundo tem um grupo de clientes para se basear. (Analisamos que isso era uma vantagem que a Scribd tinha sobre a Oyster quando as duas empresas começaram a vender assinaturas de e-books).

Então o truque é manter os clientes e capitalizar sobre o valor existente.

O que este executivo acredita é que o corte de preços como uma forma de recrutar clientes é uma besteira. Os clientes que são conquistados por um negócio barato vão abandonar assim que outra pessoa apresentar um negócio ainda mais barato. Eles não são conquistados. Por outro lado, oferecer vantagens de preços com base na lealdade do cliente é uma aposta melhor. Ele acha que ter o modelo de agência no mercado faz com que seja mais fácil agarrar clientes uma vez que uma plataforma conseguiu conquistá-los. Como prova disso, essa pessoa apontou para a perda de participação de mercado do Nook que ocorreu quando o DoJ restaurou os descontos no modelo de agência.

Pareceu desde o início que dar descontos no e-book espelhando o impresso era um grande erro estratégico das editoras. Os dois produtos não são comparáveis do ponto de vista da economia das livrarias. Elas não precisam comprar e-books antecipadamente. Não existe nenhuma “falta”; eles não são perdidos ou roubados. Não precisam ser manuseados. Não é preciso pagar aluguel no espaço que ocupam antes de serem vendidos. Com uma realidade comercial tão diferente, descontos agressivos pelas livrarias deveriam ter sido um resultado previsto quando foi dada mais margem do que precisavam para operar.

Assim, a divisão do dinheiro do cliente instituído pelo modelo de agência é mais adequada às realidades do e-book e, provavelmente, leva as coisas de volta para onde deveriam ter começado.

A questão de modelo distribuidora contra agência é mais complicada. Mas certamente parece que seria o momento ideal para que uma das Cinco Grandes editoras abandonasse as fileiras, como a Random House fez quando o modelo de agência foi originalmente criado, no seu próprio interesse egoísta. Eles conseguiriam o que a Random House fez na época (antes da fusão com a Penguin): conseguir o mesmo ou um preço mais elevado por parte das livrarias e ver como vendiam ao público a um preço inferior. (É claro que ninguém vai fazer isso tão cedo. A atual rodada de contratos de agência que entraram em vigor nos últimos dois anos ainda têm alguns anos para expirar.)

O mesmo executivo que analisou o mercado para mim, fez outra observação que realmente importa. Menos da metade do público leitor fez a mudança de leitura de impressos para leitura digital. Há muito mais futuros convertidos esperando. Ainda há muito crescimento no e-book para as livrarias independente de estarem conseguindo atrair os clientes dos seus concorrentes.

E parece que a estabilidade que vemos agora no mercado de e-books é algo temporário.

(Tradução de Marcelo Barbão)

Mike Shatzkin tem mais de 40 anos de experiência no mercado editorial. É fundador e diretor-presidente da consultoria editorial The Idea Logical Co., com sede em Nova York, e acompanha e analisa diariamente os desafios e as oportunidades da indústria editorial nesta nova realidade digital. Organiza anualmente a Digital Book World, uma conferência em Nova York sobre o futuro digital do livro. Em sua coluna, o consultor novaiorquino aborda os desafios e oportunidades apresentados pela nova era tecnológica. O texto de sua coluna é publicado originalmente em seu blog, The Shatzkin Files.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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