O livro e o reality show
PublishNews, Paulo Tedesco, 27/01/2016
Se levarmos para as escolas a noção de que todos temos direitos sobre TUDO aquilo que escrevemos, as chances de termos um país bem melhor é considerável

Na conta das redes sociais e das transmissões audiovisuais em larga escala, a questão da privacidade vem sendo alvo de uma de espécie de hecatombe, em especial para a imagem de crianças e jovens. A auto-exposição, a nudez e o sexo infantil, são tamanhas que basta uma rápida pesquisa na internet e centenas de impressionantes referências aparecem como resultado.

A televisão, obviamente, vem potencializando o quadro, pois na busca de índices de audiências apela à vergonhosas competições por mais e mais verbas publicitárias. Com isso deseduca, conduzindo seu telespectador à naturalização da auto-exposição e da pornografia indisfarçada. Além de expor crianças e adultos em situações limites e muitas vezes vexatórias, a exemplo dos programas culinários e outros tantos “reality”, que simplesmente colocam meninos e meninas numa perigosa exposição.

E há que se falar abertamente sobre isso, porque sim, é danosa essa cultura do entretenimento sem limites. Expor sua intimidade, a sua casa, a imagem de seus filhos e filhas é também provocar um dano irreversível à formação de qualquer um. Se educarmos, ou melhor, se levarmos para as escolas que todos temos direitos sobre TUDO aquilo que escrevemos, TUDO o que fotografamos e TUDO o que filmamos, e que devemos estar conscientes de seu uso (sendo pagos ou não), as chances de termos um país bem melhor é considerável.

O ensino das complexidades do livro, por exemplo, que perpassa a abordagem em aulas sobre do direito autoral, pode também recair sobre o papel de quem não aparece ao público. Ora, ensinar que sempre haverá algum tipo de editor numa boa obra literária, que em qualquer história televisada e encenada haverá também uma editoração, uma direção, uma roteirização, que intermedeia e que melhor prepara uma obra para o público, pode ajudar muito na formação da cidadania, inclusive no combate à pirataria e ao plágio.

Há quem pense, que publicar um livro digital e aguardar, sentado, a riqueza chegar, é algo real como é o sucesso natural de se participar num programa de TV. Pois, sinto: é ilusório, como são ilusórias as naturalidades da maioria dos atos nos reality shows, porque há um ensaio por trás e um diretor cortando e arremedando, e, antes de tudo, há um autor intelectual para tudo o que irá ocorrer. É preciso, portanto, educar para se poder cobrar, e bem sabemos por onde se bem começa essa história de direitos e deveres: em casa e na escola.

[27/01/2016 09:24:31]