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Leonor Xavier e o seu diário sem drama de uma doença

Escritora portuguesa vem ao Rio para lançar ‘Passageiro clandestino’ na segunda-feira

RIO - “É essa a função da arte, transfigurar o sofrimento e fazer dele uma viagem para outro mundo”. A frase da escritora Inês Pedrosa, citada em “Passageiro clandestino” (Editora Autêntica, 160 páginas, R$ 35), indica o caminho para a leitura do livro da jornalista e escritora portuguesa Leonor Xavier. Ao longo de 160 páginas, Leonor toma para si a tarefa de narrar o seu câncer, essa espécie de viagem ou peregrinação, como ela chama, vivida com o passageiro clandestino do título. A obra será lançada segunda-feira, às 19h, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon com um bate-papo da autora e as escritoras Heloísa Seixas e Rachel Jardim, seguido de sessão de autógrafos.

As primeiras páginas deste diário de viagem foram escritas cerca de 20 dias após a descoberta da doença. Leonor não pensava em transformar em livro a sua experiência, mas foi incentivada por sua editora portuguesa a seguir em frente. Mais do que as dores e as angústias da luta contra o câncer, a escritora afirma que se trata de uma obra sobre a condição humana.

— Uma grande amiga minha diz que sou garimpeira de gente. Este é um livro mais sobre gente do que sobre doença. O câncer é um pretexto para falar da vida e das pessoas, o que acaba por ser um pouco comovente — afirma Leonor.

Durante os meses de tratamento, entre outubro de 2013 e agosto de 2014, a escritora conta que viveu entre dois universos distintos: o da casa e o do Instituto Português de Oncologia, em Lisboa. Debilitada pela quimioterapia, a escrita foi uma companhia e um estímulo. Afinal, escrever é há décadas também o seu ofício. No hospital, encontrou muitos dos personagens que aparecem no livro. Neste serviço público e de acesso aos mais e menos afortunados, a gente simples não era apenas cúmplice na doença. Tinha sua própria sabedoria, que se uniu àquela dos autores que formaram Leonor, como Inês Pedrosa, Fernando Pessoa, Nélida Piñon e Carlos Drummond de Andrade.

— De fato, os portugueses mais comuns e simples são muito inteligentes nas reflexões sobre a vida — diz a escritora.

Em abril, ao receber a ordem médica para “ir viver a vida”, já que a batalha fora vencida, a escritora pegou um avião e veio para o Brasil. Ela viveu aqui entre 1975 e 1987, colaborando para revistas e jornais e escrevendo “do Brasil para Portugal e de Portugal para o Brasil”. Através da amizade com Millôr Fernandes, Zuenir Ventura, Jorge Amado e Zélia Gattai foi iniciada na brasilidade que nunca deixou. E assim Leonor segue, inspirada pelos versos de Ruy Belo que servem de epígrafe: “Basta a cada dia / a sua própria alegria”.