Será que no original é melhor?
PublishNews, 10/09/2012
Será que no original é melhor?

Autor de Neologismos indispensáveis e barbarismos dispensáveis, há muito esgotado, o médico Antonio de Castro Lopes (1827-1901) teria um chilique ao ver, hoje, a quantidade de palavras estrangeiras já assimiladas pelo português. Cultor radical do idioma e inimigo dos estrangeirismos tão comuns na fala do século XIX, ele deu-se ao trabalho de, a partir de raízes gregas e latinas, inventar palavras para substituir termos como “avalanche”, “feérico”, “cabotagem” – entre outros neologismos que não vingaram, acabou criando “cardápio”, que dizia ser preferível a “menu”.

Eu me lembrei do doutor Castro Lopes porque, ao traduzir livros de cozinha do inglês para o português, muitas vezes fico em dúvida entre usar o nome original de algum ingrediente ou seu correspondente em português de Portugal. Cranberry, maple e parsnip, por exemplo. Em Portugal, seriam oxicoco, bordo e nabo branco (ou pastinaca). No Brasil... bem, no Brasil não temos cranberries nem maple nem parsnip, muito menos oxicocos, bordo e pastinaca – ou alguém já viu isso à venda na feira, no supermercado? (Quem viu, por favor, me avise! Eu adoraria comer parsnip de novo para tirar a má impressão que tive na única vez em que ele apareceu no meu prato.) Se já incorporamos tão naturalmente muffins, cupcakes e shoyu, não seria o caso de continuar usando o nome original de ingredientes indisponíveis por aqui e, caso eles finalmente comecem a ser cultivados no país, então batizá-los devidamente em português do Brasil? Foi o que aconteceu com o blueberry, frutinha que hoje já existe à venda fresca e congelada como “mirtilo” – um nome, aliás, diferente do usado em Portugal, onde é “arando azul”.

Essa, como várias outras, é uma questão que precisa ser discutida entre editor e tradutor. Mas eu gostaria de saber também a opinião dos leitores, de quem consome livros de cozinha: vale a pena traduzir o nome de ingredientes desconhecidos entre nós, mesmo que, aportuguesados, continuem desconhecidos? Mais ainda: vale a pena manter em um livro receitas com produtos que não existem aqui, mesmo dando alguma dica de substituição?

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Dicionários temáticos e livros de referência são fundamentais para uma boa tradução. Eis alguns que uso com frequência:

Dicionário Tradutor de Gastronomia em Seis Línguas (Antonio Bellini Editora & Cultura, 240 pp., esgotado), de Roberta Malta Saldanha. Mais de 3 000 palavras em português, inglês, francês, alemão, italiano e espanhol.

Gastronomia de A a Z (Aleph, 352 pp., R$ 54), de Maria Genny Caturegli. Muito bacana porque, além de traduzir termos em inglês, francês, italiano e espanhol, descreve cada um e indica quando o preparo é típico dos Estados Unidos (como as batatas e o bife Delmonico, criados num restaurante de Nova York).

Glossário de Gastronomia Português-Inglês / Inglês-Português (Disal Editora, 192 pp., R$ 38), de Virginia Klie. Inclui expressões idiomáticas e falsos cognatos, entre outros extras.

O Grande Livro dos Ingredientes (Publifolha, 530 pp., R$ 99,90). Todo ilustrado, vai na linha do Ingredientes que cito abaixo – mas com muito mais informações, incluindo sugestões de uso e conservação e algumas receitinhas. Útil também por destrinchar técnicas de preparo e cozimento.

Ingredientes (H. F. Ullman, 384 pp., R$ 79,90), de Loukie Werle e Jill Cox. Belo livro ilustrado. Na minha conta, calculei mais de 2 500 ingredientes retratados e descritos em português de Portugal – incluindo capítulos não recomendados para estômagos fracos, com cortes explícitos de carnes, peixes e aves... Vantagem: todas as plantas aparecem com o nome científico.

The New Food Lover’s Companion (Barron’s, 830 pp., US$ 16,99). Excelente minienciclopedia culinária, em inglês.

[09/09/2012 21:00:00]