Lucky Peach: uma coffee table magazine
PublishNews, 13/01/2012
Lucky Peach: uma coffee table magazine

Ele é americano, tem ascendência coreana e batizou sua rede de restaurantes com um nome japonês: Momofuku. Aos 34 anos, David Chang já abriu quatro casas em Nova York – uma delas, o Momofuku Ko, mantém no Guia Michelin 2012 as duas estrelas que ganhou em 2009 – e uma em Sydney, além de uma cadeia de confeitarias com três endereços em Manhattan e um no Brooklyn. Como todo chef de sucesso, ele também lançou seu livro de receitas, o Momofuku (Clarkson Potter, 2009), escrito com o jornalista Peter Meehan. E, só da Fundação James Beard, ganhou sete prêmios nos últimos seis anos.

Mas tudo isso parece não ter sido suficiente, ou Chang é um sujeito que não consegue parar quieto. Em 2011, ele juntou-se outra vez a Meehan para, ao lado da pequena editora McSweeney’s e da produtora Zero Point Zero, lançar uma nova e ousada empreitada: uma revista de cozinha. Com circulação trimestral (o primeiro número saiu em junho e o segundo, em novembro), a Lucky Peach deu uma reviravolta na conhecida fórmula das revistas americanas de receitas, como são as de Martha Stewart e Jamie Oliver, como era a falecida Gourmet.

Começa pelo nome inusitado, “pêssego sortudo”, tradução para o inglês da palavra “momofuku”. Na capa, em lugar de um prato apetitoso e bem-produzido, a edição de estreia trazia a foto de um frango depenado indo para a panela; a segunda mostra um peixe morto. Ortodoxia também passou longe da reportagem inicial do primeiro número, um imenso diário (são dezesseis páginas, quase sem imagens) da viagem que Chang e Meehan fizeram ao Japão para investigar a melhor forma de preparo e os endereços certos para comer ramen, o tema da edição. Sim, toda a edição foi dedicada ao prato, meio macarrão, meio sopa, meio sopa de macarrão. Entre outras matérias, há um guia com as diferentes formas do noodle servidas no Japão, um artigo de Harold McGee sobre alcalinidade, uma conversa recheada de palavrões entre Chang e os chefs Anthony Bourdain e Wylie Dufresne, degustação de ramens a cargo de Ruth Reichl e apenas 25 receitas em 176 páginas, nenhuma delas publicitária.

“The sweet spot”, o tema da segunda edição, é bem mais amplo – e um tanto incompreensível, como admite Peter Meehan na carta ao leitor: “passei quatro meses tentando entender isso, e cheguei à conclusão de que quase tudo pode ser classificado como ‘ponto suave’, desde que você olhe pelo ângulo certo”. Então temos outro extenso diário de viagem, um artigo sobre a microbiologia do missô, outro sobre facas, um depoimento de Ferran Adrià, uma matéria com fotos reveladoras das diferentes maneiras de se matar um peixe...

Daria pra dizer que é trabalho de um bando de doidos. Mas esse bando de doidos parece ter acertado numa coisa: eles inventaram a coffee table magazine, um híbrido de revista, na forma, e de livro, na consistência (e extensão) da leitura. Dá vontade de guardar cada exemplar, impresso em ótimo papel, com projeto gráfico ousado, ilustrações artísticas e muito espaço para inovações – o número 2, por exemplo, lança mão de uma HQ para mostrar as correções da edição anterior e traz uma cartela com 45 adesivos divertidíssimos, que os editores recomendam “usar com responsabilidade” (meu preferido diz “US$ 6 de desconto em toda a sua compra caso você leve esta berinjela”).

Mesmo ao preço de US$ 10 – a assinatura anual da revista Everyday Food, de Martha Stewart, custa US$ 15 –, o primeiro exemplar fez sucesso: segundo o New York Times, os 40 mil exemplares iniciais foram vendidos e a segunda tiragem, com 12 mil, também sumiu das bancas. Resta saber como se sai o número 2, que já subiu para US$ 12 e incluiu alguns anúncios. Faz sentido, já que a produção de uma revista como essa é caríssima. Até quando Chang tem fôlego para aguentar, não se sabe. Mas o time da Lucky Peach não para: em breve deve sair seu aplicativo para iPad.

[12/01/2012 22:00:00]