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Uma escala em Bogotá
PublishNews, 21/11/2011
Uma escala em Bogotá

Na minha volta de Cuba fiz escala em Bogotá, onde fui convidada a participar do 5º Festival do Livro Infantil, um seminário organizado pela Câmara Colombiana do Livro e pelo Ministério da Cultura. Os três grandes temas discutidos foram: “O panorama do livro ilustrado na Colômbia”, “O papel dos editores na indústria hoje e a relação texto e arte” e “Livros para a primeira infância”. Alem disso, foram realizadas oficinas e várias mesas, onde se revisaram e avaliaram projetos selecionados, mas não premiados, que concorreram aos prêmios de literatura infantil do IDARTES e do Ministério de Cultura, ao longo de 2011. Os jurados desses dois prêmios consideraram que não havia vencedor e, portanto, ambos foram considerados desertos.

Diante dessa situação bastante crítica, os jurados propuseram que se aproveitasse o Festival e se convidassem especialistas para discutir com alguns candidatos previamente selecionados os trabalhos apresentados. Uma tentativa de sanar, a médio prazo, uma situação bastante complicada, tratando-se de dois importantes prêmios. Os grupos foram coordenados por ilustradores, autores e editores, praticamente todos convidados estrangeiros. A mim coube participar do grupo de editores junto com Eliana Pasarán, da Fondo de Cultura (México), e Maria Francisca Mayobre, da Ekaré (Venezuela).

Foi uma experiência e tanto, que colocou à prova não só nosso olhar sobre uma parte da produção atual, como a capacidade de crítica e argumentação de todas nós. Não foi fácil, mas o que nos ajudou (ou nos salvou, para ser mais precisa) foi a conexão e a identificação dos nossos pontos de vista. Os concorrentes não eram obrigados a colocar em discussão seus trabalhos. Seis, no entanto, se apresentaram ao nosso grupo. Optamos por fazer uma rodada em que, de forma sintética, apontaríamos os pontos fracos e o que deveria ser trabalhado em cada um dos casos. No fim, todo mundo saiu satisfeito da conversa que se estendeu por quatro longas horas. Um aprendizado.

O caráter formativo do seminário, assim como os temas voltados para o mundo da edição, congregou um público de especialistas, editores, autores e ilustradores interessados em discutir a fundo os temas propostos. Daí o alto rendimento dos debates e das discussões. Coube a mim falar sobre “O papel do editor na atualidade e sobre a relação entre texto e arte”. A identificação com as preocupações que venho manifestando em relação ao oficio do editor, à retomada de sua responsabilidade e centralidade em todo o processo e à necessidade de reafirmar o caráter cultural da indústria editorial foi direta e entusiasta. O que não deixa de ser um alento, principalmente porque havia representantes do meio editorial de outros países de América Latina. A dimensão global dos problemas atuais se confronta com a busca de soluções locais que podem muito bem se potencializar umas às outras.

Nesse sentido, o intercambio é fundamental, assim como a dimensão de certos traços próprios do panorama editorial latino-americano que, apesar das fortes diferenças locais, apresenta algumas especificidades próprias em relação a outros mercados. A minha terceira participação foi numa mesa redonda sobre “Livros para a primeira infância” junto com duas sumidades: Silvia Castrillon e Yolanda Reyes. Fiquei incumbida de falar, evidentemente, do mercado.

Um dos eixos centrais dessa mesa foi a diferença entre livros para a primeira infância e leitura para a primeira infância. Estamos diante de uma nova moda, cujo mercado, sem dúvida, é grande e tem tudo para florescer, apoiado não só nos apelos à formação leitora como no compromisso dos jovens pais com a formação dos filhos e um novo público, que cresce em vários outros segmentos de mercado, como o da alimentação, vestuário, brinquedos etc. Enfim, o mercado descobriu a primeira infância.

As descobertas atuais na área da psiconeurologia, só para citar algumas, mostram o papel que exerce o contato da língua, da sua musicalidade, não só com os recém nascidos, como com os bebês ainda em formação (vale a pena ler a entrevista de Evélio Cabrera-Parra na Revista Emília. Nesse sentido, é importante esclarecer que leitura na primeira infância não exige nenhuma literatura especial. Esse recorte é um recorte do mercado, assim como foi dele também a invenção de uma “literatura juvenil”. A fragmentação é, antes de mais nada, rentável e serve para criar necessidades e novos mercados.

É possível, é legítimo trabalhar nesse segmento de mercado? Sem dúvida alguma e com a maior qualidade ainda, porém não se deve perder de vista o que se está fazendo e nem ter ilusões de que se está inventando a roda. Dificilmente, os livros para bebês não se confundem com livros-brinquedos, ainda que estes despertem sensações, conhecimento e familiarizem seu público com o códice, desde a mais tenra infância. Mas não substituem e nem fazem o papel da leitura em voz alta do melhor da literatura que deve ser lido para todas as crianças.

A mesa concordou que não há uma literatura especial para a primeira infância e que este tema está sendo trabalhado com um certo artificialismo que não ajuda, no limite, na promoção leitora. Na verdade, a questão central volta a ser a leitura e o que entendemos por ela: afinal o que é a leitura na primeira infância? Livros para a primeira infância existem desde sempre, com histórias clássicas que sobrevivem através dos tempos, canções de ninar, cantilenas. O cerne está no conteúdo e não na forma. E o investimento futuro nessa faixa etária pressupõe a formação dos adultos, sua conscientização do papel da leitura compartilhada, em voz alta, desde antes do nascimento dos bebês.

Afinal, como disse Silvia Castrillon, como garantir qualquer direito das crianças, sem a garantia dos direitos dos adultos?

***

Acho que virei colunista internacional, minha próxima coluna será direto de Guadalajara!

Dolores Prades é editora, gestora e consultora na área editorial de literatura para crianças e jovens. É membro do júri do Prêmio Hans Christian Andersen e curadora da FLUPP. É também coordenadora do projeto Conversas ao Pé da Página - Seminários sobre Leitura, e da área de literatura para crianças e jovens da Revista Eletrônica Emília. Sua coluna pretende discutir temas relacionados à edição e ao mercado da literatura para crianças e jovens, promover a crítica da produção nacional e internacional deste segmento editorial e refletir sobre fundamentos e práticas em torno da leitura e da formação de leitores. Seu LinkedIn pode ser acessado aqui.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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