À beira do ponto crítico
PublishNews, 02/03/2011
Estamos chegando a um ponto crítico

Às vezes, e parece que isso acontece com muito mais frequência hoje em dia, o futuro chega mais rápido do que se espera.

Seguidores desse blog, e dos meus discursos antes de existir um blog (este é de 2001!), sabem que há muito tempo espero o momento em que muitas pessoas passarão a ler mais e-books do que livros impressos. Errei no ritmo que isso ia acontecer. (Há dez anos eu esperava que isso acontecesse em 2006 ou 2007.) Errei em relação à questão da diferença que faria um aparelho de leitura (leio muito confortavelmente no celular, e antes disso num PDA, por isso achei que poucos iriam querer mais um aparelho somente para ler). E estou repensando minhas expectativas em relação aos enhanced e-books e à utilidade da leitura social.

Mas há muito tempo ficou claro para mim que os e-books oferecem vantagens incríveis sobre os impressos – portabilidade, facilidade de compra e custos menores que devem inexoravelmente reduzir os preços – e que isso iria influenciar muitas das pessoas que, cada vez mais, estão na frente de uma tela a maior parte de seu tempo. E minha longa experiência lidando com a administração de livrarias deixou evidente que a consequente diminuição de vendas em lojas físicas iria levar a falências, o que aumentaria as distâncias para os clientes chegarem às lojas, e isso por sua vez motivaria mais pessoas a comprar livros impressos ou digitais online. O que iria levar a mais falências. É um círculo virtuoso se você estiver no negócio do e-book ou de vendas de livros impressos on-line. Ou se quiser ver os norte-americanos consumindo menos gasolina.

É um círculo vicioso – uma espiral mortal – se você é dono de uma livraria.

Michael Cader, da Publishers Lunch, informou (é preciso ser assinante para acessar os links) que os números da BookScan mostram uma queda na venda unitária de livros impressos em torno de 4,4 % de 2009 para 2010. Mas não acredite nesse número. Já está desatualizado. Cader fez uma análise mais profunda de mais dados recentes da BookScan mostrando que as vendas de livros impressos tinham caído mais de 15% em comparação com o ano anterior nas primeiras seis semanas de 2011! E a parcela de livros impressos vendidos online continua aumentando, então isso, quase com certeza, significa que as vendas em lojas caíram ainda mais rapidamente. As vendas de livros impressos em lojas podem ter caído 20% ou 25% em comparação com o ano passado? Claro que sim!

Vendas de iPads, Kindles e Nooks excederam as expectativas para o Natal de 2010. Dominique Raccah, chefe da editora independente Sourcebook, uma empresa com uma linha diversificada, informou em seu blog que as vendas em sua empresa em janeiro foram 35% através de métodos digitais!

Não me espanta que ela diga: "Podemos estar bem no ponto de virada. Suspeito que vamos ver alguma revisão quando os editores olharem seus números no final do primeiro trimestre de 2011."

Ouvi o argumento de umas pessoas muito inteligentes falando que a adoção do e-book vai se estabilizar em algum momento. Como ela tem dobrado, ou mais, nos últimos três anos e tem sido frequentemente colocada entre 13 e 19% para nova ficção e não-ficção no último trimestre de 2010, sabemos que não poderá continuar a dobrar nos próximos três anos, ou iria ultrapassar os 100%. Mesmo assim, previsões de que as vendas de e-books chegarão aos 50% nos próximos cinco anos e que o espaço em prateleiras nas livrarias vai cair igualmente pela metade nos próximos cinco anos - que era a minha opinião – parecia algo bastante agressivo há seis meses.

Não parece mais.

A parcela de renda que a Borders representava para as editoras está ao redor de 8%. Poderia ser 10% ou 12% se víssemos só as vendas em lojas físicas. Assim, se a Borders desaparecesse completamente amanhã (e isso não vai acontecer) e mesmo se todo livro que eles vendessem em suas lojas fossem, de alguma forma, comprados na loja de outra pessoa (o que não vai acontecer), a redução da venda de livros em lojas seria tão grande que todas as outras livrarias, coletivamente, veriam um declínio substancial de vendas ano a ano.

Tudo isso significa que 2011 será um verdadeiro "apertem os cintos, o piloto sumiu" para as editoras. E Raccah está certa ao afirmar que as editoras ficarão um tanto quanto perdidas ao olharem seus números no primeiro trimestre desse ano.

Um impacto sobre o qual as editoras sofisticadas estão conscientes, mas que não é tão óbvio para olhos pouco treinados, é que com as vendas caindo, as porcentagens de retorno, inevitável e inexoravelmente, vão subir. Quando um editor calcula uma porcentagem de devolução para qualquer período – uma semana, um mês, um trimestre ou um ano – está medindo as devoluções recebidas e creditadas naquele período em relação às vendas feitas no mesmo período. Mas a devolução na verdade está ligada às vendas feitas em períodos anteriores; mesmo na pior das situações, poucos livros são devolvidos menos de três meses depois de seu pedido.

Então, o que está acontecendo agora é que os envios estão diminuindo – quase nenhum ou muito pouco para a Borders e com expectativas caindo em outros lados – enquanto que as devoluções estão crescendo porque estão sendo devolvidos os pedidos feitos a partir das expectativas mais altas dos últimos seis ou doze meses. Isso significa que as vendas por internet que estão sendo realizadas agora – envios menos devoluções – poderiam, para muitos, ser um desapontamento que beira a desolação.

E as porcentagens de devolução não são as únicas porcentagens problemáticas. Duas outras nas quais se baseiam as editoras serão mais desafiadoras.

A porcentagem do preço de um livro impresso que é constituído pelo "custo unitário de fabricação" é um. O custo unitário é algo extremamente sensível. Se você está imprimindo menos livros e se precisa segurar os preços de varejo (duas coisas que certamente acontecerão), a porcentagem da receita gasta na criação de livros impressos irá aumentar.

O segundo ponto problemático é que as editoras gostam de pensar os custos fixos como porcentagem. Muitas editoras ainda seguem a prática pouco inteligente de colocar um cálculo de porcentagem sobre os custos fixos em seus cálculos de cada livro. Mas se o volume de vendas cair mais rápido do que os custos fixos puderem ser reduzidos, essa porcentagem aumentará também. E não dá para reduzir de forma eficiente esses custos rapidamente. Demitir pessoas é geralmente uma ilusão; estamos sempre ouvindo falar de freelancers que conseguem trabalho porque as editoras demitiram a equipe que costumava fazer a mesma tarefa. Mas, além disso, custos de manutenção do espaço de trabalho e galpão de armazenamento, além de investimentos em sistemas não sobem ou diminuem de acordo com o volume (que é exatamente por isso que é um erro de lógica calculá-los como uma porcentagem da renda!). Editoras que estão usando porcentagens sobre custos fixos para calcular suas margens em cada título que contratam vão descobrir que esses números precisam ser reconsiderados também.

Apesar de a Barnes & Noble sentir a queda nas margens de todas as livrarias físicas, eles estão, sem dúvida, bem conscientes da sua crescente importância para todas as editoras num futuro mundo sem a Borders. A B&N quase certamente estará procurando melhores termos de negociação e as editoras quase certamente sentirão a fraqueza de sua posição ao lidar com esses pedidos. E isso sem contar o fato de que as editoras realmente querem que uma Barnes & Noble saudável mantenha sua capacidade de mostrar os seus livros ao público.

Então, as vendas estão caindo, os retornos estão crescendo, o custo dos bens está subindo, as margens das vendas estão caindo, e manter os custos fixos corretos será um problema crescente. A boa notícia é que as vendas dos e-books estão crescendo e as margens deles – pelo menos até agora – foram bem preservadas.

Mas o primeiro sinal significativo de que os preços dos e-books vão cair chegou com a notícia de que e-books de 99 centavos de dólar estão começando a aparecer na mídia e nas listas de best-sellers que saem no The New York Times e no USA Today. Isso cria alguns problemas horríveis. Coloca autores anteriormente desconhecidos com livros por 99 centavos de dólar aparecendo como criadores de best-sellers. E encoraja as editoras já estabelecidas a cortar os preços para alcançar números de vendas que os coloquem nessas listas.

No mínimo, imagino que as editoras vão começar a pedir que o New York Times e o USA Today considerem a renda total que um livro gera no comércio (preço vezes unidade) quando criarem as listas, e não se baseiem somente nas quantidades de exemplares vendidos. Como as editoras estabelecidas compram muito mais anúncios que os autores de livros de 99 centavos, podemos esperar que eles, pelo menos, dêem alguma atenção a elas.

As editoras terão de lutar para manter seu negócio lucrativo e repensar muitas das práticas mais reconhecidas nas próximas semanas.

Trad. Marcelo Barbão

[01/03/2011 21:00:00]