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Por uma história industrial da literatura
PublishNews, 23/11/2010
Por uma história industrial da literatura

Como já fiz outras vezes, vou interromper a série sobre o editorial digital/diagramação para responder comentários que recebo, mesmo porque essa série não irá acabar tão cedo e, se eu não intercalar outras colunas no meio delas, nunca mais falarei de outras coisas...

Nesta semana recebi uma mensagem que dizia que minhas colunas são polêmicas. Fiquei pensando sobre isso meio envergonhada, porque entendi que poderia estar criando a imagem de “adolescente revoltada do editorial brasileiro” e, obviamente, isso passa muito longe do que eu desejo para mim (ou para qualquer um).

Então, pensei, pensei e gostei desta explicação que me dei: minhas colunas talvez sejam “polêmicas” simplesmente porque tratam de um tabu, a indústria de livros. Ou talvez, seja melhor voltar à década de 1950 e dizer que o tabu ainda é a indústria cultural, afinal, muitos discursos parecem ainda desdobramentos desse:

Toda a cultura de massas em sistema de economia concentrada é idêntica, e o seu esqueleto, a armadura conceitual daquela, começa a delinear-se. Os dirigentes não estão mais tão interessados em escondê-la; a sua autoridade se reforça quanto mais brutalmente é reconhecida. O cinema e o rádio não têm mais necessidade de serem empacotados como arte. A verdade de que nada são além de negócios lhes serve de ideologia. Esta deverá legitimar o lixo que produzem de propósito. O cinema e o rádio se autodefinem como indústrias, e as cifras publicadas dos rendimentos de seus diretores-gerais tiram qualquer dúvida sobre a necessidade social de seus produtos. (Theodor Adorno, Indústria cultural e sociedade. [Desculpa, ABNT])

Mas apesar de eu não poder provar que não é à toa que Frankfurt ainda seja a meca editorial, o fato é que misturar arte e indústria ou, especificamente neste caso, literatura e indústria, parece ainda ferir sensibilidades.

E então, depois desse retorno de minha mente à minha graduação em Letras, meu lado dominado pelos ensinamentos do gerenciamento de projetos gritou, “e tem mais!”: o mercado editorial brasileiro, diferentemente do movimento que vem ocorrendo nos países desenvolvidos já há alguns vários anos, ainda não foi todo comprado por corporações mundiais de mídia (felizmente para alguns e infelizmente para outros). Isso significa que grande parte do nosso mercado ainda é composto por empresas familiares.

Juntando as duas informações, temos uma indústria, ou melhor, o departamento de produção dessa indústria, majoritariamente formado por graduados em Ciências Humanas, bastante familiarizados com a Escola de Frankfurt. Além disso, acredito que possam ter receio de que, ao expor suas críticas, estas passem de família em família editorial e, por fim, fiquem “queimados no mercado”. Generalizando, falta autoestima profissional (se não pela mensagem que os livros passam para a sociedade, pela maneira apressada de trabalhá-los) e sobra medo de perder o emprego. E assim fazemos uma indústria de textos com poucos textos sobre si mesma. (Exceções: Emanuel Araújo, Laurence Hallewell, Jason Epstein, André Schiffrin, Fábio Sá Earp e George Kornis, Barbara Horn, Gabriel Zaid, José Luis Saorín... Citem mais, por favor!)

É uma situação complexa para mim também, tanto que evito ao máximo citar nomes de empresas e profissionais, mas entendo que, se não expusermos nossas opiniões, não estamos de fato participando da indústria e não poderemos fazer nada para melhorá-la. Sinceramente, tenho acreditado que melhorar uma indústria não só financeiramente, mas também valorizando a vida dos milhares de funcionários dela (por mais que sirva também para a empresa fazer marketing social) é uma das formas mais eficazes de “melhorar o mundo”, considerando que é no mercado que você vai encontrar a maior quantidade de pessoas com as condições e ferramentas para isso.

Após minha imersão de 18 meses no mundo dos projetos de TI, seguros, engenharias, terceiro setor, arquitetura etc., vi que a troca de informações entre empresas (exemplo: Pesquisa Brasileira do PMI sobre Benchmarking em Gerenciamento de Projetos 2009) é necessária para que todo o setor avance. Lógico que não são informações detalhadas sobre as estratégias da empresas, mas informações muito importantes para quem busca progredir. O mercado continua sendo competitivo, porém fica muito mais inteligente – quanto mais você expõe o que sabe, mais você fica sabendo e mais longe você pode chegar. Não estou falando de dinheiro (apesar de ele costumar andar junto), estou falando de evolução intelectual, emocional e, por que não?, espiritual.

Fica aqui mais uma vez o pedido para que os funcionários do mercado editorial brasileiro pesquisem, se exponham, criem blogs, cursos, periódicos acadêmicos etc. para acabar com essa polêmica.

Cindy Leopoldo é graduada em Letras pela UFRJ e pós-graduada em Gerenciamento de Projetos pela UFF. Em 2015, cursou o Yale Publishing Course e, em 2020, iniciou a especialização em Negócios Digitais, da Unicamp. Trabalha em editoras há uns 15 anos. Na Intrínseca, onde trabalhou por 7 anos, foi criadora e gerente do departamento de edições digitais e editora de livros nacionais. Atualmente, é editora de livros digitais da Globo Livros.

Escreve quinzenalmente, só que não, para o PublishNews. Sua coluna trata de mercado editorial, livros e leituras.

Acesse aqui o LinkedIn da Cindy.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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