Já passamos pelo “gradualmente”; nos preparemos agora para o “subitamente”
PublishNews, 26/05/2010
Em sua primeira coluna, Mike Shatzkin aponta que as pessoas que possuem um dispositivo de leitura decente em mãos podem consumir mais livros digitais do que consumiria os impressos.

Eu não acho que previsões acertem sempre, mas uma que eu perdi foi que o iPad não teria um impacto significativo no mercado de e-books (apesar de ter certeza de que depois de algum tempo ele teria sua importância). Mas dados e análises muito peculiares de Michael Cader, publicados em 5 de maio na PublishersLunch (que para ter acesso precisa ser assinante, e se você ainda não tem, o que está esperando?), em menos de um mês provaram que eu estava errado. Aparentemente se pusermos telas maiores e portáveis nas mãos das pessoas elas querem ler livros nelas. E elas (telas) não precisam ser e-ink e leves (como Kindle e Nook e o Sony Reader e o novo Kobo Reader e uma infinidade de novos equipamentos) para ter esse impacto.

Tudo o que a Apple informou foi que eles venderam aproximadamente um milhão de iPads no mês de abril, mesmo com as vendas de equipamentos com tecnologia 3G começando só no final do mês (virtualmente, tudo o que se vendeu em abril era só wi-fi). Nós temos os números de downloads, mas não dá pra ter uma base do quanto isso significa em termos de venda. Apenas podemos ter certeza de que qualquer número em vendas que conseguirmos será para 500 mil iPads já vendidos.

Não podemos esperar que uma média de um milhão de vendas por mês se sustente; havia muita pré-venda e a excitação do lançamento embutidas nos números de abril. Mas maio foi o mês de lançamento da versão 3G e ambos modelos, wi-fi e 3G, estão indo bem, e o modelo 3G é aparentemente muito mais popular do que a versão unicamente wi-fi: a venda de 500 mil unidades em maio e uma média de 300 mil unidades mensais vendidas nos próximos meses, poderia parecer uma expectativa “modesta”. Se isso estiver certo, então a quantidade de iPads nas mãos de usuários em maio seria de 1,25 mi, em junho 1,55 mi. Então a base de junho seria o triplo do que foi em abril.

Michael Cader recebeu anonimamente informações de algumas grandes agências de publicidade sobre as vendas de abril. Ele diz que para a maioria das companhias que ele pesquisou, as vendas de iBooks eram de 12% a 15% da venda total de livros digitais antes do lançamento da versão 3G! E duas empresas reportaram crescimento nas vendas de 300% a 400% no fim de semana do lançamento. Uma editora que mostrou dados por títulos revelou que já havia livros que eram mais vendidos para iPad do que para Kindle.

A análise de Cader mostrou dois pontos a serem considerados para interpretar esses números. O impacto da Agency Five foi exagerado por sua relativamente restrita competição. Eles tinham muito menos títulos no ambiente iBook do que nas lojas da Kindle, da Kobo, da Sony ou em qualquer outra loja independente. A gigante Random House e outros muitos editores menores simplesmente não estavam lá. Então mesmo que as vendas de todas as cinco editoras fossem 12% do seu total de vendas dos livros digitais em abril, isso não sugere que os iBooks constituem essa porção – de 12% – do total das vendas. Ainda.

Mas, ao mesmo tempo, esses números minimizam o impacto do iPad porque os donos de iPad também consumem livros das lojas Kindle, Kobo e B&N o que não seria refletido na pesquisa. Um vendedor de livros digitais me disse que as vendas na empresa dele foram fortes em abril. Eu tinha pedido que sondasse se as vendas tinham sido afetadas pelo aumento gerado pelo modelo de agência da iBookstore. Estaria havendo redução nos negócios? Não, definitivamente não (Esse é um ponto muito importante, mas vamos deixar para um outro dia.). Então embora alguns possam assumir que algumas vendas feitas pela iBookstore poderiam também ter acontecido pelo Kindle, Kobo ou outra loja eletrônica, aparentemente o mercado está crescendo rápido o bastante para mascarar o impacto de qualquer canibalismo.

Com cinco das seis maiores editoras e a maioria dos grandes títulos na iBookstore, pareceria razoável presumir que 65% do potencial de vendas está refletido nesses livros. Aplicando essa hipótese à média reportada, entre 12% e 15% do market share (13.5%), sugeriria que a fatia global de vendas do iBook fica quase em 9%. Mas para mim parece que os números vão mais do que dobrar em maio. A quantidade de iPads no mercado será mais que o dobro e a versão 3G vai constituir uma porção muito mais significante da base de maio, lembrando que não existiam em abril. De fato, parece que o número pode ainda ser o triplo! Então, em junho poderemos ver um quarto ou mais das vendas de e-books através da iBookstore. O aumento será provavelmente mais lento depois disso (as vendas de maio vão refletir o grande aumento na quantidade de iPads nas mãos dos consumidores, gerado pelas vendas iniciais em abril do modelo wi-fi e em maio do 3G), mas a escalada da Apple para um sólido segundo lugar atrás do Kindle em 60 dias é bem dramática.

Ainda mais emocionante para os editores é a evidência de que as vendas de iBook estão expandindo o mercado de e-books. Cader relatou que muitos títulos fortes levavam a um perfil de homem jovem e que as vendas de iBooks aumentaram a performance dos títulos de não-ficção. A maioria das pessoas imaginou que o iPad chamaria a atenção de um público não tão comprador de livros quanto o público do Kindle, o que era parte do motivo por trás da minha expectativa “furada” de que as vendas seriam modestas no início. Mas o que podemos ver é que as pessoas que possuem um dispositivo de leitura decente em mãos podem consumir mais livros digitais do que consumiria os impressos. Se essa premissa se provar verdadeira, então será muito bom para editores e autores.

Enquanto isso, mesmo antes dessa análise ter sido revelada, na semana passada nós recebemos a notícia de que para dois editores o aumento nas vendas de e-books foi suas melhores notícias recentemente. Simon & Schuster e Harlequin revelaram que os resultados das vendas de livros impressos desapontaram, mas as vendas digitais foram maiores do que imaginaram.

Foi apenas seis semanas atrás que olhei os dados mais recentes de IDPF (sigla em inglês para Fórum Internacional de Editores Digitais), adicionei ao que ouvi em conversas com grandes editores e agentes, e tive um momento de epifania quando percebi como estava perto do que chamamos na conferência “Transformando Informação Paga”, do BISG (sigla em inglês para Grupo de estudo da indústria de livros), de “o ponto sem volta.” Escrevi na minha coluna sobre as palestras em Londres e repeti na conferência da semana passada que vejo a venda de e-books representando 25% das vendas de livros no final de 2012. Quando os livros impressos começaram a ser vendidos pela internet, previ que 50% desses livros seriam vendidos dessa maneira em 2012. Os CEOs de duas das Seis Grandes secretamente concordaram comigo e também um revendedor conhecedor dos mercados impressos e virtuais. Então falei com um estrategista digital das Seis Grandes que disse que eu estava sendo conservador.

Este ponto de vista não é aceito internacionalmente. Um executivo de um distribuidor de livros comerciais me disse na semana passada (de boa, ele é uma pessoa legal) que ele achava que eu era maluco. Ele ainda vê a venda de e-books como insignificante e não acha que atingirá os níveis que eu espero para o final de 2012 nem mesmo em 2016.

Bom, eu tentei ser conservador porque me surpreendi com a minha própria descoberta do começo de abril. Mas me lembrei (e lembro a todos vocês) que as coisas acontecem “gradualmente, e então subitamente”. Agora me parece que o iPad – que entrou com um dilúvio de e-leitores e tablets e até mesmo plataformas totalmente novas como Blio e Copia – pode ser o catalisador para a transição formatada nessas três palavras.

Quando eu examinei a tática da Random House de, inicialmente, ficar de fora da iBookstore, eu disse que isso fazia sentido mas que consistia em uma aposta de que a venda de iBooks não seria forte logo de início. Agora que o resultado das vendas parece provar que aquela conjectura (da qual eu compartilhei) estava errada, eu esperaria que a Random House se juntasse às outras grandes editoras no modelo de agência para poder começar a vender na iBookstore também. Os números discutidos neste artigo sugerem que eles estão perdendo vendas e os agentes que representam os autores não incluídos na iBookstore serão obrigados a mostrar isso. Enquanto isso, a Random House obteve alguns benefícios por ter e-books mais baratos no mercado em outras lojas, mas seria surpreendente se isso compensasse não vender 12% ou mais em iBooks.

[25/05/2010 21:00:00]