Publicidade
Publicidade
Por que os governos nunca abraçaram as bibliotecas?
PublishNews, Volnei Canônica, 24/01/2017
Volnei Canônica discorre em sua coluna sobre o papel das bibliotecas e o que tem sido feito para que elas recebam os cuidados que merecem

Está marcado para amanhã, quarta-feira (25), no Centro Cultural São Paulo (Ruas Vergueiro,1000, Paraíso – São Paulo / SP), um "abraçaço" promovido por bibliotecários, funcionários, mediadores de leitura e amigos das bibliotecas. O ato simbólico, no dia do aniversário de São Paulo, é para mostrar o descontentamento a uma das primeiras medidas do novo prefeito João Dória de privatizar as bibliotecas públicas.

Mas por que os governos no Brasil nunca abraçaram as bibliotecas escolares, públicas e comunitárias?.

Quando praticamos o ato de abraçar queremos mostrar que: gostaríamos de estar bem perto, gostaríamos de proteger, gostaríamos de trocar afeto.

Mas o que vemos há anos dos governos municipais, estaduais e federal em relação a estes equipamentos democráticos? Um aceno de adeus ou no máximo um aperto de mão. Nunca um abraço!

A biblioteca pública é o equipamento cultural que está presente em quase todos os municípios brasileiros. Em se tratando de comparação temos o dobro de bibliotecas públicas em relação a museus e salas de cinema. Se somarmos então as bibliotecas escolares, comunitárias, universitárias e especializadas, podemos afirmar (nas diferentes funções que cada biblioteca exerce) que esses equipamentos são fundamentais para que, além da informação, a cultura da escrita e da imagem seja acessada pelos brasileiros.

Quero dizer para os que ficam em suas casas lendo ou os que conhecem os livros apenas nas livrarias, que estão redondamente enganados e que as nossas bibliotecas estão "as moscas". Essa afirmação geralmente é feita por quem nunca pisou em uma biblioteca. Então, parem de achar que a instituição biblioteca está falida.

Não sou ingênuo, ou melhor, sou um bom frequentador de todos os tipos de bibliotecas em várias regiões do país e sei que em muitos lugares o potencial deste equipamento está funcionando a menos de 30%. Sabemos da falta de estrutura, de acervo, de profissionais qualificados, etc. Mas sabemos que neste mesmo lugar se a biblioteca fosse abraçada pela gestão pública o potencial de formar leitores seria contemplado em 100%.

Quando o prefeito de São Paulo anunciou que irá entregar 52 bibliotecas para organizações sociais fazerem a gestão, ele dá um belíssimo aceno de adeus a todo o trabalho realizado durante anos na maior rede de bibliotecas municipais da América Latina e atesta que a capacidade da gestão pública de seu governo é fraca e ineficiente.

Quando alguém se propõe a ocupar um cargo máximo na gestão pública é porque acredita e quer investir nela. Assumir a gestão pública e sair privatizando os espaços é quase a mesma coisa que assumir uma empresa privada cheia de funcionários, não pensar na qualificação e carreira deles, e contratar várias assessorias para fazer o trabalho.

Sou extremamente a favor da parceria entre o público e o privado. Podem perfeitamente se abraçarem. Mas nunca um pode ocupar o lugar do outro. Coordenei durante cinco anos um programa de promoção da leitura, de um instituto privado, que apoia o fomento de bibliotecas escolares, públicas e comunitárias. O papel que exercíamos era o de potencializar o que essas bibliotecas tinham de melhor e evidenciar suas fragilidades para que pudessem se transformar em fortalezas. Nunca fizemos a gestão destes espaços, mas sim apoiamos com conhecimento e ferramentas e também nunca decidimos sobre o bem público. Não cabe ao setor privado decidir políticas públicas. Isso não o isenta da sua responsabilidade sobre o que é público. Às vezes é muito tênue a linha que separa o público do privado e por ser tênue é que precisa estar bem definido o que é de um e o que é de outro.

Se a contratação de organizações privadas for para ajudar na burocracia e agilizar a realização de ações nas bibliotecas acho que são bem vindas. Mas se for para tomar conta de tudo, acho que estão em desvio de função. Conheço bem o sistema de Bibliotecas Parques da Colômbia que trabalha justamente nessa dobradinha público-privado. O privado tem um papel importante de produtor e viabilizador das políticas educacionais e de promoção da leitura que é pensada e gerida pela gestão pública.

Não consigo entender porque os políticos não fazem esforços para qualificar a gestão pública. Cada vez mais o Estado fica sucateado. Se o voto não fosse obrigatório será que servidor público votaria em algum candidato?

Tenho certeza que algumas pessoas irão dizer, mas na Europa, Estados Unidos, Japão, as bibliotecas são diferentes, são melhores. Minha primeira resposta seria: O que parece bom pra você talvez não seja bom para mim ou outros brasileiros. Depois com mais calma (sim fico nervoso quando o assunto é bibliotecas) eu perguntaria: O que você faz para as bibliotecas brasileiras serem tão boas como essas que você acha que é? Abraça as bibliotecas ou abana do outro lado da rua? Você cobra do seu candidato eleito ou daquele que se elegeu sem o seu voto que abrace as bibliotecas?

Conheço um monte de pessoas que tiram fotos em bibliotecas quando viajam para o exterior, mas nunca pisaram na biblioteca pública da sua cidade. Não sabem nem o endereço.

Claro que não é simplório tudo isso. Mas sabemos que a Cultura e a Educação são duas peças importantes no tabuleiro social. Ouso dizer que são rei e rainha. Sem essas peças fica quase impossível de se avançar no jogo do poder de decisão, de liberdade, de autonomia.

Enquanto os políticos continuam dando as costas para as bibliotecas a população abraça. Em tempos de caos ter acesso às letras para saber escolher a frase que nos move para a marcha de um país mais digno é fundamental. A minha eu brando aos quatro ventos "Um por todos e todos por um Brasil de leitores!".

Volnei Canônica é formado em Comunicação Social – Relações Públicas pela Universidade de Caxias do Sul, com especialização em Literatura Infantil e Juvenil também pela Universidade de Caxias do Sul, e especialização em Literatura, Arte do Pensamento Contemporâneo pela PUC-RJ. É Presidente do Instituto de Leitura Quindim, Diretor do Clube de Leitura Quindim e ex-diretor de Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas, do Ministério da Cultura. Coordenou no Instituto C&A de Desenvolvimento Social o programa Prazer em Ler. Foi assessor na Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ). Na Secretaria Municipal de Cultura de Caxias do Sul, assessorou a criação do Programa Permanente de Estímulo à Leitura. o Livro Meu. Também foi jurado de vários prêmios literários.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

Publicidade

A Alta Novel é um selo novo que transita entre vários segmentos e busca unir diferentes gêneros com publicações que inspirem leitores de diferentes idades, mostrando um compromisso com qualidade e diversidade. Conheça nossos livros clicando aqui!

Leia também
'A leitura literária de um livro físico é uma experiência sinestésica e artística fundamental para a infância. Sem essa experiência, a formação de leitores fica bastante comprometida', defende Volnei Canônica em sua coluna
Em sua coluna, Volnei Canônica explica detalhes da pesquisa sobre bibliotecas escolares realizada recentemente pelo Instituto Pró-Livro
Volnei Canônica conta que foi convidado, ao lado de nomes como André Neves, Roger Mello e Marina Colasanti para participar do Salão do Livro Infantil e Juvenil da cidade espanhola de Pontevedra
Em sua coluna, Volnei Canônica sai em defesa dos seres fantásticos na literatura infantil. ‘Aprender a lidar com o simbólico é mais seguro do que lidar com as coisas ditas reais’, diz.
Em sua coluna, Volnei fala sobre ' Panorama sobre o Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas do Brasil?' evento programado para acontecer de 30/11 a 02/12 em Caxias do Sul
Publicidade

Mais de 13 mil pessoas recebem todos os dias a newsletter do PublishNews em suas caixas postais. Desta forma, elas estão sempre atualizadas com as últimas notícias do mercado editorial. Disparamos o informativo sempre antes do meio-dia e, graças ao nosso trabalho de edição e curadoria, você não precisa mais do que 10 minutos para ficar por dentro das novidades. E o melhor: É gratuito! Não perca tempo, clique aqui e assine agora mesmo a newsletter do PublishNews.

Outras colunas
Todas as sextas-feiras você confere uma tira dos passarinhos Hector e Afonso
Seção publieditorial do PublishNews traz obras lançadas pela Ases da Literatura e seus selos
Em 'A cartinha de Deus', a autora leva os leitores em uma jornada íntima e inspiradora, mostrando como aprendeu a lidar com os desafios impostos pela distonia
Em 'Alena Existe', publicada pela Ases da Literatura, o autor Roger Dörl desvenda os segredos do universo numa trama repleta de ficção científica, aventura e mistério
Conheça a jornada de Nick, o gatinho amoroso que ensina sobre presença e ausência no livro da autora Maurilene Bacelar, lançamento da Editora Asinha
Os únicos livros que vale a pena ler são aqueles que nos tornam estrangeiros. Estamos perante eles como uma pessoa está diante de uma língua que não domina.
Abel Barros Baptista
Crítico literário português
Publicidade

Você está buscando um emprego no mercado editorial? O PublishNews oferece um banco de vagas abertas em diversas empresas da cadeia do livro. E se você quiser anunciar uma vaga em sua empresa, entre em contato.

Procurar

Precisando de um capista, de um diagramador ou de uma gráfica? Ou de um conversor de e-books? Seja o que for, você poderá encontrar no nosso Guia de Fornecedores. E para anunciar sua empresa, entre em contato.

Procurar

O PublishNews nasceu como uma newsletter. E esta continua sendo nossa principal ferramenta de comunicação. Quer receber diariamente todas as notícias do mundo do livro resumidas em um parágrafo?

Assinar